A trajetória do jornal Joca, que completa 10 anos em novembro, e o desafio da revista Qualé, que ensaia os primeiros passos, lançada em 2020. Ambos voltados ao público infantil
Publicado em 27/01/2021
Por que ler jornais ou revistas impressas é tão importante na formação das crianças? Segundo a educadora Cláudia Lima Gabionetta, elas já nascem no mundo digital. “É necessário algo concreto. O impresso pode rabiscar, ver de novo. O processo pedagógico precisa de crítica social. Então, nada melhor do que usar a notícia para criar uma visão crítica, quando se analisa o que foi noticiado.” Gabionetta, com experiência de 24 anos no Colégio Vera Cruz, de São Paulo, agora atua com notícias para as crianças. Hoje é consultora da revista Qualé, que circula em dezenas de escolas.
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A psicóloga e socióloga Mônica S. Gouvêa, diretora educacional do jornal Joca, concorda inteiramente e diz que a divisão das notícias agrupadas em seções passa o sentido de organização. “A criança descobre seções preferidas, entende a função do jornal, ajuda a formar o hábito da leitura e da leitura de jornal. Dos seis aos 16 anos o concreto é necessário e o jornal possibilita um maior envolvimento com o portador.” Segundo Mônica Gouvêa, que atua na área da educação há 28 anos, o projeto pedagógico precisa ser crítico e social. “Ouvir a opinião de cada um é importante para formar a própria narrativa.”
Em comum, Joca e Qualé têm o fato de não se considerarem uma proposta pedagógica, mas cada matéria pode ser explorada pelos professores de áreas diversas. Ambos precisam de uma receita de circulação, e o Joca, depois de se consolidar em escolas privadas, busca agora a área pública, onde sua presença ainda é pequena. Qualé vai seguir o mesmo caminho.
Numa família com pai e mãe jornalistas é normal que os filhos fiquem mais ligados àquilo que se fala a todo momento em casa: notícias. Fabrícia Peixoto, mãe de duas crianças, de seis e 10 anos, aos poucos foi percebendo que elas apareciam com informações truncadas. “Mãe, o Neymar vai ser preso”, e muitas outras.
Entendendo que se isso acontecia em sua casa, achava que todas as famílias sofriam essa história de notícias distorcidas. Não demorou para nascer a ideia de uma revista para crianças.
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Qualé foi lançada em janeiro de 2020, depois de Peixoto ter procurado a amiga e também jornalista Maria Clara Cabral, que por sua vez trouxe outra amiga, a designer Cinthia Behr, que fez toda a programação visual, inclusive o belo site. Essas conversas duraram quatro meses, mas talvez devessem ter durado um ano e quatro meses, assim teriam pulado o ano da pandemia. Lançada em janeiro, em fevereiro “parecia que tinham tirado nosso chão”, diz Fabrícia Peixoto.
Fazer uma revista impressa é um desafio, que o diga esta Educação com seus 24 anos. No mundo, as revistas continuam impressas e com versões digitais, tendo sofrido uma transformação em publicidade, mas tem um público que financia a operação com assinatura.
O desafio da Qualé é aguentar esse 2021 com ensino híbrido, na melhor das hipóteses, e se o MEC não atrapalhar. Peixoto e suas sócias fizeram muitas pesquisas para saber o que há no mundo nesse gênero. É pouco, mas tem. Elas se basearam na revista Time for Kids, da organização Time nos Estados Unidos.
Fabrícia Peixoto acha que essa fase será um teste. Estão usando o site e a plataforma de livros e revistas Árvore de Livros. O conteúdo é bem cuidado pelas jornalistas sócias que se valem na reunião de pauta da colaboração da consultora pedagógica Cláudia Gabionetta, em temas mais delicados. A revista terá 19 edições no ano com o custo do exemplar de R$ 9,90. Já a assinatura digital terá um preço diferenciado.
A alemã Stéphanie Habrich tem uma obsessão: colocar o jornal infantil Joca, no qual é diretora executiva, na mão de toda criança. Antes de completar 10 anos, já chegou a 30 mil exemplares, toda quinzena. “A maioria das pessoas não entende que criança tem que ler jornal. Uma pessoa bem informada muda o mundo, e para isso acontecer tem que começar desde cedo”, diz.
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Num jornal de 12 páginas e um encarte de quatro páginas em inglês, Habrich já sensibilizou 300 escolas, número invejável. Segundo ela, na França existem mais de 300 publicações periódicas para crianças.
Stéphanie Habrich nasceu na Alemanha e com seis anos veio ao Brasil. Cursou administração na Fundação Getulio Vargas – FGV e morou ainda, por dez anos, em Nova York, onde fez mestrado em relações internacionais na Columbia University.
Cerca de 80% dos leitores do Joca são alunos cujos pais recebem na lista de compra o jornal. Os demais, segundo ela, são “pais inteligentes, que assinam para seus filhos, independentemente de a escola indicar ou não”. A missão de Stéphanie Habrich é buscar as escolas públicas, onde já tem secretarias de educação como clientes. “Não dá para pensar o Brasil se a escola pública não estiver contemplada”, defende.
No prefácio do livro Uma jornada com propósito, lançado em dezembro, e que conta a história e o dia a dia do Joca, o jornalista Sérgio Dávila, diretor de redação do jornal Folha de S.Paulo, diz que três aspectos o atraíram: “o didatismo; o fato de ser um produto impresso, como são os cadernos, os livros, os diários com que as crianças convivem na escola, o que torna o consumo do Joca natural para elas; e a falta de viés do noticiário apresentado para os pequenos leitores”.
Para saber mais acesse www.jornaljoca.com.br e www.revista.quale.com.br.
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