NOTÍCIA
Mobilização da sociedade civil reverte recurso que travava o Projeto de Lei na Câmara dos Deputados; ampliação da licença paternidade era um dos principais pontos de tensão
O Projeto de Lei 6.998/2013, que altera o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) para incluir princípios e diretrizes para a formulação e implementação de políticas públicas para a primeira infância (0 a 6 anos) vai seguir para o Senado Federal. O PL, também conhecido como Marco Legal da Primeira Infância, correu o risco de ter sua tramitação travada na Câmara dos Deputados.
Aprovado por uma Comissão Especial da Câmara, o PL estava pronto para seguir para o Senado quando, no dia 22/12, o deputado federal Guilherme Campos (PSD-SP) entrou com recurso para que o texto fosse encaminhado ao Plenário da Casa. A manobra travaria o projeto, que teria que entrar na extensa “fila” de votação. O novo período legislativo, que inicia nesse domingo (01/02), também ameaçava a continuidade da proposta no Congresso. “Na prática tudo é arquivado com mudança de legislatura,” explica um assessor da Câmara dos Deputados.
Um dia antes do prazo final, nessa sexta (30), mobilização da sociedade civil coordenada por Vital Didonet, um dos maiores especialistas no tema no Brasil, conseguiu que 39 dos 66 deputados que haviam assinado o pedido de recurso voltassem atrás. Eram necessárias 33 adesões para que o recurso fosse suspenso. A mobilização também angariou mais de 300 assinaturas em carta entregue aos deputados para sensibilizá-los sobre o tema. Muitos alegaram terem assinado o pedido de recurso sem ler, tomados pelo calor do momento de fim de ano, na véspera do Natal.
“A primeira infância não é um tema corriqueiro aqui no Congresso. As descobertas da neurociência sobre essa fase da vida são recentes, então é natural que tenha havido falta de informação adequada sobre o projeto”, avalia o autor da proposta, deputado Osmar Terra (PMDB-RS). O deputado Guilherme Campos não retornou o pedido de entrevista da reportagem.
Licença paternidade
Segundo avaliação de quem acompanhou de perto a tramitação da proposta, o principal ponto de tensão gerado pelo texto foi a ampliação da licença paternidade de 5 para 15 dias. O argumento era o de que a proposta acarretaria em aumento de custos para as empresas.
“Ninguém vai quebrar uma empresa por causa disso. Comparando com o número total de funcionários, serão poucos que precisarão da licença num ano. Além disso, as empresas podem escolher se vão querer aderir ou não,” diz o deputado Osmar Terra. O argumento, entretanto, não teve o mesmo sucesso no caso da licença maternidade. A proposta inicial de ampliar o direito trabalhista para um ano não está no texto enviado ao Senado. A Comissão Especial da Câmara ficou receosa de que uma polêmica em torno do tema colocasse em risco todo o Projeto de Lei.
Política Nacional
O PL 6.998/2013 prevê a criação de uma Política Nacional integrada para a Primeira Infância. Na prática, todo Estado e todo Município seria obrigado a ter um programa voltado para essa faixa etária. Inspirado em programas como o Educa tu Hijo, de Cuba, que oferece alternativas de atendimento a crianças sem acesso à escola, o PL prevê atendimento integrado às crianças e suas famílias, envolvendo áreas como saúde, educação, assistência social e nutrição.
“Quanto mais crianças estiverem na escola, melhor. Mas não estando na creche, é importante que essas crianças tenham outras políticas públicas de proteção e estímulo”, diz Osmar Terra. A origem dos recursos, porém, só será regulamentada após aprovação do projeto. O texto prevê ainda um sistema de avaliação periódica da oferta dos serviços às crianças e a divulgação dos seus resultados.
As recentes descobertas da neurociência acerca da importância dos primeiros anos de vida vão mudar as políticas públicas do país, aposta o deputado Osmar Terra. “Há 20 anos, quando o ECA foi criado, não se sabia sobre o início da vida. Hoje, a maior dificuldade é mostrar a importância desse período e superar mitos como o de que essas políticas aumentam despesa. Esse é um enorme investimento que vai reduzir custos futuros, como o da violência. É uma política que muda a história da sociedade brasileira”.
O deputado acredita que seus colegas senadores estão comprometidos com o tema. Aposta na aprovação do projeto ainda em 2015.