NOTÍCIA
Abordar mudanças climáticas nas escolas requer compromisso em áreas como formação docente, currículo e materiais didáticos
Por Joana Amaral e Priscila Pacheco*, do Observatório do Clima | Reconhecer que as mudanças climáticas se impõem hoje como uma das maiores crises já enfrentadas pela humanidade exige esforços coletivos para lidar com problemas complexos e interligados. Diante disso, a educação é, inegavelmente, um campo fundamental para preparar as pessoas para enfrentarem essa realidade e cobrarem soluções.
A integração da agenda do clima ao universo escolar no Brasil esbarra em obstáculos históricos e estruturais da própria política educacional. A elaboração de uma política de Estado que considere os desafios das mudanças climáticas requer ações robustas e estruturantes em quatro frentes principais da educação: a própria agenda da política, a formação docente, o currículo e os materiais didáticos.
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Mudanças climáticas: agir na comunidade, entrando pela escola
Educação ambiental deve ser prática e transversal
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Um dos primeiros passos é reconhecer a baixa priorização da agenda climática nas políticas educacionais. Há falta de articulação e de apoio entre os níveis federal, estadual e municipal, e a consequência é que o ensino sobre mudanças climáticas ainda continua dependente da vontade e do esforço individual de professores, gestores escolares ou de iniciativas pontuais e esporádicas.
No âmbito curricular, o conteúdo sobre meio ambiente e clima permanece fragmentado. A ausência de uma visão integrada e progressiva sobre essa temática dificulta o desenvolvimento do pensamento crítico e da responsabilidade social dos estudantes ao longo da trajetória escolar — aspectos essenciais para o exercício da cidadania.

Discussão sobre clima não pode ficar circunscrita à realização da COP30 no Brasil — ela também tem de fazer parte da educação (Foto: Shutterstock)
Para mudar esse cenário, é preciso haver um consenso técnico sobre a necessidade de garantir a inserção da pauta na Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e no Plano Nacional de Educação (PNE), transformando a temática em uma diretriz transversal e não em um apêndice temático.
A valorização e a formação docente também são gargalos para o avanço da educação climática. Professores têm buscado letramento para se apropriarem do assunto e ensiná-lo em sala, mas esbarram na sobrecarga de trabalho, na falta de tempo e de infraestrutura e na desvalorização da carreira — que inclui a qualidade da formação continuada em serviço.
Iniciativas como a política de educação ambiental e climática obrigatória no Pará (que instituiu um componente curricular de uma hora por semana) ou o curso de Justiça Climática e Resiliência Escolar da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) revelam caminhos promissores quando há apoio institucional. Contudo, persiste a dificuldade de ampliar o alcance para docentes que atuam fora do campo ambiental, limitando o impacto sistêmico das iniciativas.
Ao mesmo tempo, é importante reconhecer que o Brasil tem avançado minimamente no debate. Exemplo disso é a incorporação da dimensão da justiça climática, vista como um elemento central e inseparável da crise. O contexto enfrentado por estudantes e profissionais da educação em escolas periféricas, por exemplo, imprime a urgência de trazer essa discussão para o cotidiano da escola pública.
Se a comunidade escolar sofre com calor extremo, enchentes e acúmulo de lixo, problemas comuns em ocupações, por exemplo, essa pauta não é uma abstração. Ela diz sobre a vida, o território e o futuro das pessoas.
Neste ano, o Observatório do Clima (OC) e a plataforma Eunice, criada pela instituição, destacaram-se como referências na tradução do conhecimento científico para o campo da educação. Além disso, a Estação Central da COP, outra iniciativa do OC, ofereceu um kit gratuito com materiais formativos elaborados por especialistas em mudanças climáticas. O objetivo dessas ações foi apoiar a aprendizagem sobre questões socioambientais como efeito estufa, justiça climática e racismo ambiental. Mas é preciso fazer muito mais.
A discussão sobre clima não pode ficar circunscrita à realização da COP30 no Brasil. Ela também tem de fazer parte da educação. O momento atual nos convoca, portanto, a somar esforços para fortalecer redes de ensino, apoiar professores e implementar políticas públicas, ações essenciais para transformar a consciência individual em ação sistêmica e perene.
Para isso, o investimento na educação deve ser não só ampliado, mas direcionado para garantir que o tema do clima, em suas dimensões de justiça e equidade, alcance de forma efetiva os mais de 47 milhões de matriculados na educação básica do país. A máxima que emerge é clara: “não existe justiça climática sem educação de base”.
*Joana Amaral é coordenadora de engajamento e mobilização do Observatório do Clima, e Priscila Pacheco, repórter do Observatório do Clima.
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