Diretora pedagógica do Colégio Santa Cruz, SP. É pedagoga com especialização em educação. Participou da produção e implementação do Programa de Formação de Professores Alfabetizadores do MEC.
Publicado em 07/05/2025
Ao reinventarmos cotidianamente a escola, cuidaremos para que as mudanças não estejam pautadas pelas tensões que colocam em risco os sentidos próprios da instituição
Urge reafirmarmos a importância e o legado social e político da escola, assim como é urgente também a tarefa de a reinventar para mantê-la viva e necessária. Tomo como minhas as palavras de Masschelein e Simons quando afirmam que “é exatamente hoje — numa época em que muitos condenam a escola como desajeitada frente à realidade moderna e outros até mesmo parecem querer abandoná-la completamente — que o que a escola é e o que ela faz se tornam claros”.
A escola, para os autores, “surge como a materialização e espacialização concreta do tempo que, literalmente, separa ou retira os alunos para fora da (desigual) ordem social e econômica (a ordem da família, mas também a ordem da sociedade como um todo) e para dentro do luxo do tempo igualitário”.
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Os professores Fernando Almeida e Maria da Graça Moreira sintetizam os sentidos da existência e da defesa da escola ao considerarem que “ela é instituída para criar gerações que pensem, se comuniquem, se instruam para escrever, ler, criticar, propor, desenvolver o pensamento científico e tecnológico e serem motivadas e instrumentalizadas para sempre saberem estudar”.
Urge voltar a afirmar a defesa da escola como agência civilizatória de larga escala. Tornamos nossas as palavras do professor Celso I. Henz: “é pela educação que gente humaniza gente. Se a humanização fora do convívio social é inviável, também é pertinente reconhecer que nenhum relacionamento, nenhuma organização social e política, nenhuma forma de sentir/pensar/agir dispensa uma aprendizagem, uma educação para e pela convivência dos seres humanos uns com os outros e com o mundo circundante”.
Cientes da urgência de renovarmos sentidos para a experiência escolar, encontramos um cenário muito complexo que convoca a existência de tempo, reflexão crítica e coletivos fortes e engajados em torno de um projeto comum. A partir do estudo cuidadoso das minúcias presentes no chão das experiências escolares, é preciso construir respostas às questões: para que serve a escola? Em tempos de transformação, que mudanças o currículo escolar precisaria produzir e implementar? Quando e como garantir a transmissão do legado da cultura do conhecimento produzida pela humanidade? A formulação conjunta das boas e potentes perguntas e os percursos para construirmos respostas consistentes devem ser cuidados muito antes da busca (ou compra) de soluções de inovação.
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Ao reinventarmos cotidianamente a escola, cuidaremos para que as mudanças não estejam pautadas pelas tensões que colocam em risco os sentidos próprios da instituição. Não defendemos a escola asfixiando-a com mudanças bruscas em seu percurso, ‘implantando’ soluções tecnológicas sem a participação e formação dos educadores ou ainda confundindo a importância da relação entre famílias e escola com a busca da ‘satisfação do cliente’. Não defendemos a importância da escola ao negarmos que aprender é um ato corajoso e exigente e que o currículo não pode se pautar unicamente pelo desejo ou aptidão do aprendiz, mas sim pelo compromisso de que é, sobretudo, na escola que convocamos os alunos ao acesso à vasta cultura humana e ao desvendamento dos fenômenos do nosso mundo e universo. A educação básica tem em seu sentido primeiro de existência a ‘formação de um comum’ que conversa com o mundo do trabalho, mas não se submete a ele como marcador curricular.
Assumindo que habitamos um tempo no qual a escola luta pelo seu sentido de existência entre permanências e transformações, nos cabe a pergunta se escolheremos a função de guardiões ou algozes.
Foto: Shutterstock
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