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A discussão é antiga: a escola deve preparar alunos para o mercado de trabalho ou para questões mais amplas da existência humana? Não existe uma resposta definitiva para tal dilema entre os especialistas, e as instituições de ensino têm buscado diferentes caminhos, de acordo com seu público e sua proposta pedagógica. No mundo todo, países que saíram do subdesenvolvimento para sociedades altamente produtivas declaram que o investimento em educação foi fundamental para chegar ao topo do ranking do mundo competitivo entre os “emergentes” — caso de Coreia do Sul, Indonésia, África do Sul e outros.
Por aqui, a educação tem sido responsabilizada negativamente por quase tudo na carreira das crianças e jovens – do fracasso escolar ao fracasso no trabalho, passando pela insatisfação na vida pessoal. E agora jogam mais lenha nessa fogueira sem vaidades: a escola e a faculdade não têm ajudado na produtividade das empresas brasileiras. É o que indica o estudo “Renda e produtividade nas últimas décadas”, da Série Panorama Brasil, produzido pela consultoria Oliver Wyman com o Insper Instituto de Ensino e Pesquisa. Foram analisados diversos fatores como Produto Interno Bruto (PIB), evolução da renda e sua distribuição, capital físico, infraestrutura, capital humano, qualidade no ensino, produtividade, ambiente de negócios, alocação de recursos, gestão empresarial, abertura comercial e perfil demográfico.
Analisando a evolução dos principais indicadores relacionados a renda e produtividade nas últimas décadas, resumiram-se os fatores que trouxeram o Brasil à situação atual. E concluiu-se que, apesar dos avanços sociais — como a retirada de 17 milhões de pessoas da miséria e mais gente com acesso ao ensino em geral —, todas essas conquistas louváveis não se refletiram nos indicadores de qualidade da educação nem na melhoria da produtividade empresarial.
No primeiro caso, na Avaliação Escolar (Pisa – Programa Internacional de Avaliação) da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Humano (OCDE), fomos os últimos colocados de uma amostra de 43 países, segundo o estudo. Em 2015, tivemos uma melhora relativa, mas, ainda assim, ficamos em 60º lugar entre 67 países. No segundo ponto, a produtividade no Brasil não cresce por motivos conhecidos, como a qualidade da educação, mas também devido a infraestrutura, ambiente de negócios e abertura comercial. Pior, os indicadores de produtividade caíram. Entre meados das décadas de 1990 e 2010 a nossa produtividade decresceu de forma acentuada em comparação com a americana, caindo de 69% em 1996 para 48% em 2014.
Ou seja, tivemos avanços nas políticas educacionais, como o índice de alfabetização ter crescido 6% (de 86% da população, no ano 2000, para 92% em 2015) e a média de anos de escolaridade (para quem tem 25 anos ou mais) ter quase dobrado (98%, entre 1990 e 1996), passando de quatro anos de estudos, em média, para oito anos. Entretanto, isso não se refletiu em ganhos qualitativos nos meios de produção.
Do ponto de vista da literatura acadêmica, o capital humano pode ser interpretado como a qualificação dos trabalhadores. E tem como seus principais determinantes o grau de escolaridade e a qualidade da educação. A teoria diz que pessoas com maior nível educacional tendem a ser mais produtivas e mais capazes de utilizar o capital físico disponível. Mas é preciso estar atento aos pré-requisitos em jogo, que repetimos aqui: grau de escolaridade e qualidade da educação. O Brasil, de acordo com o estudo, marcou um gol no aumento da escolaridade, mas foi goleado na qualidade do ensino. O nosso capital físico disponível – infraestrutura e equipamentos das empresas, entre outros — também não colabora pela ineficiência e defasagem tecnológica, o que derruba os ganhos do capital humano.
Sonia Colombo, diretora da Humus Consultoria e autora de vários livros de gestão educacional, ao analisar o resultado do estudo da Wyman/Insper, diz que “existe atualmente uma grande preocupação pelo tempo da criança e do jovem na escola como se fosse resolver os problemas educacionais”. Para ela, o “aumento do tempo na escola não significa necessariamente qualidade no aprendizado”. É necessário investir na qualidade da aprendizagem e não apenas no ensino, insiste, lembrando que “essa é uma discussão antiga entre os educadores”. Colombo opina ainda que as escolas de educação básica são pressionadas pelos pais e pelo mercado para aprovar alunos nos vestibulares e ranquearem bem nos exames como Enem, o que “interfere no projeto pedagógico”. Escolas que não pontuam bem no Enem se defendem justificando que não são conteudistas, privilegiando a formação integral do aluno. E as instituições de ensino superior se dividem entre a vocação muito acadêmica e a necessidade do mercado empresarial (formação de mão de obra). “Acredito que ambos os modelos, mais voltado ao mercado ou mais focado na formação cultural, atendem a diferentes necessidades dos alunos e vão sempre existir. Essa pluralidade é importante para a nossa sociedade”.