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Como formar para a inovação?

METODOLOGIA | Edição 199 Cursos de graduação buscam caminhos para formar profissionais capazes de pensar “fora da caixa”. Coordenadores defendem que isso só será possível se houver inovação do modelo de ensino por Flávia Siqueira O termo “inovação” já é velho conhecido de cursos de […]

Publicado em 22/06/2015

por Redação Ensino Superior

METODOLOGIA | Edição 199
Cursos de graduação buscam caminhos para formar profissionais capazes de pensar “fora da caixa”. Coordenadores defendem que isso só será possível se houver inovação do modelo de ensino
por Flávia Siqueira

Aline Spassini

Estudantes da Unisinos: oficinas no curso de administração para exercitar a capacidade de inovação

O termo “inovação” já é velho conhecido de cursos de pós-graduação, mas o conceito tem ganhado mais atenção também em graduações – para além dos títulos de uma ou outra disciplina. Em 2015, duas instituições de São Paulo abriram suas primeiras turmas de cursos de engenharia que anunciam ter foco em inovação. Um deles é o Insper, tradicional na oferta de formações nas áreas de administração e economia e que passa agora a formar engenheiros nas especialidades mecânica, mecatrônica e da computação. O outro é o Isitec, mantido pelo Sindicato dos Engenheiros do Estado de São Paulo (Seesp), que oferece a formação em engenharia de inovação, inédita no Brasil, a 50 alunos bolsistas.
No Insper, a proposta é formar engenheiros com uma boa dose de conhecimento em gestão. Irineu Gianesi, diretor dos cursos de engenharia do instituto, diz que boa parte das faculdades brasileiras da área forma profissionais com qualificação técnica adequada, mas o mercado já percebeu que isso não é suficiente. “Falta colocar no mercado o engenheiro inovador, e isso se reflete no número pífio de patentes no Brasil. É algo que o mercado entende que os cursos superiores não estão fazendo bem.” Para o professor, é necessário formar profissionais que, além de terem boa formação técnica, saibam encontrar recursos – financeiros e intelectuais – no mercado e mobilizá-los dentro de projetos viáveis e que resultem em inovações.
José Marques Póvoa, diretor de graduação do Isitec, faz um diagnóstico semelhante: “O ensino de engenharia no Brasil não é ruim, mas o mundo inteiro está mudando. Hoje, não adianta mais ir para o curso para aprender uma determinada técnica, porque ela muda muito rápido”. Segundo Póvoa, o foco do Isitec é formar engenheiros que “saibam aprender”, o que os qualificaria para atuar em “qualquer área”, incluindo setores e funções que ainda não existem – uma visão, admite o professor, que ainda contraria muitos profissionais e entidades da área. “O mais comum é que esse engenheiro vá trabalhar em tecnologia, mas nada impede que ele atue em recursos humanos, caso queira”, exemplifica.
Por onde começar
Mas, em termos práticos, como formar para a inovação? Em primeiro lugar, é preciso que o aluno saiba olhar para o problema e compreendê-lo com clareza para, em seguida, conseguir pôr em prática uma solução viável. Para isso, afirma Irineu Gianesi, o próprio curso deve inovar na metodologia. Aulas expositivas cedem lugar para a aprendizagem baseada em projetos, com os alunos trabalhando em grupo e o professor assumindo o papel de orientador. “Em todas as disciplinas, os estudantes realizam projetos em grupo. Mesmo nas mais tradicionais, como matemática”, conta o professor.

Sala de aula do Instituto Mauá de Tecnologia: mais aulas práticas a pedido dos alunos

O caminho foi o mesmo desenhado pelo Isitec. “A ideia é sempre trabalhar em equipes de estudo. Com isso, o professor se torna coadjuvante no aprendizado dos estudantes. Há uma mudança de meta: não queremos ser uma instituição de ensino, mas de aprendizado”, afirma José Póvoa. Nesse cenário, explicam os professores, o treinamento e a adaptação do corpo docente são decisivos para que iniciativa tenha sucesso. “Se houver recursos, a infraestrutura se faz. O ponto central e crítico é o corpo docente”, ressalta Gianesi. “Aos poucos, conseguimos formar uma rede de professores que querem fazer diferente. Alguns deixaram instituições tradicionais.”
Tanto o Insper quanto o Isitec contratam os professores com cerca de seis meses de antecedência em relação ao início das aulas – no Insper, esse tempo pode chegar a um ano. O objetivo é que eles tenham mais tempo para passar por treinamentos e detalhar os cursos.
A pesquisa e o planejamento da formação em engenharia do Insper foram feitos ao longo de quatro anos. O instituto firmou uma parceria com o Olin College of Engineering, de Massachusetts (EUA), que auxiliou a instituição brasileira na elaboração do currículo e na contratação de docentes. Gianesi considera um trunfo do Insper a oportunidade de começar um curso “do zero”. Em instituições tradicionais de engenharia, mudar o foco e a metodologia seria muito mais difícil, avalia o professor.
Para além da engenharia
José Póvoa diz esperar que o curso do Isitec ajude também a encontrar maneiras de reduzir a taxa de evasão dos cursos da área. Atualmente, esse indicador é de 25%, número que também representa o índice médio de evasão em todo o ensino superior brasileiro. Nas IES particulares, no entanto, a taxa é ligeiramente maior, 28%, como explica Mario Sergio Salerno, professor titular da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP).
O estudante Eduardo Avellar, 24, foi um dos que se decepcionaram com o que encontraram na graduação. Ele desistiu no primeiro ano e hoje estuda design no Instituto Mauá de Tecnologia. “Eu achava que os engenheiros criavam as coisas, mas me enganei. Descobri que eram os designers.”

Alunos de engenharia do Insper: formação deve preparar profissionais capazes de inovar

Métodos contemporâneos de concepção de inovações de fato emprestam muito da área de design. Claudia Facca, professora coordenadora da graduação em design da Mauá, apresenta uma definição que coincide justamente com o que cursos de engenharia têm buscado implementar: segundo ela, design é uma “atividade criativa, multidisciplinar, que tem o objetivo de desenvolver produtos e processos para melhorar a vida das pessoas”. O curso, que começou em 2007, também é baseado na realização de projetos pelos alunos. A professora conta que recentemente a graduação passou a incluir ainda mais atividades práticas – uma demanda que, segundo ela, partiu dos próprios alunos.
Outra área que fornece bases para os cursos que buscam formar profissionais inovadores é a administração, especialmente em sua interface com o empreendedorismo. A Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos) oferece, desde 2003, um curso de graduação que – a exemplo do que ocorre tradicionalmente em cursos de pós – leva inovação já no nome: Administração – Gestão para inovação e liderança, conhecido como GIL. Marcelo Fonseca, coordenador do curso, explica que o planejamento da graduação foi feito em 2001 e 2002 e teve como base uma pesquisa com empregadores, pesquisadores e egressos de administração. “Percebemos que os cursos eram todos parecidos e faltava pensar mais ‘fora da caixa’”, diz o professor.
Para enfatizar o caráter prático, o curso usa o termo “oficinas” em lugar de “disciplinas” e, segundo Fonseca, busca unir a capacidade de conceber soluções novas com a de mobilizar pessoas em torno delas – objetivo que coincide com parte da proposta do Insper. Na Unisinos, afirma o coordenador, o curso tem servido como referência para implementar um eixo de empreendedorismo e inovação em outras áreas de formação.

O que é inovação?
Veja como professores definem o conceito no contexto dos cursos de graduação:
Claudia Facca (Mauá): “De forma geral, inovação é fazer algo de uma maneira que ninguém fez. Pode estar no produto, no processo ou na forma como as pessoas usam.”
Marcelo Fonseca (Unisinos): “É pensar em soluções diferentes e que sejam sustentáveis em um contexto de mudança constante. A inovação não está necessariamente no produto, mas na capacidade de desenvolvê-lo.”
Irineu Gianesi (Insper): “A inovação requer três elementos fundamentais: (1) só é de fato inovação se gerar valor para as pessoas; (2) se for viável tecnicamente (3) se for viável economicamente.”
José Marques Póvoa (Isitec): “A inovação é geralmente associada à tecnologia, mas não se restringe a ela. Na graduação, está muito mais ligada à forma de pensar os problemas, com foco muito mais nas pessoas do que na técnica.”

 

O fator metodologia
Diante da demanda do mercado por profissionais capazes de inovar, tem ganhado espaço nos cursos de graduação a Aprendizagem Baseada em Problemas, conhecida pela sigla PBL, da expressão em inglês Problem Based Learning. A metodologia vem, originalmente, dos cursos de medicina e, em áreas como engenharia e design, o termo “problemas” costuma ser substituído por “projetos” – e a sigla se torna PjBL. Nessa metodologia, busca-se tirar o aluno da atitude passiva de receber o conhecimento dos professores e colocá-lo como aquele que deve gerar a demanda por aprendizado. Os alunos são apresentados a situações semelhantes às encontradas na vida profissional e devem, em grupo, investigar o problema e buscar soluções. Nesse cenário, o professor deixa de ser visto como a fonte única ou principal de conhecimento e assume o papel de instigar o aprendizado.  Muitos cursos tradicionais já empregam essa metodologia, mas normalmente a restringem a uma ou poucas disciplinas, o que deixa de lado uma das características fundamentais do PBL: a interdisciplinaridade. Implementar integralmente a metodologia, contudo, demanda mais recursos do que o cenário tradicional. Além de um planejamento detalhado, é preciso investir em treinamento para os professores e, muitas vezes, trabalhar com mais de um docente em uma mesma aula.

 

Autor

Redação Ensino Superior


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