NOTÍCIA
Relação positiva foi apontada em relatório da OCDE; em escola pública de São Paulo, projetos de xadrez e atletismo trazem benefícios aos estudantes
A participação em atividades extracurriculares — como as artísticas e esportivas — foi associada positivamente ao desenvolvimento de competências socioemocionais em um relatório recente da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE). Publicado em outubro, o documento Nurturing Social and Emotional Learning Across the Globe traz dados da pesquisa Survey on social and emotional skills (SSES) de 2023, realizada com estudantes de 10 e 15 anos de 16 territórios pelo mundo, incluindo o Brasil. No caso brasileiro, participaram alunos de Sobral, CE.
As competências avaliadas incluem assertividade, criatividade e ‘motivação para realização’. De acordo com o estudo, baseado em questionários respondidos pelos alunos, na média e na maioria dos locais, o envolvimento em atividades extracurriculares teve uma relação positiva com todas as habilidades socioemocionais analisadas. Ou seja, alunos que se envolvem nessas atividades tendem a relatar maiores habilidades ligadas ao socioemocional.
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Silvia Lima, gerente na área de educação e advocacy do Instituto Ayrton Senna — entidade parceira da OCDE na realização da pesquisa SSES no Brasil —, afirma que as atividades extracurriculares não estão ligadas apenas às competências socioemocionais, mas também às cognitivas. No caso do socioemocional, porém, ela destaca algumas possibilidades.
“Elas [atividades extracurriculares] também possibilitam que, por meio de atividades artísticas, os estudantes trabalhem criatividade, abertura ao novo e pensamento crítico; ao realizarem atividades esportivas de forma coletiva e respeitosa, eles exercitem a questão da empatia, da inteligência emocional, da tolerância ao estresse, da frustração”, exemplifica.
Na Escola Estadual Deputado Pedro Costa, localizada na zona norte da cidade de São Paulo, as atividades extracurriculares geraram impacto para estudantes e comunidade, dentro de um contexto maior de mudanças vividas pela instituição. A escola, que atende do 1º ao 5º ano do ensino fundamental, chegou a correr risco de fechar em 2021 por redução no número de alunos — na análise da diretora Janaína Freire, devido à presença de escolas municipais nas proximidades que oferecem atrativos como tablets, por exemplo.
Contudo, naquele mesmo ano surgiu a oportunidade de a escola aderir ao PEI (Programa Ensino Integral). Com o ensino integral, iniciado em 2022, e o apadrinhamento da ONG Parceiros da Educação, em 2023, a instituição conseguiu expandir projetos de xadrez, culinária, atletismo (este criado já após a transição para o integral) e horta (antes, uma espécie de ‘projeto piloto’). Até então, as iniciativas eram conduzidas de maneira mais ‘caseira’, segundo a diretora. Eram utilizados, por exemplo, materiais levados ou desenvolvidos pelos próprios professores.
Com o apadrinhamento, houve a chegada de outro parceiro — o Instituto Syn —, e incentivo pedagógico e financeiro, o que possibilitou a expansão dos projetos. Como fruto, além de benefícios aos estudantes e maior ligação com a comunidade, a escola chegou à final do World’s Best School Prizes (Prêmios Melhores Escolas do Mundo, em tradução livre) de 2024. A premiação é promovida pela T4 Education e reconhece escolas por práticas que transformam a educação e impactam a comunidade. A E.E Deputado Pedro Costa ficou entre as três melhores na categoria colaboração comunitária.
A diretora Janaína Freire cita alguns dos impactos positivos percebidos nos estudantes após a implementação dos projetos. “Observo um maior interesse do aluno na escola, concentração, mais disciplina. Eles querem superar a própria meta deles. E há uma interação entre eles”, lista. Além disso, ela também destaca aspectos como empatia, resiliência e socialização. Todos os 306 alunos participam de todos os projetos da escola, segundo Janaína.
Com relação à prática esportiva, há também uma maior autoestima dos estudantes. “Tem aluno que fala assim: ‘eu não consegui [dessa vez], mas da próxima vou pular mais alto’”, exemplifica a diretora, em relação à prática de atletismo.
O docente responsável pelo projeto, Luiz Fernando Junqueira, explica que a escolha pelo atletismo se deu por se tratar de um esporte individual que pode atingir todos os estudantes. “O atletismo é a base de todos os esportes. É corrida, saltar”, explica o professor de educação física.
Luiz também afirma que, por haver várias modalidades no atletismo, o aluno pode se identificar com alguma das oferecidas, o que contribui para essa possibilidade de atingir todos. E lista alguns benefícios da prática. “O aluno cria empatia, resiliência, comprometimento. Não tem aquela coisa de acirramento de competição: ele compete com ele mesmo.”
Já no caso do xadrez, o professor responsável, Leonardo de Alcântara, destaca a possibilidade de socialização: estudantes do 2º ano podem jogar com colegas do 4º, por exemplo. Os alunos contam com duas aulas por semana (assim como o atletismo), mas há também mesas de xadrez disponíveis na escola, além do ‘xadrez gigante’, para que eles joguem quando desejarem.
“[No xadrez] Há regras, socialização, criatividade. E uma coisa que eu gosto do xadrez é o pensamento estratégico”, diz o docente, que também tem o xadrez como paixão pessoal.
Leonardo ressalta, porém, que o trabalho na escola é coletivo — e que os resultados incluem todas as áreas do saber e professores, não apenas os projetos de atletismo e xadrez. Há, inclusive, trabalho interdisciplinar, como lembra o professor Luiz. Por meio do lançamento de dardos, por exemplo, os alunos estudam matemática na prática.
Para a diretora Janaína Freire, as mudanças trouxeram impacto para o bairro e valorização da instituição pelas famílias. Devido à ‘pedagogia da presença’ — princípio em que o professor está sempre junto do estudante e que faz parte do PEI — e ao maior tempo de acolhimento dos alunos, há também a formação de vínculos.
Janaína também destaca como resultado o desejo de permanência na escola por parte dos estudantes. “A escola é muito presente na vida dos alunos e os alunos são muito presentes aqui dentro da escola”, resume a diretora.
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