NOTÍCIA
Mais do que números, o foco tem sido transformar vidas e desenvolver o potencial de cada estudante
Publicado em 02/05/2024
Por Ewerton Fulini*: Essa é uma história que nem todos conhecem: Ayrton Senna não era só apaixonado pelo automobilismo, mas pelo Brasil. Em 1994, dois meses antes do acidente em Ímola, na Itália, ele compartilhou com Viviane Senna, sua irmã, que sonhava com um país onde todos tivessem a oportunidade de serem vitoriosos. A família levou adiante a vontade do piloto e, em novembro do mesmo ano, fundou o Instituto Ayrton Senna, com o objetivo de transformar a realidade do país por meio da educação.
Após três décadas de atuação, olhar para a história do Instituto nos permite fazer uma releitura das transformações do Brasil no âmbito educacional. Embora o país tenha avançado em termos econômicos e em posicionamento global, em pleno 2024 ainda enfrentamos problemas do século passado. Dados alarmantes do Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb), de 2021, apontam que quase 65% das crianças não se alfabetizam no ano escolar adequado. Segundo o IBGE, somente 47% das pessoas que concluíram o ensino médio estão empregadas, enquanto esse número sobe para 79% considerando as com ensino superior completo. Essas são desigualdades que colocam o Brasil em 87º lugar no ranking do IDH mundial, com 22,5 homicídios por 1000 habitantes, conforme aponta o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD).
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Ao lado desses obstáculos históricos, como a alfabetização, recomposição de aprendizagem, combate à evasão e fracasso escolar, o Brasil ainda precisa lidar com desafios emergentes. Estamos falando de desenvolver capacidades como criatividade, resiliência emocional, determinação, foco, autoconfiança, tolerância ao estresse e colaboração, entre outras, aquilo que chamamos de competências socioemocionais ou soft skills. Isto é, habilidades necessárias para uma boa adaptação no mundo do trabalho e nos desafios do século 21.
Soma-se a esse cenário os efeitos da pandemia, que fragilizou ainda mais a alfabetização de crianças e adolescentes, impossibilitados de aprender com qualidade devido ao ensino remoto. Se até 2019 apenas 55% estavam alfabetizadas no ano adequado, em 2022, essa porcentagem caiu para 36%, segundo dados do Saeb.
Desse modo, olhar para os últimos 30 anos, também nos permite afirmar que o Instituto Ayrton Senna não apenas buscou investir naquilo que acreditamos estar na raiz de tantos outros problemas sociais, a educação, mas que acompanhamos de perto as transições e novas demandas impostas.
Para a implementação de nossas iniciativas em educação, firmamos parcerias com redes de ensino municipais e estaduais e oferecemos formações de professores, apoio em gestão e monitoramento e conteúdos educacionais. Desenvolvemos essas soluções com base em evidências científicas e a partir de paradigmas como o da eficiência e do combate à desigualdade, via implementação em larga escala. Para que os projetos educacionais não sejam passageiros, trabalhamos para que essas iniciativas sejam institucionalizadas como parte da política pública educacional dos territórios.
Além disso, para promover uma educação de qualidade, adotamos uma abordagem colaborativa, realizando coalizões com o terceiro setor. O objetivo não é apenas sensibilizar a população, mas engajá-la ativamente em debates que visam mudar políticas públicas educacionais. Sendo assim, desde a sua fundação, o Instituto Ayrton Senna esteve presente em todos os estados do Brasil, alcançando mais de 3 mil municípios e impactando a vida de mais de 30 milhões de estudantes. Mais do que números, nosso foco tem sido transformar vidas e desenvolver o potencial de cada um.
Um exemplo marcante do impacto do Instituto é a história de Marcos Ferrari. Inicialmente rotulado como adolescente problemático na escola, Marcos se encaixava na imagem clássica do aluno rebelde que xinga os colegas, toma advertências e se sente incompreendido dentro da sala de aula. Até que uma professora percebeu que a comunicação era uma habilidade a ser explorada. Ela presenteou o garoto com um livro, que mudaria o curso da sua vida. Ele passou a ler um livro atrás do outro e, em pouco tempo, se tornou o primeiro aluno da sala. Nos anos seguintes, Marcos se tornou presidente do grêmio na escola, representante de turma e se envolveu, cada vez mais, na vida coletiva escolar. Hoje, aos 28 anos, seguindo os passos de quem enxergou pela primeira vez seu valor, Marcos se tornou professor e coordenador pedagógico pela mesma rede pública de onde estudou.
Essa história reflete um desafio imenso para milhões de crianças e adolescentes no Brasil: a falta de oportunidades. Marcos é ex-aluno de um dos nossos programas, chamado SuperAção Jovem, que tinha como objetivo promover o protagonismo juvenil de estudantes do ensino fundamental e do ensino médio. Desde a fundação do Instituto, essas e outras iniciativas alcançaram mais de 36 milhões de estudantes em todo o país.
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Marcos, assim como tantos outros estudantes impactados nas últimas décadas, se conectam com duas faces do legado de Ayrton Senna. A primeira é amplamente conhecida pelos brasileiros e fãs mundo afora, que é justamente a coragem, garra e determinação pela vitória, características muito bem conhecidas durante sua trajetória na Fórmula 1. A outra está conectada com o sonho do piloto de que mais pessoas também tenham a oportunidade de ter seu potencial desenvolvido, assim como ele teve.
Em um ano especialmente importante para a educação no Brasil, marcado por debates sobre o novo ensino médio, estabelecimento de metas de alfabetização para os próximos 10 anos e eleições municipais em curso, queremos relembrar e ressaltar esse legado para inspirar governos, famílias, e toda a sociedade. Afinal, somos todos responsáveis por garantir o direito das crianças e adolescentes à educação de qualidade, de forma que elas sejam capazes de tomar as melhores decisões para o seu futuro. Mais do que tudo, reafirmamos nosso compromisso com o sonho de Ayrton Senna de transformar a realidade do Brasil por meio da melhor ferramenta capaz de trazer oportunidades: a educação.
*Ewerton Fulini é vice-presidente do Instituto Ayrton Senna
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