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Arte e Cultura

Crime e castigo

  Cenas do documentário Sem pena: a realidade do sistema penal brasileiro   A alguns meses de disputar lugares nos pódios dos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro, o Brasil já ostenta uma medalha de bronze em um duvidoso ranking: temos a terceira maior população […]

Publicado em 02/12/2015

por Sérgio Rizzo

Crime e castigo

 

Divulgação
Cenas do documentário Sem pena: a realidade do sistema penal brasileiro

 
A alguns meses de disputar lugares nos pódios dos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro, o Brasil já ostenta uma medalha de bronze em um duvidoso ranking: temos a terceira maior população carcerária do mundo, atrás somente da China e dos EUA. Não é motivo para orgulho, e sim para a chamada “indignação cidadã”. Construímos presídios para dar conta dessa demanda, enquanto escolas são fechadas. O documentário Sem pena (2014, 87 min) faz uma investigação perturbadora desse universo, que tende a deixar estupefato quem não é advogado, promotor, juiz, policial ou parte interessada em processos criminais, e, portanto, não teve a oportunidade de conviver com o cotidiano do sistema penal brasileiro.
Coproduzido pelo Instituto de Defesa do Direito de Defesa, o filme teve origem em alguns anos de pesquisa e no recolhimento de dezenas de depoimentos em torno de aspectos-chave do problema: as circunstâncias que levam a prisões (muitas vezes, de inocentes), o pesadelo kafkiano vivido por réus, a incapacidade de o sistema judiciário dedicar a todos os casos a mesma e necessária atenção, a transformação de presídios em depósitos de condenados que forçam a convivência entre alguém que roubou um pacote de bolacha do supermercado e um assassino condenado por várias mortes, e o reconhecimento, por especialistas, de que toda essa engrenagem apresenta falhas brutais.
O diretor, coprodutor e montador Eugenio Puppo selecionou personagens que representam uma varredura de 360 graus no funcionamento do sistema penal, com o uso de um procedimento de linguagem que, inicialmente, pode provocar estranhamento no espectador: ouvimos apenas as vozes dos entrevistados, cujos rostos e funções só conhecemos no final.  À medida que o filme avança, nos habituamos a esse modo narrativo, que, entre outras coisas, aumenta o peso da imersão nessa realidade sufocante. Sem pena oferece também uma reflexão sobre a própria ideia de “castigo”, adotada por diversas sociedades a partir de ecos religiosos que pressupõem, na cadeia, a expiação da culpa e a posterior redenção.
IDDD
Fundado em 2000, o Instituto de Defesa do Direito de Defesa é uma organização da sociedade civil de interesse público. Sua missão é fomentar “a ideia de que todos têm direito a uma defesa de qualidade, à observância do princípio da presunção da inocência, a um processo justo e a cumprir a pena de forma digna”, independentemente “da classe social, de ser culpado ou inocente, ou do crime pelo qual está sendo acusado”.
Filmografia
Formado em artes cênicas, Eugenio Puppo trabalhou em teatro antes de desenvolver projetos variados em cinema, como curador de mostras e retrospectivas (a mais recente, dedicada à obra do diretor francês Jean-Luc Godard), restaurador de cópias, roteirista de ficção (Não por acaso) e realizador de documentários, como São Miguel do Gostoso (2011) e Ozualdo Candeias e o cinema (2013).
Cabeças-falantes
Graças a documentários convencionais e ao telejornalismo, muitos espectadores se habituaram ao formato das “cabeças-falantes”, em que vemos na maior parte do tempo os entrevistados, em geral sentados diante da câmera. Esse, no entanto, é apenas um modelo de documentário (e o mais conservador). Filmes preocupados em explorar os recursos de linguagem à disposição tendem a fugir desse procedimento.



FILMOTECA

Imagens do cárcere
O cotidiano em presídios, um dos temas do documentário brasileiro Sem pena, já foi tratado em inúmeros outros longas-metragens de ficção e em documentários. Confira alguns exemplos:
Laranja mecânica (1971)
A distopia escrita por Anthony Burgess, ambientada em uma Inglaterra futurista e sombria, foi transformada pelo diretor e roteirista Stanley Kubrick em um dos filmes mais polêmicos do século 20. Um jovem infrator que lidera uma gangue (Malcolm McDowell) é submetido na prisão a um tratamento terapêutico que pretende reabilitá-lo para o convívio social.
Um sonho de liberdade (1994)
Filme mais bem avaliado em toda a história do cinema pelos usuários do site norte-americano IMDB, inspira-se em um conto de Stephen King (Rita Hayworth e a redenção de Shawshank) para narrar a história engrandecedora da amizade entre dois detentos (Tim Robbins e Morgan Freeman) que buscam uma forma moralmente correta de viver na prisão.
Carandiru (2003)
O best-seller Estação Carandiru, do médico Dráuzio Varella, deu origem a um dos filmes brasileiros de maior público nos anos 2000. Luiz Carlos Vasconcelos interpreta o médico que convive durante mais de 10 anos com os presidiários, alguns dos quais seriam mortos no massacre de 1992. Dirigido por Hector Babenco (Lúcio Flávio, Pixote)
O profeta (2009)
Vencedor da Palma de Ouro de melhor filme no Festival de Cannes de 2015 por Dheepan – O Refúgio, o diretor francês Jacques Audiard (que fez também De tanto bater meu coração parou e Ferrugem e osso) narra aqui, com base em episódios verídicos, a ida de um jovem árabe para a prisão, uma “escola do crime” que o torna um gângster.
César deve morrer (2012)
Os diretores italianos Paolo e Vittorio Taviani (Pai patrão, A noite de São Lourenço, Bom dia, Babilônia) combinam ficção e documentário ao acompanhar um projeto desenvolvido na prisão de segurança máxima Rebibbia, em Roma: a encenação, por um grupo teatral formado exclusivamente por detentos, da peça Júlio César, de Shakespeare.

Autor

Sérgio Rizzo


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