NOTÍCIA
Educação midiática no currículo escolar foi tema de evento no RJ organizado pelo Instituto Palavra Aberta com apoio da Fundação Roberto Marinho
Publicado em 27/05/2024
A desinformação é o risco global mais grave a ser encarado pela comunidade internacional nos próximos dois anos. Esta foi a conclusão do Fórum Econômico Mundial de 2024, realizado em janeiro. O dado foi reforçado em diferentes apresentações no Encontro Internacional de Educação Midiática, que aconteceu em 23 e 24 de maio, no Rio de Janeiro, organizado pelo Instituto Palavra Aberta e com apoio da Fundação Roberto Marinho.
Educar os cidadãos para ler criticamente a mídia não pode ser considerado a ‘bala de prata’ que vai solucionar a questão da desinformação. É o que defendeu a chefe da Unidade de Alfabetização Midiática e Informacional e Competências Digitais na Sede da Unesco, Adeline Hulin, citando como medida importante a responsabilização das plataformas digitais para avançar em termos de transparência.
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Em entrevista à revista Educação, Adeline, que é liderança mundial nesse tema, citou outros esforços que têm acompanhado pelo mundo. “Estive no Chile e lá está havendo uma formação em liberdade de expressão voltada às forças policiais abordando, entre outros tópicos, a importância da proteção a jornalistas. É um exemplo de iniciativa entre muitos outros. É necessário um esforço coletivo para combater a desinformação”, acredita.
Abrindo a tarde do primeiro dia do evento, o painel IA e a importância da educação midiática e do letramento algorítmico — como introduzir o tema no currículo escolar contou com a participação de nosso colunista Alexandre Sayad. Ele escolheu a definição da pesquisadora Dora Kaufman para iniciar sua fala: “inteligência artificial é um sistema estatístico de probabilidade”.
Em contrate a esta simplicidade, Alexandre, que é mestre em inteligência artificial e ética, argumentou que a primeira dificuldade imposta pela IA para a educação é o fato de ser invisível. “Estávamos muito acostumados a ver a TV e o rádio, como objetos físicos. Para fazer uma crítica à TV na sala de aula, partíamos da ideia do equipamento televisão. A IA é invisível, está embedada em coisas muito diferentes como no sistema de vigilância pública de câmeras, no nosso celular, na rede social, no Google”, explicou.
Dissipar esta invisibilidade é o caminho para construir uma relação diferente com a IA, segundo Mariana Ochs, coordenadora do EducaMídia, programa de educação midiática do Instituto Palavra Aberta.
“O termo ‘inteligência artificial’ em si é um artifício mercadológico, nome criado para seduzir as pessoas nos anos 1950 e atrair mais dinheiro para as pesquisas. Se trocássemos o nome para ‘SALAMI’ (acrônimo em inglês proposto pelo pesquisador Stefano Quintarelli) talvez percebêssemos que IA não pensa, não é inteligente e nem vai dominar o mundo”, satirizou Mariana.
De acordo com a coordenadora, com letramento algorítmico, chegaremos a um momento de apropriação crítica, quando seremos capazes de observar os interesses que regem os algoritmos e propor funcionamentos centrados no bem comum.
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O painel também contou com a presença da diretora de apoio à gestão educacional da Secretaria de Educação Básica do MEC, Anita Stefani. Na Base Nacional Comum Curricular (BNCC), a educação midiática já consta como competência a ser trabalhada de maneira transversal, mas, segundo a diretora, ainda há muito o que caminhar.
“Os primeiros desafios são de infraestrutura. A Estratégia Nacional de Escolas Conectadas pretende levar internet a cerca de 138 mil escolas, mas deve-se considerar que 40 mil delas ficam fora de áreas de fibra ótica, outras 4 mil não contam nem com energia elétrica. Então primeiro estamos trabalhando para entregar o básico para todas”, explicou Anita.
Ela também reconheceu que para abordar educação midiática em sala de aula, os professores devem se sentir aptos, capazes de assumir este papel condutor em um contexto que, muitas vezes, sentem saber menos do que seus jovens alunos.
“Neste sentido, o MEC tem investido em seminários e oficinas sobre o tema; um livro didático sobre educação digital já consta no Programa Nacional do Livro e do Material Didático (PNLD); lançaremos, em junho, edital para cursos voltados a professores e gestores”, contou.
Paralelamente a este esforço de conectar as escolas, a proibição do uso de celulares em salas de aula vem avançando no país, com legislações já em vigor na cidade do Rio de Janeiro e no estado do Rio Grande do Norte. Responsável por mediar o painel sobre IA e letramento algorítmico, o secretário-geral da Fundação Roberto Marinho, João Alegria falou à revista Educação sobre isso.
“No início da pandemia, foi criada uma grande expectativa pelo avanço tecnológico das escolas e é claro que não deu certo pelas circunstâncias de falta de estratégia, de formação de professores, de facilitação de equipamentos. Isso frustrou as expectativas da comunidade escolar. Esta negação da presença da tecnologia que vemos na proibição de celulares me parece um reflexo disso”, acredita.
Para João Alegria, o envolvimento dos gestores de escolas no tema da educação midiática pode ser um caminho para que o tema avance com mais consistência, já que “a maior parte dos projetos educacionais novos dão certo quando você embarca também a gestão escolar”.
Adeline Hulin, da Unesco, acredita no poder de educadores articulados em rede. “Professores têm que ter momentos para ver projetos bem-sucedidos de educação midiática acontecendo, poder ir a outras escolas, conversar com outros professores para que enxerguem os benefícios de abordar o tema e se sintam motivados a isso”, afirmou.
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