NOTÍCIA

Políticas Públicas

Autor

Redação revista Educação

Publicado em 16/07/2025

Educação infantil precisa ser compreendida como agenda de desenvolvimento da nação

A afirmação é do secretário de Joinville, que participou de discussões sobre regime de colaboração nesta etapa; Fundação Bracell e Cátedra Sérgio Henrique Ferreira acabam de lançar relatório sobre o tema

Por Juliana Ligorio para a revista Educação | Diante das dificuldades de um Brasil continental, o regime de colaboração na educação infantil entre estados, municípios e União tende a ser uma solução para expandir boas iniciativas como também auxiliar regiões com dificuldades similares. É o que destaca o relatório lançado hoje, 16, Regime de colaboração para a educação infantil, organizado pela Fundação Bracell em parceria com a Cátedra Sérgio Henrique Ferreira, do Instituto de Estudos Avançados da USP Polo Ribeirão Preto, SP.

Para além da obrigação do Estado no atendimento à creche e pré-escola, o que nem todos sabem é que a Constituição Federal de 1988 também inclui o regime de colaboração como prática para aperfeiçoar as etapas educacionais. 

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O estudo recém-lançado explica que esse modelo ganhou força nas últimas décadas, inclusive, a publicação dos Parâmetros Nacionais de Qualidade e Equidade da Educação Infantil e do Compromisso Nacional Criança Alfabetizada favorece a adoção de estratégias colaborativas. Só que a falta de regulamentação e de instâncias institucionais específicas tornam a colaboração frágil e dependente da vontade de gestores.  

O regime de colaboração, segundo o relatório, pode contribuir na educação infantil para a gestão de vagas e matrículas, definição de calendários anuais comuns, permuta de servidores ou equipamentos entre municípios e estados, assessoria técnica e pedagógica, produção e distribuição de materiais pedagógicos, formação de professores e gestores, monitoramento da qualidade e alinhamento na transição para o ensino fundamental.

regime de colaboração

Diferentes pesquisas destacam a importância de uma educação infantil de qualidade para o desenvolvimento, por exemplo, cognitivo e de socialização das crianças (Foto: Shutterstock)

Análise de um gestor

Diego Calegari, secretário municipal de Educação de Joinville (SC), foi um dos participantes da mesa de aprofundamento que resultou neste relatório — cuja experiência, segundo ele, foi rica. Chamou a sua atenção os casos de estados que apoiam profundamente a educação infantil dos municípios. 

“Tivemos exemplos de estados com a visão de que a educação infantil é mais que atribuição administrativa do município e, sim, um eixo de desenvolvimento humano, social, econômico, que precisa ser de qualidade e para todos — de modo que o estado, como poder público, também tem de olhar para isso. Um olhar que a educação infantil é mais do que uma agenda administrativa dos municípios, é uma agenda de desenvolvimento da nação”, relata o secretário Diego Calegari.

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Há estados que compreendem que “a educação infantil é mais do que uma agenda administrativa dos municípios, é uma agenda de desenvolvimento da nação”, diz o secretário de Educação Diego Calegari (Foto: arquivo pessoal)

Educação infantil ainda fragilizada

Diferentes pesquisas destacam a importância de uma educação infantil de qualidade para o desenvolvimento, por exemplo, cognitivo e de socialização das crianças, mostrando também o impacto da infância na adolescência e fase adulta.  

Contudo, falta valorização e compreensão dessa etapa escolar por grande parte da sociedade e, muitas vezes, até mesmo por instituições públicas. O que o país necessita, então, é um compromisso real com essa etapa educacional.

A pós-doutora Filomena Siqueira, diretora de projetos da Fundação Bracell, diz que o documento vem para reforçar que o regime de colaboração é uma estratégia fundamental para fazer avançar a agenda da educação infantil e apontar caminhos para que ocorra na prática. 

“Tem uma questão de desenho estrutural que coloca uma série de limitações e desafios para que os municípios consigam ofertar essa etapa com a qualidade necessária. Além disso, a educação infantil tem muitas fragilidades. Não é uma etapa consolidada, não só no ponto de vista de matrículas, mas também no que significa a pré-escola. Ainda não se tem clareza sobre isso por ser uma etapa que entrou recentemente para a educação e está no fortalecimento em termos de política pública”, analisa Filomena. 

A educação infantil ainda não é uma etapa consolidada, critica Filomena Siqueira, da Fundação Bracell (Foto: arquivo pessoal)

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Atuação coordenada

São grandes as diferenças financeiras, operacionais e técnicas entre os mais de 5.500 municípios do Brasil e, por isso, a colaboração permite garantir que profissionais e escolas em contextos menos favorecidos tenham as mesmas oportunidades que os outros. 

Mozart Neves Ramos, titular da Cátedra Sérgio Henrique Ferreira e um dos coordenadores da iniciativa, acrescenta que atuar em regime de colaboração significa desenhar estratégias e buscar mecanismos para uma atuação coordenada complementar entre os diversos atores de um mesmo território. 

Segundo Mozart, que já foi secretário de Educação de Pernambuco e, atualmente, é uma das principais referências no país em políticas públicas, para construir esse entendimento mútuo é preciso viabilizar o diálogo em espaços de deliberação e tomada de decisão verdadeiramente coletiva, em função do interesse público e do bem comum. 

regime de colaboração

Mozart Neves Ramos, titular da Cátedra Sérgio Henrique Ferreira: atuar em regime de colaboração significa desenhar estratégias e buscar mecanismos para uma atuação coordenada complementar entre os diversos atores de um mesmo território (Foto: arquivo pessoal)

Sobre o documento

O relatório Regime de colaboração para a educação infantil é resultado da construção coletiva que teve início no I Simpósio Internacional de Educação Infantil, realizado em junho de 2024 pela Fundação Bracell, a Cátedra Sérgio Henrique Ferreira, J-PAL, Insper e ainda cooperação da Unesco. 

Já o desenvolvimento do documento se deu no começo deste ano com a promoção de mesa de aprofundamento focada essencialmente no regime de colaboração, reunindo especialistas, gestores públicos, representantes de organizações da sociedade civil e do meio acadêmico, que atuam diretamente na formulação e implementação de políticas educacionais. 

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Além dos caminhos, no relatório são apresentados os desafios para o avanço do regime de colaboração como estratégia para alavancar a qualidade da educação infantil. Entre eles, a regulamentação específica para que ocorra a cooperação, tornando o processo suscetível à intencionalidade política de colaborar ou não, e o fato de os municípios enfrentarem realidades díspares, resultando em recursos materiais, humanos e financeiros inconsistentes com as suas atribuições. 

Também é apontado que a colaboração é um dispositivo fundamental para dar conta dos desafios da educação, por meio de práticas como a formação de redes de comunicação para trocar informações e experiências, a elaboração de resoluções comuns e a organização de ações conjuntas. 

Ainda segundo o documento, o regime de colaboração não se faz apenas com o envolvimento do poder executivo, mas também com a participação de outros setores e da sociedade civil. 

Exemplos sobre o papel que diferentes atores podem ter para impulsionar o regime de colaboração para a educação infantil, segundo o relatório da Bracell e Cátedra Sérgio Henrique Ferreira:

União: coordenar as macropolíticas educacionais por meio de apoio técnico e financeiro, com função redistributiva;

Estados: ampliar a compreensão de que as crianças e estudantes não são de determinada rede, mas do território, buscando assim tornar a trajetória escolar mais coerente;

Municípios: se engajar em estratégias de colaboração, que podem ser tanto intermunicipais quanto intergovernamentais;

Conselhos de Educação estaduais, distrital e municipais: podem realizar a revisão de seus atos normativos e, se necessário, editar normas complementares locais para viabilizar a implantação dos Parâmetros de Qualidade e Equidade para a Educação Infantil;

Universidades: além de contribuírem com conhecimentos e pesquisas em educação, são as entidades formadoras dos educadores que chegarão à educação básica com mais preparo e conhecimentos necessários para atuarem na educação infantil;

Terceiro setor: contribuir para acompanhar e monitorar o cumprimento dos direitos de crianças e adolescentes, além de produzir estudos e mapeamentos que podem sinalizar novas possibilidades para a política educacional, abrindo o leque para projetos que gerem melhores resultados ou viabilizem alinhamentos aos padrões de qualidade desejados;

Órgãos de controle, como Tribunais de Contas e Ministérios Públicos: podem desenvolver processos de acompanhamento, monitoramento e avaliação da qualidade da educação infantil, contribuir para a gestão democrática e a transparência nas tomadas de decisão, além da continuidade das políticas. 

Com intencionalidade

Mozart Ramos explica que já temos municípios referência de qualidade em educação infantil, mas que para que essa realidade seja de todos os municípios é preciso construir políticas mais assertivas, e que tenham a intencionalidade de estabelecer uma política de qualidade da educação infantil a partir do regime de colaboração do estado com o munícipio. 

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