NOTÍCIA
Psicanalista Vera Iaconelli fala sobre a saúde mental de alunos, docentes e gestores e defende espaços horizontais de escuta na escola
“Se acharmos que todos vão resolver os problemas da humanidade, a gente não vai sair do lugar.” É o que orienta Vera Iaconelli, psicanalista, mestre e doutora em psicologia, sobre a necessidade de os professores e professoras ouvirem os seus estudantes, mas terem a consciência de que não devem resolver todos os problemas sozinhos. Por exemplo, o professor pode articular e encaminhar a questão de um aluno para quem realmente possa ajudar a resolver essa situação, como a família e/ou profissionais de saúde.
A também autora das obras Mal-estar na maternidade (ed. Zagodoni), Criar filhos no século XXI (ed. Contexto), e Manifesto antimaternalista (ed. Zahar, 2023), participou ontem, 26, do painel Picadeiro – a mente na corda bamba, do Grande Encontro da Educação, realizado pela revista Educação. O evento aconteceu em São Paulo, no Centro de Professorado Paulista (CPP), sede central.
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Vera explica que na psicanálise não existe o termo saúde mental, já que dentro do tratamento, acredita-se que somos atravessados por paixões. Ela diz que “se não existe a saúde [mental], a negociação é diária, e sem a dose de sofrimento”, e precisamos lidar todos os dias com nossas emoções, como o medo, por exemplo.
“A gente não erradica nossas paixões, a gente mede”, comenta Iaconelli, sobre o comportamento dos adultos. Para ela, sempre há uma negociação civilizatória que precisamos fazer.
O ser humano
“Embora sejamos seres vivos entre outros, temos peculiaridades e temos ferramentas como: a autoconsciência e a autorreflexão”, explica Vera. Para ela, através do pensamento humano podemos refletir sobre o espaço e tempo.
Porém, temos os ônus e bônus em funcionarmos dessa forma, uma vez que temos dificuldade em nos comunicarmos, já que a nossa linguagem é diferente dos outros seres vivos e o “uso de palavras é uma ferramenta gigantesca”.
“Sofremos e nos curamos no laço social, mas esse é de uma linguagem cheia de equívocos”, analisa Vera.
“A escola não foi feita para a inclusão, foi feita desde sempre de forma a excluir as pessoas”, pontua a psicanalista. Neste ambiente, são reproduzidos todos os comportamentos que temos dentro da sociedade, todos os erros e acertos em relação à inclusão. Para ela, a escola tem uma dívida histórica com a inclusão, e as diferenças dentro dessa instituição, muitas vezes são patologizadas, ou seja, há uma tentativa dentro do ambiente normalizar os sujeitos.
Embora a escola seja o primeiro passo que a criança dá para um espaço público, nele há o encontro das várias famílias representadas dentro da instituição de ensino pelas crianças e educadores que trabalham nesse espaço. Esta reunião diversa, consequentemente, faz com que a escola se torne um dos últimos espaços republicanos, e os sujeitos acabam se estressando e adoecendo, segundo Vera.
“A escola se tornou um dos últimos espaços em que as pessoas de fato se encontram”, diz Vera Iaconelli.
Segundo a mestre e doutora em psicologia, precisamos ter espaços horizontais de escuta dentro das escolas, já que ao começarmos a trabalhar com as questões do sofrimento, isso não implica em adoecimento, mas esclarecimento de nossas dores. Ela ainda coloca que um dos processos mais curativos da psicanálise é o processo de nomeação de nossos problemas, já que assim legitimamos e nos sentimos reconhecidos.
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