NOTÍCIA

Formação docente

Autor

Juliana Fontoura

Publicado em 19/05/2025

A alfabetização sob a perspectiva de Emilia Ferreiro

Educadora argentina é um dos grandes nomes da área, defendendo que alfabetização vai muito além de um processo mecânico — e que criança é sujeito ativo nesse processo; em maio, sua vida e obra foram celebradas na ‘Semana Emilia Ferreiro’, promovida pela Rede Latino-americana de Alfabetização

A psicóloga e pedagoga argentina Emilia Ferreiro é uma das grandes referências quando o assunto é alfabetização. A partir de suas pesquisas, contribuiu com uma nova perspectiva sobre esse campo, entendendo que a alfabetização vai muito além de um processo mecânico. A educadora faleceu em agosto de 2023, aos 86 anos.

“Para a perspectiva de Emilia Ferreiro, alfabetização é o processo de apropriação das culturas do escrito que, sim, envolve a compreensão do sistema, mas não se limita a isso. Trata-se de aprender a usar a linguagem escrita como forma de significar o mundo, interagir socialmente e participar ativamente da vida cultural”, explica Giulianny Russo, mestre em escritura y alfabetización pela Universidade Nacional de La Plata (Argentina) e integrante da diretoria da Rede Latino-americana de Alfabetização. 

A vida e a obra da educadora argentina foram celebradas durante a Semana Emilia Ferreiro, organizada pela Rede Latino-americana de Alfabetização e realizada entre os dias 5 e 8 de maio.

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Segundo Giovana Zen, presidente da Rede e professora de graduação e pós-graduação da Faculdade de Educação da Universidade Federal da Bahia, a semana também foi concebida como “um espaço de resistência e mobilização coletiva em defesa do direito à alfabetização”. O evento teve a participação de 22 instituições, 67 conferencistas e mais de 9 mil inscritos. As gravações de todos os encontros estão disponíveis neste link

Na ocasião, celebrou-se também o aniversário de dois anos de relançamento da Rede Latino-americana de Alfabetização, que ocorreu em 5 de maio de 2023 — data simbólica, já que marca o nascimento de Emilia Ferreiro. 

A Rede foi criada, aliás, a partir da iniciativa da educadora argentina, tendo sua semente plantada ainda no final dos anos 1980. Nos anos 1990, a articulação se fortaleceu. Depois, passou por um período de menor atividade até que, por fim, a Rede foi relançada. 

“O relançamento da Rede foi uma resposta à urgência de fortalecer um projeto coletivo de defesa da alfabetização plena, frente aos retrocessos e às simplificações que vêm sendo adotadas em várias políticas públicas na América Latina”, explica a presidente Giovana Zen. 

Emilia Ferreiro

Psicóloga e pedagoga Emilia Ferreiro (Foto: Gustavo Morita)

Emilia Ferreiro e a psicogênese da língua escrita

A pesquisa de Emilia Ferreiro, baseada na epistemologia genética de Jean Piaget, deu origem, como explica Giovana Zen, a um novo campo de conhecimento: a psicogênese da língua escrita. E essa abordagem trouxe um novo paradigma sobre como crianças aprendem a ler e escrever. Em parceria com a também argentina Ana Teberosky, Emilia Ferreiro é autora do livro que leva o mesmo nome dessa perspectiva, Psicogênese da Língua Escrita.

“Antes de Emilia Ferreiro, a alfabetização era vista como um processo mecânico de associação entre sons e letras. Suas pesquisas mostraram que as crianças constroem ativamente conhecimentos sobre a escrita, elaboram hipóteses, testam ideias, confrontam informações. Ou seja, ela nos ensinou que alfabetizar é apoiar um sujeito pensante, que busca compreender como a escrita funciona e para que serve”, explica a especialista, a respeito da abordagem da educadora argentina. 

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Essa nova forma de ver a alfabetização — ou seja, não apenas como um processo mecânico —, acaba por transformar, também, a atuação do(a) educador(a), como afirma Giulianny: “Não basta ensinar letras, sons ou sílabas isoladamente. É preciso criar situações reais de leitura e escrita em que a criança possa pensar sobre a linguagem, formular hipóteses e ser escutada”.

Segundo a pedagoga, essa perspectiva exige um trabalho intencional e ético do(a) professor(a), o que envolve “organizar contextos significativos, mediar reflexões, considerar os saberes prévios das crianças e respeitar seus tempos de aprendizagem”. 

“Alfabetizar, nessa concepção, é uma tarefa intelectual, e não técnica. É um ato político, no sentido de afirmar o direito de cada criança a participar da cultura escrita desde o início”, afirma Giulianny Russo.

Emilia Ferreiro

Semana Emilia Ferreiro aconteceu de 5 a 8 de maio (Foto: reprodução)

Rede Latino-americana de Alfabetização

Giovana Zen destaca que a Rede Latino-americana de Alfabetização defende “o direito à alfabetização plena como parte de uma agenda latino-americana de justiça social”. “Isso significa que a alfabetização não pode ser reduzida a técnicas de oralização. Ela deve garantir a apropriação da linguagem escrita como bem comum, como forma de significar o mundo, participar da vida social e produzir pensamento”, afirma.

De acordo com a presidente, a Rede tem três eixos principais de atuação: formação de professores e formadores; produção e difusão de conhecimentos, por meio de eventos, publicações, debates e materiais formativos; e articulação regional, conectando universidades, redes de ensino, organizações da sociedade civil e coletivos de educadores em diversos países.

“A Rede também coopera com ações como o Programa Compromisso Criança Alfabetizada (MEC) e se articula com ONGs que compartilham da mesma concepção, como Avante, ICEP, Avisa Lá e Roda Educativa”, conta Giovana.

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