NOTÍCIA

Edição 290

A liberdade do pensar de Maria Nilde Mascellani e Lauro de Oliveira Lima

Mesmo desvalorizados, suas propostas continuam vivas e em diálogo com os tempos atuais. Nesta reportagem, família, pesquisadores e ex-alunos compartilham os métodos desses grandes brasileiros

Publicado em 21/11/2022

por Maria Cláudia Baima

Desenvolver a humanidade nas pessoas – esse foi o sonho de dois grandes expoentes da educação brasileira: Lauro de Oliveira Lima e Maria Nilde Mascellani. Viveram com imensa paixão e coerência, imunes às circunstâncias sociais ou políticas, colhendo dissabores e plantando amores. Ele nasceu em Limoeiro do Norte, Ceará, em 1921. Ela em 1931, no bairro do Brás, na capital paulista. Não ficaram conhecidos e estão ausentes nas formações para docentes, talvez porque ousaram enfrentar um sistema contrário à humanidade que pulsa no coração homo sapiens. Foram perseguidos e humilhados durante a ditadura militar imposta em 1964. Mas, do sofrimento, as sementes de uma educação libertária foram lançadas. Décadas depois, é possível recorrer aos ensinamentos de Lauro e Maria Nilde. Não por meio de vagas teorias, mas por testemunhos de vivências concretas, por métodos registrados em livros, teses acadêmicas, relatos, fotos e filmes.

O ensino vocacional de Maria Nilde

Entre 1961 e 1969, Maria Nilde coordenou seis Ginásios Vocacionais (GVs) em escolas públicas do estado de São Paulo – em Americana, Batatais, Barretos, Rio Claro, São Caetano do Sul e São Paulo. Em 1969, todas foram invadidas, simultaneamente, pelo Exército. No céu, helicópteros verdes intimidavam enquanto professores eram trancados em salas, materiais confiscados e queimados. Por que tanto alvoroço? Porque os jovens dos GVs aprendiam a pensar por si mesmos, a buscar a verdade dos fatos em diferentes fontes e a tirar suas próprias conclusões, a fazer conexões, a interpretar e considerar diferentes contextos, a compreender fenômenos pela experimentação. Para alguns, os GVs educavam jovens para serem agentes transformadores – homens e mulheres livres, donos de seus destinos. Para outros, formavam subversivos. 

“Pelos seis GVs, passaram cerca de 10 mil jovens”, afirma Luiz Carlos Marques (Luigy Marks), hoje responsável pela Memória da Associação de Ex-Alunos e Amigos do Vocacional (GVive), fundada em 2005.

Os depoimentos emocionam e trazem indagações: ‘como pôde acabar?’. Considerando os tempos de repressão, melhor perguntar: ‘como ela conseguiu implantar?’. Com a coragem de sua personalidade inquieta e criativa. No final dos anos 1940, a jovem Maria Nilde ainda cursava a Escola Normal Padre Anchieta, na capital paulista, e era conhecida por gostar de chegar o mais perto possível do objeto do conhecimento. Deu aulas para crianças no quintal da casa dos pais, no Brás. Observou que aprenderiam melhor se usasse elementos do cortiço onde moravam. Com as mães, discutia uma pauta all inclusive: higiene pessoal das crianças, em que momento faziam as lições de casa, de que brincavam…


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Em 1957, graduada em pedagogia pela USP, ela vai trabalhar em Socorro, em uma das 50 escolas do país onde havia as Classes Experimentais, criadas pelo Ministério da Educação entre 1959 e 1962, que seriam o embrião dos Ginásios Vocacionais. O personalismo de Emmanuel Mounier (1905-1950), a Escola de Sèvres, na França, e Escola Compreensiva Inglesa ajudaram nessa formatação. Maria Nilde foi convidada para coordenar os GVs, como projeto piloto de ensino renovado no estado de São Paulo.

 


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