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Miguel Thompson

Em memória

Publicado em 10/05/2020

O gestor como designer

A crise do coronavírus provocou um conjunto de ações que demonstram claramente que devemos buscar soluções de forma coletiva e colaborativa

Um dos grandes objetivos da escola contemporânea é a formação do ser humano integral. A integralidade que se almeja é a expressão de um ser humano em suas múltiplas dimensões, satisfeito com sua individualidade – mas também a de um cidadão empático, vinculado à sociedade.

A escola deve refletir esse desejo em seu cotidiano, como parte integrante de seus valores e de suas práticas. Promover uma gestão coletiva onde cada participante contribua com sua sabedoria e experiência é um ótimo exemplo para a comunidade escolar.


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No entanto, não é difícil, ao propor uma gestão coletiva, que se caia em um processo de assembleísmo, onde pontos de vistas divergentes não encontrem sínteses práticas, onde colaboradores pouco acostumados à participação coletiva não se expressem, onde personalidades mais fortes imponham seus pontos de vista e onde hierarquias sejam impostas ao grupo.

Construir uma estratégia colaborativa, em vez de uma solução, pode se tornar um grande problema. No entanto, nesse mundo volátil, incerto, complexo e ambíguo (VUCA, no acrônimo em inglês), não se pode mais abrir mão da experiência e do conhecimento existentes em cada um dos integrantes da comunidade escolar (dirigentes, professores, funcionários administrativos e famílias).

A crise do coronavírus provocou um conjunto de ações que demonstram claramente que a complexidade exige a força de todos. Não podemos nos enganar: as crises serão o novo normal. Da saúde psicológica dos estudantes às mudanças climáticas, da aleatoriedade, da economia, aos humores políticos.

Assim, o uso de ferramentais de gestão da coletividade, como a organização de conversas, o fluxo de opiniões e argumentações, o registro de ideias, e mesmo a simples elaboração de atas e de pautas tornam-se fundamentais para que a escola não se perca. Para isso, hoje existem muitas formas de gerir a expressão coletiva, seus desejos e propostas, sem abrir mão da eficiência administrativa e da rapidez na tomada de decisões.

Uma das abordagens mais interessantes é o Design Thinking (DT). Ultrapassando ao modismo, debruçar-se sobre essa abordagem como forma de aperfeiçoamento da escola pode ser uma excelente possibilidade para evitarmos dissipação de energia da comunidade e ganharmos assertividade nas decisões. O DT busca a solução de problemas de forma coletiva e colaborativa, em que as pessoas são colocadas no centro. O processo consiste em tentar mapear e mesclar a experiência cultural e o ponto de vista de todas as pessoas, no intuito de obter uma análise ampliada de determinado contexto e uma síntese coletiva, visando melhor identificar as barreiras e gerar alternativas viáveis para transpô-las.

Essa abordagem se aproxima muito das ideias e práticas do mundo da educação humanista: a valorização do conhecimento do aprendiz, típica do pensamento piagetiano, o investimento na experiência e na resolução de problemas práticos, professado por John Dewey, o valor da cultura comunitária, presente em Vygotsky, o trabalho de campo, típico do pensamento de Freinetiano. Podemos nos reconhecer como designers e educadores nessa abordagem coletiva de resolução de problemas.

Muitas escolas têm usado o DT como forma de encaminhar suas questões internas. Como exemplo, lembro o trabalho desenvolvido pelo Colégio Rio Branco de São Paulo, liderado pela diretora geral Esther Carvalho. Foi usado para as discussões estratégicas e a organização de novos espaços educativos, e vem sendo usado cotidianamente para o planejamento de ações pedagógicas.

Há muitas outras abordagens e métodos que podem ser aplicados para uma gestão coletiva eficiente. No mundo contemporâneo, o importante é colocarmos como valor central os talentos individuais, o esforço coletivo, a gestão horizontal, o respeito a todos os pontos de vista e a certeza de que só poderemos formar seres integrais e enfrentar os fenômenos como o coronavírus através da colaboração, da empatia e do respeito ao próximo. O gestor como designer, conectando diferentes campos do conhecimento, estimulando a criatividade e o potencial dos seus colaboradores, passa a ser um talentoso contador de histórias, cuja habilidade é mensurada por sua capacidade de elaborar uma narrativa coerente, verossímil e inspiradora que movimente toda a comunidade.

Leituras sugeridas:

https://endeavor.org.br/tecnologia/design-thinking-inovacao/  pesquisado em 29 de março de 2020.

Design Thinking: uma metodologia poderosa para decretarmos o fim das velhas ideias. Tim Brown com Barry Katz. Rio de Janeiro: Elsevier, 2010.

Miguel Thompson é diretor acadêmico da Fundação Santillana e presidente do Conselho Editorial da revista Educação.

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