NOTÍCIA
Com excesso de estímulos e o avanço das telas, educar a atenção se tornou um dos maiores desafios na educação infantil
Por Carin Caldeira, diretora no Colégio Logosófico em São Paulo | Vivemos uma era em que a atenção virou um recurso escasso e que afeta também as crianças. Se, entre telas, sons, notificações e fluxos constantes de informação, sustentar o foco se tornou um desafio até para os adultos, dentro dos processos formativos da infância, esse desafio é ainda maior.
E as escolas já têm sentido o impacto de uma geração que chega às salas de aula mais dispersa, impaciente e emocionalmente sobrecarregada. Um levantamento da Secretaria de Educação de São Paulo, por exemplo, revelou que um em cada três estudantes afirma ter dificuldade para se concentrar no que é proposto em aula, enquanto 18,8% dizem se sentir totalmente esgotados e sob pressão.
O dado é alarmante, mas também revelador: talvez estejamos cobrando das crianças uma atenção que não lhes ensinamos a cultivar. Educar a atenção, nesse sentido, envolve mais do que exigir concentração, significa criar condições para que o aluno aprenda a observar, reconhecer e direcionar o próprio pensamento.
E esse é um aprendizado interno, que começa cedo e que pode se refletir na geração de benefícios para o desenvolvimento humano em toda a vida.
Na educação infantil, o trabalho de sustentação da atenção das crianças pode e tende a ser mais efetivo quando acontece de forma natural e lúdica. Antes de uma atividade ou brincadeira, por exemplo, a criança pode ser convidada a fazer uma pequena pausa: respirar, perceber como está se sentindo, dar nome a essa sensação e só então iniciar a ação.
Esse gesto simples, quando repetido ao longo do tempo, ensina algo muito mais profundo do que a simples concentração, permitindo que a criança reconheça o próprio estado interno para tomar consciência de suas emoções e então escolher como agir.
Essas pausas curtas e conscientes também transformam positivamente o ritmo da sala de aula. É nesse espaço que se abre entre o sentir e o agir que nasce a autorregulação. Crianças que aprendem a se observar tendem a reagir com mais calma, a lidar melhor com frustrações e a se engajar com maior presença nas atividades. A atenção, assim, deixa de ser apenas um esforço mental e se torna uma forma de consciência.

Educar a atenção é educar para uma vida mais feliz (Foto: Shutterstock)
Na pedagogia logosófica, esse princípio ganha amplitude. O objetivo não é apenas favorecer o foco em uma tarefa, mas estimular o autoconhecimento desde cedo. Para essa abordagem, atenção é sinal de consciência — e, para cumprir esse papel, precisa ter um propósito claro. Utiliza-se a analogia de uma pequena lanterna, cuja luz deve ser direcionada para o interior, iluminando os pensamentos que surgem na mente.
A partir dessa observação, a criança identifica quais ideias conduzem a atitudes positivas e quais a impulsionam para comportamentos que não fazem bem a si ou aos outros. Assim, aprende a escolher, de forma consciente, os pensamentos que deseja levar para cada experiência. Esse é o princípio da atenção consciente.
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Essa perspectiva transforma a sala de aula em um espaço de autodescoberta. O educador, nesse sentido, assume um papel de mediador, orientando as crianças neste caminho de descobertas e a escola, assim, se torna também um laboratório de desenvolvimento integral.
Com essa perspectiva, a criança é estimulada a distinguir o que pensa do que sente, a perceber como um pensamento influencia o outro e a compreender que o domínio de si começa pela observação atenta de si mesma.
E, no cenário atual, em que a ansiedade infantil cresce de forma preocupante e o aprendizado é constantemente fragmentado, educar a observação e atenção é também um ato de cuidado. É oferecer à criança a oportunidade de construir um espaço interno de calma e discernimento em meio à agitação do mundo.
Mais do que formar alunos focados, trata-se de desenvolver indivíduos presentes e que sintam em todo momento a alegria de um ambiente interno de paz. A atenção consciente permite que a criança aprenda não apenas sobre o conteúdo das disciplinas, mas sobre si mesma; e é dessa aprendizagem que nascerá a maturidade emocional e intelectual que a sociedade e o mercado já exigem dentro dos debates sobre soft skills. Educar a atenção é, portanto, educar para uma vida mais feliz!
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