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José Pacheco

Educador e escritor, ex-diretor da Escola da Ponte, em Vila das Aves (Portugal)

Publicado em 21/12/2023

Entre a barbaridade e a fraternidade

Os horrores do mundo continuam, mas novas construções sociais de aprendizagem também

Maricá, 31 de outubro de 2043

O amigo Sérgio mostrava-se preocupado com o meu silêncio:

“Espero que esteja bem e feliz, apesar dos horrores a que temos assistido, diariamente, que põem à prova nossa crença e esperança na humanidade — mas, ao mesmo tempo, acentuam a necessidade de uma educação que fomente a fraternidade e o respeito à diferença”. 


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Um famoso ‘influencer’ (era assim que se designava quem, em redes sociais, tinha ‘seguidores’) comentava os ‘horrores’:

 “O mundo está pesado. Uma espessa camada de tristeza está sobre nós. Cada um reage a seu modo. Alguns estão agressivos, outros intolerantes, muitos estão deprimidos. É preciso construir esperança, derramar nos espaços que habitamos uma poeira de amor e sentimentos positivos”.

Estávamos em pleno período das conferências municipais preparatórias do Plano Nacional de Educação 2024-2034. A elas assistia, atento, mas reservado, obsequiosamente calado. Já participara na preparação do PNE 2014-2024 e alertara para o risco de repetirmos erros de antanho. 

Àquilo que é novo não se deve aplicar raciocínios dedutivos. Há 30 anos, aconselhei que o debate acompanhasse a conceção e prática de uma nova educação. A bafienta escola do século 19, subentendida no texto das conferências, viria a neutralizar todas as intenções constantes das 20 metas do plano 2014-2024. 

Nas conferências de 2023 e 2024, não me pronunciei. Quedei-me por uma escuta atenta. Mas, já era de mau agoiro que no texto-base das conferências se naturalizasse práticas obsoletas e que a discussão sobre os sete eixos decorresse em salas de cadeiras enfileiradas, com apoio de braço só do lado direito (como se não houvesse esquerdinos por ali…).  

Com a vovó Ludi e uma equipe de extraordinários educadores, tentei que os 10 anos que se seguiram fossem de mudança e inovação. Enviamos para secretarias, agrupamentos, universidades e outras instituições um ‘convite’. Reconhecíamos ser inadiável o cumprimento de planos municipais e nacionais, concretizando a melhoria da qualidade da educação, a erradicação do analfabetismo, a sustentabilidade socioambiental, a promoção da gestão democrática e da cidadania, com ênfase em valores morais e numa ética do cuidar.

Avaliando o projeto ‘experimental’ desenvolvido ao longo de 2023, concluímos ser possível assegurar a materialização do princípio que dizia ser a educação um direito de todos e que todos poderiam aprender, desde que fossem criadas condições para tal. 

Desenvolvemos um projeto de formação continuada e de transformação das práticas educacionais para promover uma boa qualidade da educação, com potencial de difusão em rede. Realizamos reconfigurações de práticas escolares em escolas das redes municipais e estaduais por meio do desenvolvimento de novas competências e da reelaboração da cultura pessoal e profissional dos seus professores.

A criação de protótipos de comunidade de aprendizagem correspondeu à necessidade da instituição de novas construções sociais de aprendizagem. Nesses contextos se assegurou a efetiva prática de educação integral.

Construídos indicadores de melhoria da qualidade da educação, formulamos diretrizes a adotar na formação de profissionais de desenvolvimento humano. A celebração de contratos e termos de autonomia permitiu dispormos de um tempo de sereno e profícuo trabalho. Propiciada a estabilidade das equipes de projeto, se tornou possível cuidar do socioemocional dos professores e, sem fazer dos alunos cobaias de laboratório, consubstanciar tarefas e alcançar objetivos. 



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