Mestre em letras e consultora de gestão de projetos educacionais para redes públicas e privadas de ensino
Publicado em 28/10/2024
Professora autista defende que a educação de pessoas com TEA deve se distanciar das limitações e focar nas habilidades
Em O cérebro do autista: pensando através do espectro (ed. Record), Temple Grandin nos convida a repensar o autismo, destacando a diversidade de formas de pensar e viver. Seu alerta contra rótulos rígidos, como os do DSM (Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais), é um ponto de partida fundamental para refletirmos sobre a inclusão no ambiente escolar. O autismo, nos lembra Grandin, é um espectro repleto de nuances, e compreender essa diversidade é essencial para que a educação realmente acolha todos os estudantes.
Entre 2022 e 2023, o número de crianças com Transtorno do Espectro Autista (TEA) em salas de aula no Brasil cresceu 50%, chegando a 607.144 matrículas, segundo o Censo da Educação Básica. Esse aumento traz desafios e oportunidades: estamos, finalmente, abrindo espaço para que alunos neurodivergentes sejam parte integrante do ambiente escolar regular. Contudo, a inclusão demanda mudanças estruturais e estruturantes nas práticas pedagógicas.
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Grandin, autista, professora universitária e Ph.D. em zootecnia, nos provoca a ir além dos estereótipos e focar nas habilidades. Sua própria experiência é prova de que, com apoio adequado, os estudantes com TEA podem não só participar, mas prosperar. No entanto, muitos sistemas educacionais ainda enxergam o aluno autista mais pelas suas limitações do que por suas potencialidades.
A transformação de uma escola regular em uma escola inclusiva não é um processo automático. Colocar essas crianças em salas regulares sem repensar as práticas de ensino, sem suporte adequado aos professores e sem adaptar o currículo às diferentes formas de aprendizado é, na verdade, uma exclusão velada. Para que a inclusão seja significativa, é imprescindível investir em formação continuada e criar políticas que ofereçam apoio pedagógico especializado.
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A psicóloga Luciana Elias, em entrevista ao Jornal da USP, ressalta que o diagnóstico deve ir além de identificar dificuldades, reconhecendo também os recursos e habilidades do indivíduo. Com essas informações, é possível direcionar intervenções que ofereçam tanto desafios quanto experiências de sucesso, essenciais para o bem-estar dos jovens autistas. Isso cria um ambiente em que eles podem desenvolver confiança e potencial, promovendo um crescimento equilibrado que vai além das limitações percebidas.
E aqui surge uma reflexão importante: criar espaços escolares adaptados para acolher estudantes com TEA não traz impactos negativos para os alunos sem deficiência. Pelo contrário. Um ambiente desenhado para ser acolhedor e respeitar as diferenças beneficia a todos. Quando criamos uma escola que valoriza a diversidade, construímos uma cultura de solidariedade, cooperação e respeito. Não se trata apenas de incluir o aluno neurodivergente, mas de criar um espaço em que todos se sintam parte.
A diversidade, longe de fragmentar, fortalece o aprendizado, ensinando os alunos — neurotípico ou neurodivergente — a conviverem com realidades distintas, plurais.
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