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Novos passos de um gigante

Enquanto o Cade não aprova o maior grupo educacional do mundo, fruto da fusão entre Anhanguera e Kroton Educacional, a Rede Pitágoras prevê 10% de crescimento no número de alunos na Educação Básica e não descarta novas aquisições

Publicado em 02/08/2013

por Udo Simons

Nada mudou na área de Educação Básica após o anúncio da fusão entre a Anhanguera Educacional Participações S.A. e a Kroton Educacional S.A.”, diz a diretora da área, Mônica Ferreira. Juntas, as duas empresas formarão o maior grupo de ensino do mundo, com 123 campi de ensino presencial, 647 polos de ensino a distância e 810 escolas associadas na Educação Básica. “A Educação Básica tem vida própria. Se mantém de forma diferenciada,” garante Mônica.

A fusão, anunciada em 22 de abril de 2013, une a Anhanguera, reconhecida pela sua abrangência no ensino superior, à Kronton, marca criada em 2007 para a entrada do grupo na bolsa de valores. O braço de Educação Básica da Kroton Educacional é mais conhecido pela Rede Pitágoras.
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O movimento é pouco usual no mercado educacional brasileiro, acostumado às fusões e aquisições no ensino superior. Por isso, os três meses sem informações a respeito dos rumos do novo grupo têm gerado expectativas.

O “silêncio” é justificado por dois motivos. Oficialmente, nenhum representante dos dois grupos pode falar sobre os próximos passos da nova instituição enquanto a fusão não for aprovada pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), autarquia federal vinculada ao Ministério da Justiça, que preserva e fomenta a livre concorrência no Brasil. Os conselheiros do Cade têm 330 dias (desde 1º de junho de 2013) para emitir parecer final sobre a fusão. O segundo motivo é o tempo ainda incipiente do negócio. Segundo Mônica, quando a Kroton Educacional comprou a Unopar, instituição especializada no ensino superior a distância, as conversas conjuntas só começaram a ocorrer após seis meses de efetivação do negócio.

Oficialmente, o processo de negociação da união da Kroton com a Anhanguera aconteceu em três dias, durante o mês de março. Contudo, as conversas para chegar a esse resultado datam de mais longe, com sondagens mais diretas no segundo semestre do ano passado.

“Eu mesma fui pega de surpresa ao ser informada da fusão”, revela Mônica. Rodrigo Galindo, CEO da Kroton, ligou para ela assim que o “martelo” foi batido entre a direção das instituições. “Estava num supermercado, em Belo Horizonte, num domingo pela manhã, e [literalmente] gritei [ao receber a ligação de Galindo]”, relembra Mônica. A partir desse contato, ela fez um comunicado destinado às escolas parceiras da Rede Pitágoras e a alguns de seus funcionários, falando sobre as notícias que se tornariam públicas no dia seguinte. “Estou superfeliz com o tamanho da nossa empresa, mas ainda não pensamos como estruturar essa nova configuração”, diz.

Aquisições
Apesar de firmemente manter a posição de que nada se altera na Educação Básica, Mônica não nega a possibilidade de aquisições. “Uma aquisição é possível, sim. Mas, neste momento, a expansão e investimentos não estão definidos. Há conversas, mas não definição”, reforça. E insiste na necessidade de aguardar pelo parecer do Cade. “O foco, agora, é a espera dessa decisão.” Mas Mônica tem muito claro quais são as regiões de interesse de crescimento da Rede Pitágoras. “O Centro-Oeste é a mais visada”, diz. E lembra, ainda, que o Nordeste é uma região de importância e que ainda há muito espaço para expansão no Sudeste. “Dentre todas as regiões brasileiras, o Sul é a mais difícil para o avanço dos sistemas de ensino, de forma geral. Principalmente, o Rio Grande do Sul. O motivo para isso é a tradição educacional da região.”

A magnitude dos números criados com a junção da Kroton e Anhaguera distribui-se por todos os segmentos do ensino em que atuam. Na Educação Básica o grupo atende hoje 287 mil alunos em 804 escolas parceiras pelo país e está presente em seis escolas no Japão e uma no Canadá. O grupo prevê um crescimento anual de 10% no número de alunos, chegando a 315 mil matrículas em 2014.

Na atual configuração do negócio, a Educação básica representa 10% de participação no grupo Kroton. Com a nova empresa essa porcentagem cairá para 4%. Esse decréscimo, contudo, é só uma forma fria de analisar as estatísticas. Na prática, os 4% de participação serão superiores à atual porcentagem, dado o crescimento de todos os números depois da fusão. A receita líquida do segmento era de R$ 148 milhões em dezembro de 2012.

Negócio robusto
De acordo com levantamentos do professor de Ciência Política da Unicamp Reginaldo Moraes, publicados pela Fundação Perseu Abramo, a Educação Básica é um robusto negócio no Brasil. “Estima-se que a educação infantil, fundamental e o ensino médio tenham movimentado cerca de R$ 33,9 bilhões em 2012”, escreve o pesquisador. As projeções para este ano são de crescimento superior a 15%. Reginaldo destaca em sua análise a expansão das matrículas no ensino básico particular, em detrimento do setor público, e indica que o setor parece “evoluir” para modelos oscilantes entre o oligopólio verticalizado ou a cadeia produtiva.

Ele denomina ainda de “indústria da educação” as fusões e aquisições que acontecem no setor. E destaca a fusão Kroton-Anhanguera como “estrela bilionária” desse movimento. “O sistema Kroton foi engolindo escolas que eram ‘marcas’ fortes em várias regiões, como a Unic (Mato Grosso), Unopar (Paraná) e Uniasselvi (Santa Catarina)” (veja box).

Repercussão
Entre os principais atores que atuam hoje na educação básica, entretanto, há dificuldade em analisar movimentos de mercado dessa magnitude, especialmente pelo seu ineditismo. O presidente da Federação dos Professores do Estado de São Paulo (Fepesp), Celso Napolitano, admite que a área educacional está acostumada a avaliar movimentos de grandes compras apenas no ensino superior. Mas, em termos gerais, avalia haver uma tendência de fusão de grupos. “Quanto mais escala, melhor”, diz. “No livro didático empresas estrangeiras também se instalaram por aqui. Quanto maior a incorporação, mais escala, menos custo, mais ganho. As fusões e as incorporações não serão diferentes no negócio educação. A questão é discutirmos se a educação vai virar negócio”, pontua.

Entre grupos educacionais confessionais, o sentimento é de resignação. “Apesar de os sistemas educacionais já estarem ‘consolidando’ o conteúdo das escolas, a gestão ainda é pulverizada. Assim, há espaço para um movimento de consolidação”, avalia o superintendente-executivo da área educacional do Grupo Marista, Paulo Serino. Já o diretor-executivo da Rede Salesiana de Escolas, padre Nivaldo Luiz Pessinatti, destaca a formação dos docentes quando pensa na chegada ou ampliação de sistemas de ensino. “Passaremos a ter um padrão nessa formação e todo padrão tem seus riscos”, diz. E complementa. “A formação diversificada dos docentes oferece também formas diversificadas para que o aprendizado aconteça na escola, o que pode ser dificultado no futuro”.

Com informações de Cleide Floresta

Expansão se fortalece nos anos 2000

A Rede Pitágoras nasceu em Belo Horizonte na década de 1960 como curso voltado para o pré-vestibular. Nas quatro décadas seguintes, o crescimento do grupo foi consistente, consolidando sua presença no território nacional. Contudo, o marco de sua expansão é nos anos 2000. Em 2007 foi criada a marca Kroton Educacional S.A para a entrada na BM&F Bovespa. Em 2009, um dos maiores planos de private equity do mundo, a Advent International, fez o principal aporte financeiro para a expansão do grupo. A partir de então, os negócios deslancharam, principalmente no ensino superior. Em 2010 foi adquirido o Grupo Iuni Educacional, detentor das instituições de ensino superior Unic, Unime e Fama. Em 2011 foram incorporadas as Faculdades Atenas Maranhense, União, Sorriso e Unopar. Em 2012 foi a vez do Centro Universitário Cândido Rondon e do Grupo Uniasselvi. Por fim, veio a fusão com a Anhanguera Educacional, em 2013. 

Decisões do Cade

O Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) foi criado para proteção de abusos do poder econômico e formação de monopólios. Em seus 51 anos de atuação, algumas de suas decisões vetaram fusões entre grandes empresas ou demoraram a ser divulgadas:

1995: veto à aquisição da siderúrgica Pains pela Gerdau;
1999: suspensão da compra da Antarctica pela Brahma;.
2002: veto à compra da fabricante brasileira Garoto pela multinacional Nestlé;
2005: condenação por formação de cartel de 18 empresas do setor demineração e britas a pagamento entre 15% e 20% de seus faturamentos;
2009:multa aplicada à AmBev em R$ 352 milhões, por exigência de exclusividade dos seus produtos em pontos de venda;
2010: multa de R$ 1,7 bilhão à White Martins e outras quatro empresas por formação de cartel no setor de oxigênio hospitalar;
2011: a fusão entre a Sadia e a Perdigão, anunciada em 2009, só foi aprovada, com restrições, em 2011.

Autor

Udo Simons


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