NOTÍCIA
É importante diferenciar bullying e violência de outros problemas, defende Luciene Tognetta, referência em convivência na escola
Publicado em 26/09/2024
Na escola, há diferentes problemas de convivência – e tratar todos da mesma forma, considerando-os como violência, pode ser perigoso. Isso porque problemas como o bullying, por exemplo, possuem características próprias e exigem um olhar diferente e ações específicas para seu combate. Foi o que defendeu Luciene Tognetta, doutora em psicologia escolar, durante o painel de abertura do segundo dia do Grande Encontro da Educação, realizado em São Paulo, SP, que acontece no Centro do Professorado Paulista. Cesar Callegari, sociólogo e consultor educacional, também participou da mesa
Luciene lembrou que o bullying possui uma série de características próprias, como a repetição, intenção de ferir, alvo frágil que se vê com menos valor, desigualdade de poder físico ou psicológico, simetria de autoridade (ou seja, ocorre entre pares) e um público que assiste. Ela destacou que a vítima não tem forças para sair desse papel e costuma ser apática, o que dificulta a identificação dos casos. “Quando a família e a escola sabem, a coisa já está explodindo”, afirmou.
A especialista reiterou que o bullying é um “problema escondido” e que o fato de ocorrer entre pares o diferencia em relação a outras violências – como seria no caso de violência entre professor e aluno, por exemplo. No caso do bullying, há o diferencial de alunos frequentarem os mesmos espaços (físicos e virtuais) e possuírem o desejo de pertencer ao mesmo grupo. “É por isso que o bullying é tão cruel: ele destrói a identidade de quem quer pertencer ao mesmo grupo social”, afirmou Luciene.
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Para combater a violência na escola, a especialista defendeu a promoção da convivência. Além disso, afirmou que é importante saber diferenciar o que de fato é violência do que é um caso de indisciplina, por exemplo. Isso é necessário para não tentar usar as mesmas soluções para problemas distintos.
Luciene destacou, ainda, que a função da escola é formar para a sociedade e que o espaço deve ser de diálogo. Ela defendeu a importância de que, para mudar a escola, é preciso ‘mexer’ em três dimensões: a relacional (com a realização de assembleias, além do estímulo para que alunos pensem em soluções), curricular (com temas como xenofobia e patriarcado presentes no currículo e realização de discussões) e institucional (que haja, na escola, quem possa ver os problemas).
Sobre esse último ponto (institucional) a especialista lembrou que as vítimas não costumam contar o que acontece para as famílias, mas que podem contar para os amigos. E destacou iniciativas como a criação de “equipes de ajuda”, em que alunos são treinados para ajudar colegas, ouvi-los desabafar e ter um olhar atento para a convivência, por exemplo.
Cesar Callegari, sociólogo e consultor educacional, também participou do painel. Em sua fala, destacou que a escola é um reflexo de um quadro de violências do país. “Essas violências nascem, no meu ponto de vista, principalmente de um processo de construção de desigualdades através de um sistema de exclusão social”, analisou. Destacou que o Brasil é muito desigual sob diversos pontos de vista – de distribuição de renda, racial e cultural, por exemplo. E que a exclusão também ocorre na educação. “O sistema educacional brasileiro é, no meu modo de entender, propositalmente um sistema de exclusão. A escola reproduz o processo de exclusão da sociedade brasileira”, afirmou.
Callegari destacou a importância de não naturalizar a exclusão e negação de direitos, além de estimular o inconformismo, tanto de alunos quanto de educadores. Para o especialista, também é fundamental olhar para a formação docente e para o que ele chamou de “apagão do magistério” – isso porque, para resolver problemas de alta complexidade, é preciso formação adequada.