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O jornal na escola e a formação do jovem protagonista

Muito se fala sobre usar o jornal na sala de aula. Mas como, afinal, o texto jornalístico pode contribuir para o aprendizado e a formação dos estudantes da educação básica? O jornal na escola favorece, ao mesmo tempo, a aquisição de conhecimentos, a formação do […]

Publicado em 28/01/2022

por Mônica S. Gouvêa

jornal-joca Jornal Joca completa 10 anos (foto: divulgação)

Muito se fala sobre usar o jornal na sala de aula. Mas como, afinal, o texto jornalístico pode contribuir para o aprendizado e a formação dos estudantes da educação básica?

O jornal na escola favorece, ao mesmo tempo, a aquisição de conhecimentos, a formação do leitor e do escritor autônomo e a constituição do cidadão reflexivo e engajado no estabelecimento de uma sociedade melhor. Para isso, vamos nos pautar no trabalho realizado com o jornal Joca –  voltado ao público infantojuvenil brasileiro – que completa 10 anos em um momento de crescimento exponencial de conteúdo noticioso publicado nos meios de comunicação, nas redes sociais e nos aplicativos de mensagem e de busca crescente de informações por parte de crianças, jovens e adultos, em decorrência da pandemia da covid-19.

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Leia: Formar novos leitores para entenderem a si e ao mundo

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Estudos revelam que o conteúdo jornalístico por meio de notícias, reportagens, entrevistas etc. é importante para o desenvolvimento infantojuvenil, já que, desde cedo, habilita a criança a interpretar o mundo em que vive, a perceber a diferença entre as relações socioculturais e a criar empatia pelo outro, suscitada pela possibilidade de reflexão sobre sua própria cultura e a de outras sociedades a partir de informação. Por outro lado, esses estudos também revelam que a escola é hoje a principal responsável por formar o leitor proficiente desse conteúdo ao estimular a leitura sistemática de jornal e ensinar seus procedimentos.

O jornal como objeto de trabalho na escola

Nas últimas duas décadas do século 20, educadores passaram a se perguntar o que acontecia com os estudantes do ensino médio, que, já no final do curso, ainda não apresentavam autonomia para escrever com competência e se tornar profissionais, como era esperado depois de tanto aprendizado.

Pesquisadores avaliaram que aquilo que se aprendia na escola estava muito distante do que o mercado de trabalho exigia. As práticas de leitura e de escrita ensinadas na sala de aula não se relacionavam com as do mundo externo, já que o tipo de trabalho era outro e os gêneros textuais (contos, fábulas, poemas, textos informativos etc.) não eram contemplados. Era exigida a produção de redações ou composições sobre temas fechados e distantes da realidade dos estudantes, e os textos criados tinham, geralmente, apenas o professor como leitor.

A partir daí, o esforço passou a ser como ensinar os alunos a ler e a escrever os gêneros textuais reais do mesmo modo que fazem os leitores e escritores adultos ou do mundo fora da escola. E ensinar assim é trabalhar com as práticas sociais de leitura e escrita, definidas pela pesquisadora argentina Delia Lerner como os objetos de ensino da escola. Hoje é sabido que faz muito mais sentido para os alunos aprender dessa maneira.

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Entretanto, o que desejamos que eles aprendam em leitura e escrita quando pensamos em trabalhar com o jornal na escola? Espera-se que aprendam os comportamentos e procedimentos dos leitores e dos escritores de jornal do mundo fora dela.

Em que o jornal contribui para o desenvolvimento do estudante?

Além de leitura e discussão do conteúdo jornalístico em variadas disciplinas, as possibilidades didáticas de uso do jornal na escola são a leitura habitual de notícias, as sequências de atividades, o projeto didático e as atividades independentes. Delia Lerner denomina esses tipos de atividades como Modalidades Organizativas, entendidas como diferentes meios de planejar as aulas, que garantem uma boa gestão do tempo na distribuição das atividades, a fim de que o professor dê conta de trabalhar todo o conteúdo necessário.

Em cada um desses tipos de atividades, desenvolvem-se os procedimentos leitores e escritores dos alunos, desde que sejam trabalhados de maneira sistemática.

Para formar o leitor habitual de jornal, o momento de leitura de notícias e de comentários sobre elas deve acontecer regularmente na sala de aula. Também os comportamentos desse leitor específico e os procedimentos utilizados por ele para escolher o que irá ler no jornal devem ser praticados com os estudantes da mesma maneira como faz um leitor adulto.

Em relação ao comportamento do escritor de textos jornalísticos e em como trabalhar a escrita desses textos com os estudantes, é necessário pensar de acordo com o ponto de vista do jornalista que escreveu a notícia ou a reportagem e procurar seguir os mesmos procedimentos de que ele se utilizou para escrever uma matéria: apurar ou pesquisar o assunto da notícia; entrevistar pessoas; tomar notas de informações importantes; planejar o texto da notícia, organizando uma hierarquia de informações;escrever a matéria; revisar e publicar o texto.

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Porém, é importante lembrar que atuar com o jornal na escola tem um objetivo que vai muito além do trabalho com a leitura e a escrita. Estamos falando da formação integral do estudante, já que acompanhar e entender facilmente o que acontece no país e no mundo, de maneira interessante, possibilita ao jovem adquirir uma visão reflexiva e crítica dos acontecimentos e, também, a vontade de participar e agir para provocar melhorias em nossa sociedade.

Um exemplo disso é o estímulo que a leitura da reportagem sobre as crianças migrantes refugiadas da Venezuela representou para muitos estudantes, a ponto de participarem do projeto Mi Casa, Tu Casa, de escrita de cartas e doação de livros, promovido pelo jornal Joca em parceria com o ACNUR (Agência da ONU Para Refugiados).

A educação midiática e o acesso à informação de qualidade

No centro da formação do leitor de jornal está presente, hoje, a necessidade de formar o estudante como um consumidor de mídia consciente, pois sabemos que, atualmente, o contato de crianças e adolescentes com os meios de comunicação é tão grande que perde apenas para o período de sono. Nesse contexto, a educação midiática pode contribuir de duas maneiras: (i) orientar os jovens sobre como consumir criticamente as informações e mensagens que recebem; e (ii) incentivá-los a usar tecnologias diversas para expressar seus pontos de vista como produtores de mídia. Vale destacar que se informar para aprender não depende apenas de acesso aos meios disponíveis, mas também da capacidade de interpretar, selecionar e utilizar o conteúdo. E isso se aprende na escola, com a mediação do professor.

A pesquisa realizada por Doretto e Generali com crianças que possuem acesso ao Joca revela que, mesmo podendo ler o jornal quando quiserem e, eventualmente, na companhia dos pais, o consumo jornalístico necessário para que elas se tornem leitores habituais de jornal acontece majoritariamente como resultado do estímulo sistemático que recebem na escola. Destaca-se, portanto, o importante papel do professor para organizar e estimular o consumo de mídias jornalísticas.

A criança que cresce lendo jornal desenvolve o senso crítico, que a leva a questionar a veracidade e a natureza das fontes de informação de conteúdos jornalísticos e outros de origens diversas. E a meta é tornar os estudantes conscientes de como atuam os veículos de comunicação. Nesse sentido, o hábito de ler jornal e a busca regular por informações tendem a provocar uma atitude engajada e interessada pelo que acontece fora da escola. No espaço formal de educação que é a escola, os meios têm papel indispensável como elemento educativo.


O Joca é um jornal para crianças e adolescentes, que traz as mesmas notícias do Brasil e do mundo publicadas nos jornais adultos com linguagem adequada à faixa etária, além de reportagens sobre assuntos do interesse deste público.


* Mônica S. Gouvêa é socióloga, psicóloga e mestre em educação. É diretora educacional do jornal Joca.

Bibliografia

CRISTIANINI, Jornal Joca, 2021. Joca e ACNUR convidam jovens para ação com refugiados e migrantes da Venezuela. Disponível em: https://www.jornaljoca.com.br/joca-e-acnur-convidam-jovens-para-acao-com-refugiados-e-migrantes-da-venezuela-2/. Acesso em: 16/01/2022 (ou edição impressa número 168, 16 de abril de 2021).

DORETTO, J.; GENERALI, S. O consumo de notícias por crianças durante a pandemia da Covid-19: estudo com leitores de um jornal infantojuvenil. Contracampo (UFF),

EMPINOTTI, M. L.; PAULINO, R. C. R. Aproximações entre jornalismo e educação. Comunicação & Educação, ano XXIII, n. 1, p. 53-63, jan./jun. 2018. Disponível em:

<https://www.revistas.usp.br/comueduc/article/view/117506/140325>. Acesso em: 2 jan. 2022.

LERNER, D. Ler e escrever na escola: o real, o possível e o necessário. Artmed, Porto Alegre, 2002.

Projeto Mi Casa, Tu Casa ∙ Minha Casa, Sua Casa. Disponível em: <https://conteudo.jornaljoca.com.br/mi-casa>. Acesso em: 16/01/2022.

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Autor

Mônica S. Gouvêa


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