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José Pacheco

Educador e escritor, ex-diretor da Escola da Ponte, em Vila das Aves (Portugal)

Publicado em 17/04/2019

Inferno astral

A cada eleição, os políticos responsáveis pela educação buscam encerrar um ciclo ruim – e tudo se repete

“Inferno astral” é uma crendice, tentativa de explicação da passagem por uma fase ruim. Tenho acompanhado alguns desses “infernos”. De quatro em quatro anos, o ciclo se repete.
Conscientes de que, num dos estados da União, em cada cem jovens que concluem o ensino médio, apenas um é proficiente em matemática, e de que o percentual de alunos do 9º ano com plenas condições de compreender e se expressar é inferior a 10%, secretários de Educação recém-indigitados esboçam projetos de mudança… e o “inferno astral“ se instala.


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Esses governantes são assediados por puxa-sacos, pedindo emprego para familiares e amigos. Recebem uma avalanche de currículos. São pressionados por políticos sem escrúpulos, negociando cargos. Poucos resistirão ao assalto de sistemas de ensino e consultorias, portadoras de mágicas soluções para a crise do sistema. E aqueles que resistem são alvo de fake news…

Relatórios de pesquisas continuam dando notícia da corrupção endêmica e sindrômica que afeta as estruturas do sistema educativo e o mantém em permanente “inferno astral”. Mas, ao que parece, o MEC não os lê. E os titulares da pasta, talvez, não saibam interpretá-los.

Se analisarmos a lista de ministros da Saúde, ou da Economia, vemos que essas pastas foram predominantemente lideradas por médicos e economistas. Mas, pelo Ministério da Educação, sempre passaram economistas, filósofos, advogados e outros profissionais, para os quais as Ciências da Educação ainda são “ciências ocultas”.

Nenhum paciente ousa questionar o diagnóstico de um médico, mas todo mundo se julga no direito de dar palpite sobre educação. Não é forçoso que um ministro da Educação de educação entenda alguma coisa. Nem isso explica o caos em que o ensino brasileiro está imerso. Os ministros são pessoas bem-intencionadas, usam de bom-senso. Porém, agem em contextos onde reina o senso comum, onde pontifica a burocracia, onde a cientificidade está ausente.

Se nos abstrairmos das introduções das leis – verdadeiros tratados de ficção científica, em total contradição com o teor das normas que introduzem – as decisões de política educativa raramente se pautaram por critérios de natureza científica. No ministério, como nas secretarias de Educação, onde deveriam atuar técnicos, habita a mediocridade, impera a burocracia. Mutatis, mutandis, perpetua-se um modelo de escola obsoleto, sacrifica-se a ética no altar da “governabilidade”.

A recente nomeação de um secretário de Educação acendeu no espirito deste incorrigível esperançoso um pressentimento de que algo vai mudar. Escutemo-lo: Nosso currículo, nossas metodologias e nossas rotinas precisam passar por um processo de modernização. Teremos seleções técnicas para todos os cargos. Políticas públicas serão baseadas em evidências científicas.

Conheço o novo secretário. É pessoa competente para o exercício do cargo e talvez não ceda perante tentativas de assassinato político perpetradas por politiqueiros e bonsais humanos preconceituosos, que chafurdam na lama da era da pós-verdade. Talvez consiga contornar o Mito de Sísifo e, quando entrar em Ano-Novo, faça acontecer o Natal de uma Nova Educação.

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