NOTÍCIA
Nascer com o dedinho que desliza fácil no tablet ou no celular não garante que se tenha condições críticas de circular com segurança no universo online
Januária Cristina Alves* | Estamos todos conectados. Mesmo aqueles que, por algum motivo, não têm acesso direto à internet (e não são poucos, infelizmente), são impactados pelo que circula no chamado ‘ambiente online’, seja de forma econômica, social, cultural ou pessoalmente. Vivemos enredados e, diante dos resultados que temos visto da influência do mundo online no offline — discurso de ódio, bullying, extremismo e violência, fake news e toda sorte de desinformação —, mais do que nunca é preciso educar para a cidadania digital.
Cidadania digital é o direito garantido ao indivíduo de ter acesso a todos os tecnológicos disponíveis, ao mesmo tempo em que deve respeitar as normas para fazer uso deles de forma ética e sustentável. Segundo a Safernet Brasil, criadora da disciplina de cidadania digital a ser aplicada em escolas, trata-se da educação que busca preparar a sociedade para um uso seguro, responsável, ético e positivo das tecnologias.
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A questão que se coloca nos dias de hoje é que as crianças e jovens dessa chamada geração Z, que já nasceram conectados, são os alvos mais fáceis das chamadas ‘fake news’ ou notícias falsas. Ou seja, nascer com o dedinho que desliza fácil no tablet ou no celular, ou ter as informações do mundo inteiro a um clique de distância não garante que se tenha condições críticas de circular com segurança no universo online.
Diversos pesquisadores do mundo inteiro — e aqui destaco especialmente os esforços de todos os que compõem a Mil Alliance, a Aliança Global para Parcerias em Alfabetização Midiática e Informacional da Unesco, composta por mais de 700 organizações, governos e indivíduos nos cinco continentes, da qual tenho o privilégio de fazer parte — querem saber é o que fazer para preparar as novas gerações para saberem diferenciar uma ilação de um fato comprovado, uma opinião de uma informação. E para esta organização, a educação midiática é, com certeza, um dos caminhos mais eficientes.
Educar para a cidadania digital passa, sobretudo, pela conscientização do papel de cada um de nós como usuários da internet e mais especialmente das redes sociais (Foto: Shutterstock)
Educar para a cidadania digital passa, sobretudo, pela conscientização do papel de cada um de nós como usuários da internet e mais especialmente das redes sociais. Na ‘vida real’, todos somos influenciadores. Já há algum tempo que a questão dos números passou a ter menos importância quando se avalia o poder de influência de quem está nas redes sociais. Hoje já se fala em ‘micro influenciadores’ ou até em ‘nano influenciadores’: aqueles indivíduos que se comunicam com um público muito específico.
Cidadania envolve a participação de cada pessoa na sociedade em que vive. Ser um cidadão digital tem a ver com a nossa participação nesse universo online.
As fronteiras antes tão claras nos meios de comunicação com os quais estávamos acostumados como a TV, os jornais, o rádio, se liquefizeram com o advento da internet. Esse papel duplo e simultâneo nas redes tem rendido muitos debates.
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É preciso aprendermos a diferença entre interatividade e participação. Ao contrário do que muitos pensam, elas não são sinônimos. Como bem define o estudioso de mídias estadunidense Henry Jenkins, “a interatividade é propriedade da tecnologia, enquanto a participação é propriedade da cultura”. O que quer dizer que a participação deve ser um projeto educativo, de construção de cidadãos conscientes de seus direitos, possibilidades de atuação social, de seus deveres e compromissos consigo mesmos e com o seu entorno.
A resposta a essas questões não está pronta, pois é complexa e multifacetada. Mas é preciso formar cidadãos digitais capazes de respondê-las, entendendo que ser protagonista no universo online tem a ver com muito mais do que produzir narrativas e interagir nas plataformas por meio de comentários, memes e que tais. Tem a ver, sobretudo, com ser capaz de produzir conteúdos relevantes, criativos e, principalmente, que façam sentido para quem os produz e para a comunidade no qual se está inserido.
*Januária Cristina Alves é mestre em Comunicação Social pela ECA/USP, jornalista, educomunicadora, autora de mais de 50 livros infantojuvenis, duas vezes vencedora do Prêmio Jabuti de Literatura Brasileira, coautora do livro Como não ser enganado pelas fake news e autora de #XôFakeNews – Uma história de verdades e mentiras. É membro da Associação Brasileira de Pesquisadores e Profissionais em Educomunicação – ABPEducom, do grupo Jornalismo, Direito e Liberdade do Instituto de Estudos Avançados da USP e da Mil Alliance, a Aliança Global para Parcerias em Alfabetização Midiática e Informacional da Unesco. É colunista do Nexo Jornal e autora do curso de Educação Midiática da Fundação Santillana disponível no site: https://formacoes.santillanaeducacao.com.br/login/login-image-formacoes/
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