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Educação no Mundo

Rumo à estação Finlândia

Autonomia escolar e boa formação de professores são alguns dos pontos que fazem a diferença no ensino do país, o mais bem colocado no Pisa (primeiro lugar em matemática e ciências e segundo em leitura)

Colado à sua folha, Ossian, de 10 anos, faz contas diante de Stefan, de 20, que vigia sua concentração. Stefan trabalha com sete outros assistentes, ao lado de 12 professores na escola de Espoo, em Helsinque. Hoje executa o que lhe pediu a professora Marita Harvi, que, simultaneamente, faz o resto da classe  – de 12 alunos apenas – calcular.

Ossian não está de castigo. A separação é pontual e corresponde a uma necessidade momentânea. Além disso, na pequena sala ao lado, outra criança  está lendo uma história em voz alta com um assistente. Na Finlândia, alternam-se facilmente tarefas e responsabilidades individuais em pequenos grupos. O objetivo é individualizar ao máximo o ensino, "oferecer apoio eficaz a cada aluno, tornando-o o mais autônomo possível o quanto antes", diz o jovem diretor do estabelecimento, Vesa Ayräs. Na escola Koulomestarin Koulu, Ja Païvako, tudo concorre para isso, até mesmo a arquitetura, que proporciona múltiplos espaços de convivência. Ali, como no resto do país, a maioria das crianças ingressa na escola aos 6 anos, ainda que o ensino obrigatório finlandês seja dos 7 aos 17 anos.

A escola finlandesa não se parece muito com as convencionais: Jaynap está de pé, outra criança abre e fecha sem parar a tampa de sua carteira, outra está sentada no pé da cadeira. Há tolerância, contanto que se preste atenção ao aprendizado. "A lousa interativa da minha sala autoriza uma abordagem mais física do conhecimento do que uma aula tradicional", diz Marita Harvi, como para desculpar-se pela desordem. "As crianças vêm à lousa mostrar suas respostas, gostam de se mexer, ficam contentes e trabalham." Outro menino está na mesa da professora, comandando o computador. Mas a tecnologia não explica tudo.

A palavra de ordem é confiança na capacidade de cada criança aprender à sua maneira, inclusive as 30 crianças com necessidades especiais que estão entre os 330 alunos da escola. Aqui, a individua­lização do ensino é total, como para os filhos de imigrantes, que são apenas 2%. Sejam quantos forem, recebem reforço a fim de aperfeiçoar a língua do país.

Assim, na Espoo alguns estonianos, somalis, russos e um mexicano preenchem lacunas em finlandês tranqüilamente. "Refutamos a idéia de que as crianças possam ser desiguais diante da escola", insiste Vesa Ayräs. O Programa Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa, na sigla em inglês) mostrou em 2001, 2003 e agora em 2007 que a escola finlandesa é aquela em que as origens socioprofissionais e migratórias são menos visíveis nos resultados: ela é equânime. A ajuda dispensada provém dos 6% do PIB investidos no setor; conseqüentemente, o mercado de aulas particulares não existe. A escola é totalmente gratuita. Até o almoço está incluído.


Uma abordagem pragmática

Para ser eficaz, a escola de Espoo criou uma pedagogia levando em consideração todos os grandes pedagogos e apostou no learning by doing (aprender fazendo), um dos credos do sistema educativo. Na 5ª série, por exemplo, os alunos trabalham técnicas menos teóricas do que o convencional. Até o ensino da matemática é pragmático. "Os conhecimentos necessários em matemática variam muito de uma profissão para outra. Por isso, nosso ensino privilegia a capacidade de usá-la em situações práticas", analisa Jouni Vãlijärvi, diretor do Instituto de Pesquisa em Educação da Universidade de Jyvâskylâ. Essa abordagem dá vantagem aos finlandeses porque o Pisa avalia mais o desempenho do que os conhecimentos. Mas o ponto de vista pedagógico pode variar de uma escola a outra.

Os ensinos fundamental e secundário possuem manuais reduzidos. "Um documento de 200 páginas para os de 6 a 9 anos; outro com mesmo volume para os de 9 a 17", salienta Jouni Vãlijärvi, que participou da elaboração. Além disso, as autoridades locais dispõem de boa margem de manobra na condição de grandes financiadoras das escolas e responsáveis pela garantia do bom padrão de educação no território. Qualquer que seja o método escolhido, "todas as escolas atingem o mesmo nível", diz o pesquisador.


A autonomia sem pressão

"Não foi se atendo apenas aos resultados que a Finlândia construiu o sistema mais admirado da Europa, mas garantindo aos estabelecimentos uma grande autonomia e incentivando os professores", explica Jouni Vãlijärvi. Como a sociedade, as municipalidades e os diretores de escola deixam o ensino por conta do professor, que não é pressionado nem submetido a avaliações nacionais. Por outro lado, oferecem-lhe auxílios, entre os quais a formação contínua. "Para a utilização de minha lousa interativa, fiz um curso com os colegas que também o desejavam", lembra Marita Harvi.

Nessa cadeia de confiança, o professor crê na capacidade de progredir de todos os seus alunos. Nada de notas antes do 2º grau, aos 12 anos. Ninguém é superdotado nem nulo; todo mundo faz progressos em seu ritmo, sem reprovação. Em caso de necessidade, há apoio e os objetivos são sempre fixados a curto prazo, "para que a criança não esmoreça e possa ela mesma observar os progressos que faz", explica uma professora. Ao final, nesse sistema sério demais para aceitar a educação competitiva, a metade de uma classe de último ano ingressa no ensino superior.

O atual governo pretende ainda avançar. Antes de 2009, as universidades também serão autônomas. Mais um passo nesse país de luteranos em que a modéstia parece ser uma segunda religião.


Ser professor é um sonho

A profissão mais popular entre os jovens finlandeses? Professor. No ano passado, eram 1.400 candidatos à formação na Universidade de Helsinque. A seleção é dura: somente 100 foram admitidos. Para Leena Krokfors, formadora em Helsinque, "não é o salário que os atrai, mas a imagem da profissão". Numa Finlândia rural, que só tardiamente se livrou do jugo do poderoso vizinho russo, o professor sempre foi uma espécie de herói nacional. É aquele que trouxe a cultura a uma população muito isolada, num país em que a instrução obrigatória só data de 1921. Além disso, o nível de formação certamente atrai os candidatos. "Desde 1974, todos os professores são formados em nível de mestrado", lembra Krokfors. São cinco anos de ensino superior com ênfase em pedagogia. "Ação, reflexão, ética" são as palavras-chave da formação do professor, segundo Krokfors.

"Primeiro, o nível de ação, pois o professor se vê diante de uma classe já no segundo ano. Num segundo nível, ele deve refletir sobre sua prática, confrontando-a com os modelos pedagógicos existentes, para finalmente construir uma ética da profissão", explica a formadora. O trabalho em grupo é privilegiado porque será praxe nas escolas, onde os professores são convocados pelo diretor a fazer parte de uma equipe. E, ao longo da carreira, o professor recebe uma formação contínua, cuja qualidade uma comissão quer ainda melhorar.
(Tradução: Mônica Cristina Corrêa)

Autor

Maryline Baumard, do Le Monde de L´Éducation


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