Em entrevista à Nova Escola, uma das maiores referências de educação do país expõe seu ponto de vista sob as afirmações do novo secretário de Alfabetização, que fala em “acabar com propostas construtivistas e focar em fonemas”
Publicado em 16/01/2019
Magda Soares tem 86 anos e é professora desde a adolescência. É uma das maiores educadoras brasileiras devido, principalmente, à sua atuação com alfabetização. Entre os reconhecimentos de seus trabalhos está o prêmio Jabuti em duas categorias em 2017, com seu livro Alfabetização: a questão dos métodos, premiado como melhor obra de não ficção e de Educação e Pedagogia. A professora não costuma discutir governo, mas abriu uma exceção para falar sobre o Ministério da Educação sob Jair Messias Bolsonaro.
Na entrevista para a Nova Escola, ela fala: “estou pelejando há décadas. Já passei por várias fases, mas nunca nesse tempo todo – e olha que eu, como aluna, vivi o Estado Novo e passei, já como professora, pela ditadura – e nunca vi um período tão assustador como esse de agora na educação.”
Segundo Magda, o novo ministro da Educação, Ricardo Vélez Rodriguez, é inexperiente para o cargo e ainda nomeou um secretário de Alfabetização, Carlos Nadalim, com pouca experiência na área.
Nadalim é coordenador pedagógico da escola Mundo do Balão Mágico, em Londrina, Paraná, que possui cerca de 50 crianças na pré-escola e 94 estudantes do 1º ao 5º ano.
O secretário afirma que vai acabar com a “ideologia” na alfabetização e com a prioridade de métodos construtivistas. Para Nadalim o foco no letramento deve ser o “método fônico”. As propostas e atividades de Magda na educação também foram criticadas pelo novo secretário.
“Eu estou muito assustada com o que pode vir pela frente. O secretário diz que discorda de mim. Mas uma coisa é discordar a partir de uma pequena experiência em uma escola privada de família com meia dúzia de alunos. Outra coisa é discordar quando você está em um processo de aprendizagem da língua escrita como eu estou, desenvolvendo há 11 anos em uma rede pública inteira. Não é só em uma escolinha, não. São 25 escolas, todas desenvolvendo alfabetização com um sucesso significativo. Eu tenho as crianças alfabetizadas, frequentemente, no fim da educação infantil. E, certamente, no 1º ou no máximo no 2º ano do ensino fundamental. Tem um momento em que elas aprendem a relação fonema-grafema [método fônico], mas vão muito além disso.”
Sobre Nadalim ser a favor do “método fônico” e contrário ao construtivista, Magda é clara: “Outra coisa que tem que ser combatida é a oposição entre método fônico e construtivismo. Essa é uma oposição impossível porque não são coisas que se opõem. Construtivismo é uma teoria que vem lá de Piaget, não é invenção da Emília Ferreiro [psicolinguista que desenvolveu os mecanismos do letramento], é uma teoria em que a criança constrói o conhecimento e a interação com esse objeto de conhecimento…O que Emília Ferreiro fez foi usar essa teoria para a língua escrita, o que Piaget não tinha feito. Emília Ferreiro mostrou que a criança vai descobrindo o que é a língua escrita e esse descobrir é construir o conhecimento. Olhando do ponto de vista pedagógico, não é deixar a criança solta para construir conhecimento. O papel do educador é orientar a criança na construção desse conhecimento, como acontece na Matemática, nas Ciências ou como deveria acontecer em qualquer outra matéria. Dizer que construtivismo é uma oposição ao método fônico é um erro lógico que o ministro da Educação, que se diz filósofo, comete”.
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