NOTÍCIA

Políticas Públicas

Autor

Fernando Leal

Publicado em 12/08/2025

Novo Plano Nacional de Educação entre metas urgentes e estratégicas

Projeto do novo PNE em tramitação na Câmara dos Deputados traz avanços importantes. Financiamento, mecanismos de monitoramento e controle e responsabilização de gestores são temas que ainda geram dúvidas e debates

Governo, parlamentares e organizações da sociedade civil estão mobilizados na tarefa de aprovar um novo Plano Nacional de Educação (PNE) que seja um indutor relevante de melhorias para os próximos 10 anos, na direção de um ensino que garanta o aprendizado de forma cada vez mais equânime.

Por isso mesmo, vários atores envolvidos destacam a importância de fazer do processo de discussão uma oportunidade para a construção de um pacto que leve, efetivamente, à garantia dos direitos de crianças e jovens brasileiros. “O PNE deve ser mais do que uma lei norteadora dos objetivos e metas para a educação brasileira em todos os níveis”, afirma o presidente do Conselho Nacional de Educação (CNE), Cesar Callegari. “O PNE tem que olhar para nossos déficits do passado, para um presente desafiador e para um futuro que já se projeta com mudanças em ritmo exponencial, sejam econômicas, sociais e tecnológicas, ou mesmo climáticas e geopolíticas.”

novo PNE

“PNE tem que olhar para nossos déficits do passado, para um presente desafiador e para um futuro que já se projeta com mudanças em ritmo exponencial”, diz Cesar Callegari, do CNE (Foto: Marcos Oliveira/Agência Senado)

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Em junho de 2024, o Ministério da Educação (MEC) encaminhou ao Congresso Nacional o Projeto de Lei nº 2.614/2024, com a proposta do novo Plano Nacional de Educação, que, de acordo com o MEC, contou com a participação de representantes da sociedade civil e de diferentes esferas de governo. O PNE anterior teria validade até ano passado, mas foi prorrogado até dezembro de 2025.

A partir daí, a Câmara dos Deputados instalou uma Comissão Especial para analisar o projeto, inclusive, por meio de audiências públicas e seminários estaduais, reunindo especialistas, representantes de instituições de ensino e outros setores organizados. Este trabalho está em andamento, com expectativa de conclusão até o final de agosto. No CNE, por sua vez, foi criada uma Comissão Bicameral, com o propósito de contribuir com propostas para a educação básica e para o ensino superior, e suas diferentes etapas e modalidades.

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Governo, parlamentares e organizações da sociedade civil estão mobilizados na tarefa de aprovar um novo PNE (Foto: Shutterstock)

Lições aprendidas

A deputada Tabata Amaral (PSB), presidenta da Comissão Especial da Câmara, acredita que o novo PNE deve ser um “instrumento estratégico e transformador”. “Ele precisa orientar o país com metas claras e factíveis, com foco em qualidade, acesso e permanência. Mais do que um plano, queremos construir um verdadeiro pacto nacional pela educação”, afirma. “O que temos visto é um grande esforço coletivo, e isso me dá esperança na construção de um plano de qualidade, justo, viável e transformador para a educação brasileira no prazo mais breve possível.”

De forma semelhante, organizações da sociedade civil com participação ativa nas discussões, como o Todos Pela Educação e a Campanha Nacional pelo Direito à Educação, também têm reafirmado as expectativas positivas em relação ao novo PNE. Ao mesmo tempo, porém, alertam para a necessidade primordial de mecanismos de monitoramento, avaliação e controle, no que diz respeito à execução do plano e ao cumprimento das metas.

O alerta tem uma razão bastante clara e objetiva. Balanço do ciclo 2014-2024 do PNE, conduzido pelo Inep com base em dados oficiais, mostra que dos 53 indicadores monitorados, apenas quatro alcançaram ou superaram a meta; 15 atingiram ao menos 90% do previsto; outros 14 ficaram entre 50% e 80%; e 9 sequer chegaram a 50%.

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A constatação não diminui a importância do PNE como impulsionador de políticas e resultados educacionais. “Não foi pouca coisa o que avançamos nos últimos 10 anos, graças, por exemplo, a políticas públicas estáveis de financiamento educacional, como o Fundeb”, lembra Callegari. No entanto, o legado dos ciclos anteriores do PNE faz com que aumentem a preocupação em assegurar um fluxo de informações que possibilite um diagnóstico de desvios e a adoção de medidas de correção no tempo adequado.

“As metas só serão cumpridas se vierem acompanhadas de mecanismos eficazes de monitoramento e avaliação. Estados e municípios precisam ter compromissos claros e estarem engajados no cumprimento das metas. A criação de ferramentas que auxiliem os entes no monitoramento das metas e o compromisso dos gestores pelos processos e escolhas são essenciais para garantir seriedade na implementação do PNE que estamos construindo”, destaca Tabata.

Novo PNE

Para funcionar de verdade

Entre as propostas em análise pela Comissão Especial da Câmara, algumas buscam fortalecer a governança do PNE. “Esse é um aspecto fundamental para a efetividade do novo ciclo”, afirma Talita Nascimento, diretora de Relações Governamentais do Todos Pela Educação. “Para isso, precisamos reforçar o regime de colaboração entre União, estados e municípios, com definição do papel de cada esfera”, explica. Sugestões da entidade incluem a criação de fóruns tripartites e a ampliação do acompanhamento dos resultados educacionais pelos legislativos.

“Precisamos reforçar o regime de colaboração entre União, estados e municípios”, afirma Talita Nascimento, do Todos Pela Educação (Foto: divulgação)

Nesse mesmo sentido, o projeto do PNE prevê a instituição de um Sistema Nacional de Educação (SNE) no prazo de dois anos. Além de impulsionar a lógica da colaboração entre as instâncias de gestão, a medida terá impacto positivo para a coordenação de ações necessárias ao cumprimento das metas. Isso fica ainda mais evidente, ressalta Talita, diante do fato de que estados e municípios também deverão aprovar seu plano de educação, numa etapa posterior à entrada em vigor do PNE.

Por sua vez, a Campanha Nacional pelo Direito à Educação chama a atenção para a necessidade de articular a política educacional a outras dimensões na vida do país, por meio de “planos de desenvolvimento econômico e social que viabilizem a realização dos objetivos, metas e estratégias”.

“Também seguimos com desafios relevantes no que diz respeito ao aprofundamento da gestão democrática das escolas e da garantia do padrão mínimo de qualidade, com base no Custo Aluno Qualidade (CAQ) e da fragilização do conceito de direito à educação”, ressalta Sumika Freitas, educadora e integrante do Comitê Diretivo da Campanha. Além disso, para a efetivação do PNE, a entidade avalia que devem constar no texto final metas intermediárias, de curto e médio prazos.

O Comitê Diretivo da Campanha, o qual Sumika Freitas integra, avalia que devem constar no texto final metas intermediárias, de curto e médio prazos (Foto: arquivo pessoal)

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A garantia de recursos é outro elemento central apontado pelos especialistas para o sucesso do ciclo do PNE que está prestes a se iniciar. A previsão da proposta em tramitação é de ampliação do investimento público em educação, de modo a chegar ao patamar de 7% do Produto Interno Bruto, num primeiro momento, e de 10% ao final dos 10 anos. Para quem argumenta que o índice é irrealista, diante do cenário fiscal do país, a deputada Tabata responde: “Investir em educação é investir no futuro do país. O aumento deve ser feito de forma gradual e planejada, com responsabilidade fiscal, mas também com coragem para revisar privilégios e redirecionar recursos”.

Para além dos mecanismos e instrumentos de monitoramento e controle, Cesar Callegari, do CNE, aponta um fator crítico no enfrentamento dos desafios educacionais: os professores e os profissionais da educação de forma geral. “Em todos os lugares e épocas, a educação avança quando avançam as condições de formação, e como os professores exercem o seu magistério, na educação básica e no ensino superior”, garante. Para ele, o PNE deve propor formar uma nova geração de professores, com currículo inovador, formação em tempo integral, bolsas de permanência, referenciais nacionais de carreira, e uma remuneração capaz de atrair os melhores talentos para a profissão docente.

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Tabata Amaral: As metas só serão cumpridas se vierem acompanhadas de mecanismos eficazes de monitoramento e avaliação. Na imagem, deputada com crianças em Salto, SP (Foto: divulgação/Tabata Amaral)

Combate às desigualdades deve se concretizar nas práticas do dia a dia

O novo PNE inova ao englobar quatro metas específicas voltadas à redução das desigualdades, sejam elas sociais, por raça, sexo, nível socioeconômico e região. O combate às desigualdades está presente nas metas de acesso à educação infantil, de alfabetização e de aprendizagem no ensino fundamental e no ensino médio.

Trata-se de um avanço do plano em discussão para a direção de uma maior equidade. “Acima de tudo, é uma resposta”, afirma Iraneide Soares da Silva, professora de história na Universidade Estadual do Piauí (UESPI) e secretária-executiva da Associação Brasileira de Pesquisadores Negros. “Há uma demanda reprimida de grupos que, historicamente, têm sido alijados do processo educacional. Não tem como retornarmos a uma educação que deixe de contemplar as histórias e culturas afro-brasileira e indígena, e que não perceba o sujeito do campo e da cidade.”

Na visão da professora, para que essas conquistas se materializem, na prática, é preciso, primeiro, garantir os recursos necessários, vencendo as resistências ao aumento do investimento público em educação. E, ao mesmo tempo, trata-se de superar obstáculos cotidianos. “Temos um arcabouço normativo bastante importante, mas não podem perder de vista que o racismo estrutura nossas instituições e a sociedade. Por exemplo, por meio da universidade que forma os profissionais que atuam na educação básica”, explica.

Iraneide conta que tem mantido um diálogo regular sobre o tema com a Frente Parlamentar Negra e reconhece a importância da atualização do PNE, diante das mudanças nas dinâmicas da sociedade. Por isso, ela enxerga as discussões como um momento crucial de discussão rumo aos progressos que ainda se buscam conquistar.

Iraneide Soares, da Associação Brasileira de Pesquisadores Negros: Não podemos perder de vista que o racismo estrutura nossas instituições e a sociedade (Foto: arquivo pessoal)

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