NOTÍCIA
Instituições universitárias inauguram opções de cursos em horários alternativos para atender à dinâmica acelerada das metrópoles brasileiras
Publicado em 25/06/2014
Instituições universitárias inauguram opções de cursos em horários alternativos para atender à dinâmica acelerada das metrópoles brasileiras
por Antonio Carlos Santomauro
A cidade não pode parar. O lema, clichê conhecido, demonstra o frenesi desenvolvimentista da atualidade e a necessidade de os grandes centros permanecerem funcionando, sem descanso. Hoje é possível encontrar praticamente todos os serviços disponíveis a qualquer horário e essa realidade se estende à educação. Na tentativa de se adequar e conquistar um público específico, com horários apertados e necessidade de aprimoramento, instituições de ensino superior oferecem cursos de graduação em períodos alternativos ou diferenciados.
Um dos pioneiros na iniciativa é o Centro Universitário Ítalo Brasileiro (UniÍtalo), que oferece aulas de segunda a sexta-feira das 5h45min às 8h30min. O campus fica localizado na zona sul de São Paulo e possui cursos de bacharelado, tecnológicos e pós em gestão de pessoas e em psicologia organizacional.
O curso, lançado em 2009, tem alta procura e conta com cerca de 3,5 mil alunos: número expressivo considerando o total de 12 mil estudantes da instituição. E é nesse horário que o UniÍtalo obtém seus maiores índices de ocupação de vagas. “Há uma média de 70 a 80 alunos por sala, um pouco superior à do horário noturno. No período da manhã, temos média de 50 a 60 alunos por sala”, conta Fábio Souza, coordenador acadêmico do UniÍtalo.
A procura pelo horário da madrugada, ressalta Souza, expande-se mesmo sem o diferencial de preços mais atrativos. O curso de administração, por exemplo, é mais caro que o oferecido no horário da manhã e mesmo assim atrai uma quantidade considerável de estudantes.
Além disso, as aulas são muito disputadas pelo corpo docente, pois oferecem mais flexibilidade. “Muitos professores emendam o trabalho nesse horário com aquele que começa às 8h50min. Com isso, já na hora do almoço estão livres para dedicarem-se a atividades pessoais”, explica Souza.
Adequação certeira
Os cursos em horários diferenciados possuem foco em quem tem pouco tempo disponível ou dificuldade de locomoção. Para quem trabalha o dia inteiro, estudar antes de ir ao trabalho facilita o processo de aprendizagem e aumenta a assiduidade, pois não interfere na vida social do aluno. Ao estudar logo pela manhã o discente não está esgotado mentalmente e pode aproveitar melhor os conteúdos aprendidos. “Estou com a cabeça mais tranquila, e fujo do trânsito. Além disso, posso ficar com meu filho durante as noites”, diz Tatiane Ferreira, aluna do quarto semestre de tecnologia em marketing do UniÍtalo. Devido à facilidade, a aluna acrescenta ainda que pretende fazer uma pós-graduação nesse mesmo horário, assim que concluir seu curso.
Para Souza, coordenador do UniÍtalo, os cursos em horários especiais são uma grande oportunidade para as instituições e também um incentivo para os discentes que querem melhor colocação no mercado de trabalho. Mas o coordenador acredita que a proposta não é concorrente direta com a modalidade de ensino a distância, comumente entendida como uma boa opção para quem tem horários apertados. “Para mim, o ensino a distância não é para quem não tem tempo, mas sim para quem se desloca muito – por exemplo, um vendedor que está cada dia em uma cidade –, ou não tem horários muito fixos”, pondera.
Na opinião de Souza, os horários alternativos constituem uma opção interessante para quem vive em grandes cidades, como é o caso de São Paulo. “Mas creio que eles já são possíveis até mesmo em algumas cidades próximas da capital paulista, como Jundiaí e Campinas”, ressalta.
Para manter os alunos concentrados, a professora de marketing Áurea Cardoso usa um espaço diferenciado e dá aulas na quadra da instituição. A posição menos confortável é recurso capaz de ajudar a manter o foco, em um horário no qual eles provavelmente estavam mais habituados a permanecer em suas camas. “Procuramos movimentar um pouco mais as aulas desse período, conferir-lhes um tom mais prático”, relata a professora.
Áurea diz ter decidido dar aulas nesse horário porque ele permite, entre outras coisas, acompanhar seus filhos durante boa parte do dia, dispor de tempo para fazer um doutorado – cujas aulas têm início às 9 horas –, e frequentar uma academia após o término das aulas, às 8h30min. Além disso, madrugando ela evita o caótico trânsito paulistano e chega à escola em apenas quinze minutos (em horário convencional, precisaria de uma hora). “Tudo isso é qualidade de vida. Sinto que os alunos desse horário demonstram mais interesse e as suas notas têm média superior à de alunos do noturno”, acrescenta Áurea.
A Faculdade Flamingo também disponibiliza aulas com início durante a madrugada. São oferecidos dois bacharelados e cursos de tecnologia em logística, gestão da qualidade e gestão de recursos humanos a partir das 5h30min. “Os alunos desse horário compõem uma turma bastante animada e usam vários espaços da escola, até porque ela ainda está vazia”, conta Lucimar Regina Santana Rodrigues, diretora da unidade Lapa da Flamingo.
Lançados há pouco mais de dois anos, os cursos têm predominância de profissionais em busca de certificação, mas que não dispõem de horário fixo para sair do trabalho à noite. Há também donas de casa que abandonaram seus estudos para cuidarem da família e desejam completar sua educação superior.
De acordo com Lucimar, cerca de 180 alunos da Flamingo preenchem aproximadamente 20% das vagas disponibilizadas nesse horário.
Novas possibilidades
Horários diferenciados são destacados no site da Faculdade Sumaré como fator capaz de ampliar o poder de atratividade. A instituição ainda não oferece cursos de madrugada, mas estruturou um conjunto de cinco horários para atender às demandas diferenciadas: dois no período da manhã, dois no noturno, e outro com aulas nas sextas-feiras à noite e no sábado de manhã. O primeiro horário matutino começa às 7 horas, enquanto o primeiro noturno tem início às 18 horas (o bloco que mescla esses dois períodos do dia tem cerca de cinco horas nas sextas à noite e quantidade similar nas manhãs dos sábados).
De acordo com Ramon Casas Vilarino, diretor-geral da Sumaré, o horário com início às 7 horas da manhã é muito procurado por pessoas que trabalham à noite, e seguem dos locais onde exercem suas atividades profissionais diretamente para a faculdade. Já aquele com aulas às sextas à noite e sábados de manhã é bem demandado por quem tem filhos, pois nesse caso o período de ausência do lar é menor.
A instituição oferece a grade alternativa há cerca de oito anos. “Tínhamos bons índices de ocupação mesmo com os horários mais tradicionais, mas creio que hoje eles são superiores”, observa o diretor da instituição. Porém, para ele, por haver ainda uma demanda reprimida por ensino superior no Brasil, existe espaço para o surgimento tanto de cursos em horários tradicionais quanto os diferenciados.
Os especialistas ainda apontam que haverá a consolidação de novos horários alternativos. Por exemplo, cursos cujas aulas têm início já no final da noite e seguem até a madrugada. A Flamingo está tentando estabelecer esse horário, mas ainda não formou nenhuma turma. “Esse horário deverá viabilizar-se, especialmente quando o transporte público for melhorado, pois nossos alunos dependem muito do serviço”, projeta Lucimar Rodrigues.
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Especialização facilitada
Os cursos de graduação dos horários alternativos focam principalmente as classes C e D, geralmente com rotinas profissionais mais complicadas. Contudo, os horários pouco convencionais consolidam-se também em especializações dirigidas a públicos de classes mais altas ou mais qualificados: caso dos médicos, alvos da pós-graduação lato sensu em Medicina do Trabalho da Universidade Camilo Castelo Branco (Unicastelo).
Com duração de dois anos, essa pós inclui aulas oferecidas de maneira contínua em um final de semana de cada mês – tanto no sábado quanto no domingo –, das 8 às 18 horas. E é realizada não somente em São Paulo, mas também em cidades como Campinas, Santos, São José dos Campos, Londrina e Pouso Alegre.
Aizenaque Grimaldi, coordenador pedagógico dessa pós, considera seu horário propício para a rotina de seu público-alvo. “Ele tem vida extremamente dinâmica, que impossibilita a realização de curso de especialização durante o dia e dificulta a realização à noite, em vários dias da semana. Além disso, quanto mais um profissional ascende hierarquicamente em uma empresa, menos definido torna-se seu horário de trabalho: juntando tudo isso a problemas como trânsito, fica mais fácil para alguém desistir de uma pós que até pretende fazer, daí a necessidade de outras opções”, argumenta.
Já as Faculdades Oswaldo Cruz têm cursos de pós – em áreas como Saúde e Engenharia –, cujas grades podem incluir aulas durante todo um sábado e as manhãs de domingo. De acordo com Oduvaldo Cardoso, diretor da pós-graduação dessa instituição, tais horários satisfazem as necessidades de profissionais de áreas como a saúde, muitas vezes sujeitos a trabalho em regime de plantão. “Também atendem demandas provenientes de outras cidades, onde não há cursos para complementar as necessidades profissionais, e os interessados vêm a São Paulo em busca de especialização”, complementa Cardoso.
Segundo ele, a Oswaldo Cruz trabalha com esses horários alternativos desde 2010. “E há solicitações desse tipo de grade horária para diversas áreas do conhecimento”, finaliza.
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