NOTÍCIA

Edição 223

Rumos da gestão

Encontro organizado pela revista Educação reuniu gestores de escolas privadas em São Paulo. Em pauta, conceitos e debates sobre liderança, uso de tecnologia e como prevenir a evasão

Publicado em 04/11/2015

por Flávia Siqueira

Rumos da gestão

 

 
De um lado, o papel de formadora. De outro, o de empresa. Duas faces da escola particular que, no dia a dia, muitas vezes se manifestam como conflitos entre as áreas pedagógica e administrativa. Embora não exista receita mágica para garantir que uma escola seja bem-sucedida, é possível, sim, encontrar o equilíbrio por meio de fatores como organização, treinamento e cuidados com a comunicação. O objetivo é que os diversos profissionais – do diretor ao porteiro, do professor ao atendente – atuem de maneira coordenada e transparente.
O tema esteve em pauta no Grande encontro da educação – Painel de discussões para o gestor privado da educação brasileira, evento realizado pela revista Educação, da Editora Segmento, em São Paulo (SP), no dia 7 de outubro.
“Muitas vezes nos deparamos com essa ideia de que a área administrativa ”só faz conta”. Na verdade, a fórmula do sucesso é a interação saudável entre as duas áreas: a pedagógica e a administrativa”, diz Fernando Barão, sócio da Corus Consultores, especializada em gestão educacional, um dos participantes do primeiro painel do evento, sobre gestão e planejamento. “Quanto mais o pedagógico e o comercial se conhecerem, melhores serão as decisões tomadas”, complementa Fernando Cury, diretor administrativo da Escola Santi, de São Paulo (SP).
Quanto à saúde financeira de escolas, Barão afirma que o pior cenário é quando ela está sem lucro e endividada. Como consultor, contudo, ele conta que costuma ter contato principalmente com escolas em situação “intermediária”: com bom lucro, mas também com alto endividamento, ou sem lucro, mas com um bom caixa. Barão afirma que o planejamento financeiro de escolas precisa levar em conta a sazonalidade. O pior momento de caixa para uma escola costuma ser o fim do mês de julho – quando é grande a saída de dinheiro para pagamento de férias e ocorre um aumento da inadimplência.
Barão acrescenta, ainda, que o elemento mais crítico para o sucesso de uma escola é o corpo de professores e funcionários. Além de representarem o principal item de custo, é deles que depende, fundamentalmente, a qualidade do ensino. No longo prazo, diz o consultor, é ela que atrai mais alunos e faz com que a escola mantenha os já matriculados. “Há aspectos muito mais importantes do que o investimento na estrutura física.”
Recursos humanos
A seleção e a contratação de profissionais foram o tema do segundo painel do evento: A dinâmica do mercado de trabalho no setor da educação.
Luís Testa, diretor de marketing e estratégia da Catho, abriu a mesa com uma apresentação da situação do mercado de trabalho brasileiro nos últimos anos: após um grande aumento na formalização da mão de obra (registros em carteira de trabalho), a atual crise impôs uma queda ao ritmo de contratação.
O setor de educação, contudo, não parece ter sofrido um impacto tão grande quanto os demais, avalia Testa. Ao menos é o que mostram dados coletados pela Catho em sua plataforma de oferta e busca de empregos.
“As empresas de ensino mostram um crescimento constante”, afirma Testa. Nesse cenário, diz o executivo, usar bem os recursos tecnológicos disponíveis para localizar e recrutar talentos é fundamental.
No caso da procura por profissionais mais especializados com grande experiência, muitas vezes é ineficiente simplesmente anunciar a vaga e esperar por currículos. É necessário recorrer à busca ativa e, se o que se pretende é chegar aos profissionais mais jovens, será preciso ir aonde eles estão: na internet, principalmente em plataformas móveis.
Também vale considerar, afirma Testa, o uso de recursos de geolocalização: direcionar a oferta de uma vaga a profissionais que morem em uma determinada região. Com isso, afirma o diretor, é possivel reduzir problemas devido a longos deslocamentos e obter uma menor taxa de rotatividade.
Marketing com inteligência
Como reduzir a evasão e aumentar o número de estudantes matriculados? Aqui, o ponto chave é a comunicação. No contato com as famílias, a escola precisa ser coerente com os princípios que ela afirma seguir.
“Se a escola se apresenta como uma instituição criativa, então ela deve mostrar essa criatividade em seus corredores. Os valores devem permear todo o ambiente”, afirma Henrique Tichauer, da EXP Inteligência Educacional.
O momento de apresentação da escola aos pais é crucial. Em vez de terminar no portão de saída, por exemplo, a visita deve ser concluída em um ambiente preparado para receber as famílias e os potenciais futuros alunos.
É preciso ter as principais informações à mão, destaca Tichauer, como preços, condições de pagamento e formulários. “São cuidados que fazem diferença e demandam treinamento e organização de processos.”
Harlei Florentino, diretor do Colégio Oswald de Andrade, sugere a realização de projetos e eventos com a participação da comunidade e dos pais. Além disso, atividades e ações interessantes realizadas pelos alunos podem se tornar parte da comunicação da escola com seu público. “Para isso, é preciso mexer em papéis e na rigidez de processos”, afirma o diretor.
Para evitar ou reduzir a evasão, tanto Florentino quanto Tichauer enfatizam o mesmo ponto: o melhor é prevenir, criando meios de detectar a insatisfação antes que ela resulte em evasão.
Florentino sugere a implantação de um sistema que permita um acompanhamento prévio – para isso, todos os funcionários devem ser treinados para reportar acontecimentos e conflitos que sinalizem a insatisfação e a potencial saída de um estudante da escola.

Questão de repertório
Os caminhos para melhorar as notas dos estudantes no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) foram tema do terceiro painel do Grande encontro da educação. Ricardo Madeira, especialista em economia da educação e professor da Faculdade de Economia e Administração (FEA), da USP, abriu o debate afirmando que é grande a associação entre o desempenho em redação e a performance em outras disciplinas cobradas em provas: o estudante que vai bem na redação normalmente tem uma boa nota geral.
Clécio Lima, CEO da empresa de tecnologia educacional Adaptativa, em seguida apresentou sugestões para melhorar o desempenho dos alunos na redação do Enem. São princípios utilizados em uma das ferramentas desenvolvidas pela empresa, mas que podem ser úteis também em outros contextos. Conheça algumas das propostas:
1. Apresentar os critérios de correção: não é raro os estudantes irem para o Enem sem conhecer o conjunto de aspectos pelos quais seus textos serão avaliados – domínio da norma culta, compreensão do tema e estrutura da dissertação, coesão, coerência e proposta de intervenção. É nesse último critério, aliás, que está a maior dificuldade dos alunos: como usar seus próprios conhecimentos para elaborar uma ideia de resolução de um problema.
2. Trabalhar o repertório dos alunos: Lima afirma que, nas análises feitas pela Adaptativa, a principal dificuldade dos estudantes estava na coleta e na organização de ideias para a criação de seu texto – muito mais do que no uso da norma culta e no conhecimento de normas gramaticais. Não se trata de um terreno árido, contudo: compartilhar ideias, discutir e propor soluções são coisas que muitas vezes os jovens fazem nas redes sociais.
3. Inserir o aluno no processo de correção: uma das propostas apresentadas por Lima é fazer com que o aluno participe da correção de redações dos colegas. Em primeiro lugar, o estudante deve conhecer bem os critérios de correção. Em seguida, ele passa a atribuir notas para as redações dos colegas de acordo com esses critérios e, mais tarde, pode comparar sua correção com a realizada por um professor. Assim, o aluno se aprofunda no tema, desenvolve o repertório e treina a capacidade crítica.
4. Chamar atenção para marcas de oralidade e abreviaturas: segundo Lima, o estudante muitas vezes nem percebe que escreveu “vc” em vez de “você” em uma dissertação. De acordo com o palestrante, muitas vezes é possível obter avanços simplesmente chamando individualmente a atenção do aluno para esses deslizes.
O fim do laboratório de informática?
O uso da tecnologia se tornou tema obrigatório em debates sobre educação. O que fazer diante de alunos que usam o celular praticamente como uma extensão de si mesmos? É necessário incluir programação na grade de disciplinas? Apostar em um laboratório de informática ainda é uma boa ideia?
Para esta última pergunta, Renato Júdice, diretor do Colégio Elvira Brandão, tem como resposta um enfático “não”. “Não faz mais sentido ter de ir até um lugar para ser digital. Hoje, é preciso criar uma atmosfera digital”, disse o educador durante o quinto painel do Grande encontro da educação. Mas, para que essa atmosfera funcione, é preciso primeiro superar problemas básicos de conexão. “A infraestrutura para uma escola é diferente da instalada em empresas. Pense, por exemplo, em 40 alunos baixando em seus dispositivos, ao mesmo tempo, um vídeo solicitado pelo professor.”
Ricardo Santos, especialista em educação da Cisco, concorda. “Na escola, conectividade não é apenas o acesso à internet. É ter uma estrutura para evitar a frustração na implementação de novos métodos de ensino – evitar o cenário em que o professor tenta fazer algo, mas não consegue.”
Júdice, que defende também a inserção de programação na grade curricular, afirma ser contra a mera proibição do uso de celular na escola. O diretor conta que, recentemente, chegou a liberar totalmente o uso dos aparelhos. “Foi um mês caótico”, conta. A experiência, por outro lado, foi importante para que os alunos sentissem na pele os efeitos da falta de regras quanto ao uso de celulares. Foi realizado, então, um encontro com os alunos justamente para discutir o tema e chegar a um acordo.

Autor

Flávia Siqueira


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