NOTÍCIA
30% a 50% das instituições escolares correm o risco de falir, diz a União pelas Escolas Particulares de Pequeno e Médio Porte. Neste artigo, dois advogados alertam sobre a preocupante realidade do setor
A pandemia da covid-19 revelou-se um acelerador de tendências globais, tais como a telessaúde, o home office e a educação a distância, conforme pontuado pelo Fórum Econômico Mundial, de forma que foi indispensável que as instituições de ensino privadas, que não estavam preparadas para fornecer educação remota, precisaram se adaptar rapidamente à realidade de uma quarentena e despender em investimentos em tecnologia, licenças de uso de softwares e treinamento de docentes para garantir a própria continuidade no mercado.
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Mesmo fornecendo aulas remotas, muitas escolas privadas de pequeno e médio porte estão experienciando o colapso no sistema de educação em decorrência da obrigatoriedade da concessão de desconto na mensalidade escolar, do aumento da inadimplência e do cancelamento de matrículas de alunos que migraram para a rede pública ou optaram pelo homeschooling, causando grande risco de tais instituições fecharem as portas, principalmente as creches e escolas de educação infantil.
Neste sentido, tal impacto financeiro foi percebido intensamente em creches e escolas de educação infantil, em que há maior dificuldade ou impossibilidade de implementação do ensino remoto, ensejando na redução da receita destas em 54%, em junho, de acordo com a União pelas Escolas Particulares de Pequeno e Médio Porte, correndo o risco de 80% das referidas instituições de ensino fecharem as portas neste período, segundo a Federação Nacional de Escolas Particulares (FENEP).
Além da educação infantil, a inadimplência é sentida mais fortemente no ensino superior, registrando 75% em nível nacional (ABMES), sendo tal impacto mais perceptível se olharmos individualmente para estados como São Paulo, que registrou aumento de 70% (Semesp) e no Rio de Janeiro, com o pedido de recuperação judicial da Universidade Cândido Mendes.
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O elevado número de pedidos de cancelamento de matrículas está contribuindo para as escolas chegarem ao colapso. Para exemplificar, a União pelas Escolas Particulares de Pequeno e Médio Porte afirma que 95% das instituições de ensino particulares experimentam tal fato desde o início da pandemia, resultado, segundo a mesma, do homeschooling e da migração dos alunos para escolas públicas.
Já no Paraná, a Secretaria de Estado da Educação e do Esporte registrou 30.000 alunos nesta situação, enquanto o Sinepe – DF, aponta para 88,8%, no Distrito Federal.
Num efeito cascata, a evasão escolar da rede privada, intensificará as adversidades encontradas na rede pública através da grande migração de alunos para esta, agravando as desigualdades sociais e educacionais, além do risco de faltar vagas que contemplem todos os estudantes.
Além da inadimplência e da evasão escolar, as receitas das escolas privadas têm sido abaladas por meio, por exemplo, da obrigatoriedade de concessão de descontos nas mensalidades em alguns estados durante o isolamento social. Foram protocolados Projetos de Lei na Câmara dos Deputados, no Senado e, em pelo menos 11 estados brasileiros com o escopo de reduzir as mensalidades escolares, num percentual entre 10% a 50%, durante a pandemia, que renderam questionamentos acerca da constitucionalidade formal e material das referidas normas, seja por vício de competência, seja ausência de um incentivo correlato para equilibrar os contratos e evitar a falência de diversos estabelecimentos de ensino privados.
Indaga-se, como as instituições de ensino de pequeno e médio porte que, no momento anterior a pandemia, possuíam um ínfimo lucro advindo de acessórios da educação, tais como a cantina e os passeios escolares, poderão conceder descontos lineares nas mensalidades sem ficar no vermelho, se além de impossibilitados de lucrar em razão do isolamento social, ainda tiveram que investir em tecnologias e treinamentos para implementar aulas remotas.
Neste sentido, o CEO da Primeira Escolha e professor do Insper, Tadeu Ponte, e o CEO da Rabbit Partnership, Christian Coelho, destacam que o lucro de um estabelecimento de ensino de pequeno e médio porte bem organizado, em média é de 15%, de forma que se este criou algum fundo para reservar mensalmente 5% dos 15% em três meses de pandemia, tal reserva de quase um ano já foi extinta.
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Como as escolas privadas de pequeno e médio porte podem difundir o ensino híbrido e aperfeiçoar as suas metodologias, se estão sofrendo grave colapso financeiro em seu orçamento e talvez não tenham condições de pagar seus funcionários, aluguéis e contas, vindo a ter sua atividade inviabilizada?
A União pelas Escolas Particulares de Pequeno e Médio Porte, alerta que 30% a 50% das instituições correm o risco de falir, de forma que tem reivindicado linhas de crédito, redução no valor de tributos com o aumento do prazo para quitação e a criação de um voucher educacional no qual o governo ajudaria no custeio das mensalidades.
Aliás, não são apenas as instituições de ensino de pequeno e médio porte que estão enfrentando um momento extremamente desafiador, recentemente, tivemos a notícia de que o centenário Colégio Bennett, instalado na Zona Sul do Rio de Janeiro, irá encerrar as suas atividades no final do ano, em razão da evasão escolar e inadimplência durante a pandemia.
Nesse contexto ressaltamos que, dentre todas as duras mazelas que a pandemia da covid-19 trouxe, uma das mais graves — o iminente colapso da educação, com potências sequelas a se prolongar no tempo — pode ser severamente mitigada com a oportuna e eficiente implementação das políticas públicas vigentes, bem como as que ainda serão implementadas, como o Projeto de Lei Complementar (PLP) 195/20, que possui como objetivo prestar auxílio financeiro às instituições privadas de ensino que tenham sido afetadas pela pandemia do novo coronavírus.
O momento é de união da comunidade em prol desse direito fundamental, para que a educação de nossa sociedade não reste ainda mais prejudicada após a pandemia do novo coronavírus ou que, pelo menos, tais prejuízos sejam mitigados ao máximo. É interesse de todos que as escolas não quebrem.
Nesse cenário, as próprias instituições colapsadas poderão construir um caminho para que o destino não seja o encerramento de suas relevantes atividades, importantíssimas para o nosso futuro, utilizando as ferramentas disponíveis para renegociar seus contratos, equalizar as suas finanças, manter seus alunos, mediar seus ativos e passivos, diferir os impostos e obter incentivos.
*Artigo escrito por Aline Afonso Silva da Rocha, advogada do MLA- Miranda Lima Advogados e Pablo Hertz Bruzzone Leal, sócio e advogado do MLA.
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