NOTÍCIA

Olhar pedagógico

Autor

Luciana Alvarez

Publicado em 03/06/2025

As 10 competências da BNCC na prática

Conheça os projetos do Colégio Master (CE); Escola Estadual Indígena João Quirino (MS); e os da Secretaria Municipal de Educação de Vargeão (SC)

As competências previstas na Base Nacional Comum Curricular (BNCC) podem ser trabalhadas no dia a dia das escolas, durante as aulas, em todas as disciplinas. Escolas e redes, dos mais variados perfis, tamanhos e por todo o território nacional, têm desenvolvido uma série de projetos que acabam potencializando o desenvolvimento das competências. Conheça algumas experiências bem-sucedidas com o potencial de inspirar outras ações formativas.

1. Conhecimento

No Colégio Master, instituição particular com unidades em Fortaleza (CE) e Natal (RN), uma das estratégias é incentivar a participação dos estudantes nas olimpíadas de conhecimento das mais variadas disciplinas: astronomia, química, matemática, robótica etc. A escola divulga, inscreve e oferece aula extra preparatória para este tipo de desafio, promovendo a construção de conhecimentos para além do que é pedido em sala de aula. 

“Eles montam as equipes, colaboram uns com os outros e estudam muito. A preparação para a olimpíada de história é no sábado de manhã e como tem estudante que vem para a escola!..”, exemplifica Elizabete Conrado Ribeiro, diretora de ensino dos anos finais do fundamental. A participação nesse tipo de evento já levou alguns estudantes ao exterior, para irem a etapas internacionais das disputas. “Eles levam muito a sério, competem e aprendem para valer”, diz a diretora.

2. Pensamento científico, crítico e criativo

Para chegar à Escola Estadual Indígena João Quirino de Carvalho – Toghopannã, em MS, é preciso fazer uma viagem de barco de cerca de oito horas partindo de Corumbá. Mas, apesar de estarem no meio do pantanal, os estudantes conseguem desenvolver projetos STEAM, envolvendo Ciência, Tecnologia, Engenharia, Artes e Matemática (Science, Technology, Engineering, Arts Mathematics). Em uma das atividades propostas, tinham de construir um foguete com base em reações químicas. Por duas vezes, o lançamento falhou. “Só tínhamos material para mais uma tentativa, mas eles investigaram o problema, perceberam que havia um vazamento e entalharam uma tampa melhor com a casca de uma árvore”, recorda Karla Karoline Servion, coordenadora de práticas inovadoras da escola. O lançamento acabou sendo um sucesso, comemorado por toda a escola.

BNCC na prática

Mesmo diante de desafios, projetos STEAM e de comunicação fazem parte da realidade da Escola Estadual Indígena João Quirino (Foto: arquivo pessoal)

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3. Repertório cultural

Uma festa com desfile de trajes típicos, pinturas corporais e exposição de artesanatos feitos pelas famílias dos estudantes: é assim que todo ano, toda comunidade da escola João Quirino se mobiliza para aumentar o contato das crianças e adolescentes com a cultura ancestral do povo Guató. “É um povo que tem muita habilidade para desenho e pintura, mas a gente sente que os mais novos começavam a se afastar dessas tradições. Queremos que eles se apropriem e valorizem a própria cultura”, explica Karla. Na escola eles confeccionam suas roupas para o desfile — no dia também fazem as pinturas corporais — mas eles também têm de fazer um painel para expor os artesanatos das famílias, contar como foram feitos. Para o dia da festa, são convidados cinco jurados da comunidade para votar nos melhores trajes. “Eu não poderia ser jurada, porque daria nota 10 para todos”, diverte-se a professora.

4. Comunicação

Este ano, os alunos do ensino médio da escola indígena vão montar uma peça de teatro para falar sobre a vida de João Quirino de Carvalho, que dá nome à escola. “Eles estão pesquisando e ao mesmo tempo já estão pensando em como fazer o cenário, os figurinos”, conta Karla.

A ideia é que a peça seja apresentada aos alunos mais novos e seja também filmada, para que a expressão artística fique como legado às próximas gerações de estudantes. Mas, por terem o guató como primeira língua, há várias iniciativas que visam promover o entendimento mútuo. Já organizaram um concurso como o do programa de TV Soletrando, só que na língua guató; foi uma oportunidade de os alunos praticarem e também ensinarem um pouco da sua língua nativa aos sete professores não indígenas da unidade. Agora, projetam fazer vídeos sobre o dia a dia local falado em guató, com legendas em português.

BNCC na prática

Na escola indígena João Quirino, a língua tradicional, guató, é incentivada. De branco, a coordenadora Karla Karoline (Foto: arquivo pessoal)

5. Cultura digital

Como na maioria as crianças do mundo hoje já nascem cercadas de dispositivos digitais, o desafio costuma ser promover que seu uso seja aproveitado de maneira crítica, significativa e ética. Não é o caso de quem estuda na escola indígena no MS. “No começo, eles tinham muita desconfiança dos computadores”, lembra Karla, que deu aulas na unidade pela primeira vez em 2018. Mas, atualmente, a escola tem internet e tablets para serem usados nas turmas, o que foi desarmando os receios iniciais. Na verdade, hoje os estudantes fazem questão de marcar sua presença online, pedindo para que as atividades sejam sempre registradas e publicadas na rede social da escola.

“É uma comunidade pequena; nos anos 80, chegaram a dar os Guatós como extintos. Talvez até por isso eles gostam da visibilidade da internet, para que todos saibam que estão aqui. No dia a dia, isso significa que se não publico alguma atividade, eles logo vêm me cobrar.”

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6. Trabalho e projeto de vida

Aproveitando o formato do Novo Ensino Médio, o Colégio Master incluiu disciplinas eletivas que articulam os projetos de vida dos estudantes e o contato com o mundo do trabalho, como é o caso da educação financeira e orientação profissional. Mas os gestores da escola também aproveitam as reflexões em sala de aula para conhecer seu corpo discente. Ao entender que a maioria pretende seguir os estudos em alguma faculdade, eles incorporaram a preparação para o Enem desde muito cedo. 

“Com as devidas adaptações, a escola faz simulados do Enem a partir do 5º ano. Assim, quando chegam ao final do ensino médio, eles já treinaram tanto tempo esse tipo de prova, que podem fazer com tranquilidade”, explica a diretora Elizabete.

7. Argumentação

Nada melhor do que eleições de representantes de turma para promover que os estudantes formulem, negociem e defendam ideias. No Master, essa atividade é chamada de Projeto Liderança e é levada a sério. “Eles formam chapas, concorrem defendendo suas ideias. Para o dia da votação, a gente traz urnas eletrônicas. Depois fazemos uma cerimônia de posse com direito a discurso e tudo”, conta a diretora. Mas, além da oralidade, a argumentação pode ser exercitada por escrito. Para isso, o colégio tem um laboratório de redação, que oferece atendimento individual. Começa com frequência mensal no 5º ano, depois passa para quinzenal e chega a semanal no ensino médio. “Temos uma equipe grande para poder atender bem a todos. Não se trata só de escrever bem, mas de argumentar com proposta de resolução de problemas”, diz Elizabete.

BNCC na prática

BNCC na prática: no Master, entre as atividades para a competência 1 da Base estão as olimpíadas de conhecimento (Foto: reprodução/Facebook Master)

8. Autoconhecimento e autocuidado

O cuidado com a saúde física e emocional foi incluído na BNCC lá em 2015, mas a partir da pandemia em 2020 essa competência tem se mostrado mais necessária do que nunca. Contudo, só com professores capazes de se conhecerem e se cuidarem é possível desenvolver nos estudantes esse tipo de habilidade. Partindo dessa premissa, a Secretaria Municipal de Educação de Vargeão (SC) lançou um programa de saúde mental do professor em 2021. “Nas horas-atividade, uma vez por semana, cada professor podia optar por uma prática de autocuidado, como ioga, pilates, psicoterapia ou até fonoaudiologia para cuidar da voz. Tudo oferecido graças a uma parceria com a Secretaria da Saúde”, conta Priscila Tobias, psicóloga escolar que foi responsável pela implementação do projeto. Segundo ela, ao serem cuidados, os professores naturalmente passaram a promover o autocuidado e autoconhecimento entre os alunos.

9. Empatia e cooperação

Há quem culpe o excesso de telas, mas, independentemente de responsáveis, quem trabalha na escola tem percebido um aumento das brigas e conflitos. Embora o exercício do respeito e diálogo deva ser enfatizado em todas as interações escolares, pode ser útil organizar algum projeto específico. “Fizemos um levantamento e quase 70% dos estudantes estavam envolvidos com o bullying. Por isso criamos o projeto Não faça bullying, faça amigos, em que organizamos rodas de conversas, discutimos o porquê de algumas ‘brincadeiras’ não serem aceitáveis, mostramos os caminhos para pedir ajuda na escola”, relata a psicóloga que atuou na rede de Vargeão.

10. Responsabilidade e cidadania

Tomar decisões responsáveis, inclusivas e com base em princípios éticos é algo que se deve aprender desde cedo. Para que de fato isso aconteça, é indispensável que os adultos abram mão do controle e passem responsabilidades reais aos estudantes — sem deixar de supervisionar, claro. 

Em Vargeão, o projeto de mediação de conflitos tinha os estudantes como protagonistas. “Havia sempre um adulto, muitas vezes era eu, mas que estava lá para promover reflexões sobre o que aconteceu. No final, sempre perguntava para eles como resolver. Era responsabilidade deles encontrar uma saída”, explica a psicóloga.

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