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Luiz Fernando Costa de Lourdes

Diretor da EMEF Profa. Maria Aparecida Rodrigues Cintra, SP, mestre em educação. Professor do 'Uma jornada pela diáspora africana' (prêmio Educação em Direitos Humanos, SMDHC - SP) e professor de pedagogia do Instituto Vera Cruz.

Publicado em 26/09/2025

Dos fios da escola às tramas da democracia

Como nas mãos das artesãs, cada pedaço da escola se molda com cuidado e revela uma beleza singular, que não se dá sem ausência de conflitos, mas na capacidade de atravessá-los juntos

Dos fios que tecem cada nova trama, a educação vai ganhando sua forma. É no entrelaçar das vozes, dos gestos e dos conflitos que o tecido escolar revela sua complexidade. À primeira vista, o que pode parecer uma sucessão de rotinas entre horários, planejamento, reuniões, currículos, é nas mãos de quem vive a escola que o tapete se molda e pouco a pouco, ganha desenhos únicos, fruto da coletividade.

Em tempos de urgência por resultados, de precariedade das condições de trabalho, de afastamentos indevidos e miopia das políticas de educação, sustentar espaços genuínos de escuta e construção coletiva é mais que um princípio, é um ato de reexistência.

O território é reconhecido como potência quando o currículo se abre para outras experiências, nisso, algo profundamente transformador acontece. Foi assim, entre 2013 e 2014, durante o projeto Uma Jornada pela Diáspora Africana¹, que testemunhei o poder das tramas educativas quando elas se ancoram na identidade, no pertencimento e no protagonismo. Como professor coordenador, vi estudantes, professores e comunidade se unirem em torno de um projeto que tratava dos impactos da diáspora africana na cultura brasileira, em nossas histórias, em nossas heranças e, sobretudo, em nossos sonhos.

Luiz Fernando Costa

“Como bem nos ensina o tear, nenhuma peça se tece sozinha”, escreve Luiz Fernando Costa (Foto: Shutterstock)

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Esse projeto provocou profundos deslocamentos internos e externos na comunidade escolar. Fez com que estudantes enxergassem outras possibilidades de existência, outras formas de ser no mundo. Hoje, mais de uma década depois, reencontramos aqueles jovens como engenheiros, professores, educadores sociais e políticos.

Suas trajetórias não são obra do acaso: são o resultado de uma escola que, mesmo com suas adversidades, se dispôs a tecer com coragem, escutando a comunidade, dando espaços para novas tramas democráticas.

Esse tipo de experiência exige trabalho coletivo, tempo, sensibilidade e, principalmente, uma gestão comprometida com a escuta e o fazer partilhado. Como nas mãos das artesãs, cada pedaço da escola se molda com cuidado e revela uma beleza singular, que não se dá sem ausência de conflitos, mas na capacidade de atravessá-los juntos. Uma beleza que se vê no avesso do tapete, em que estão as marcas do esforço, das emendas e da persistência.

Nas tramas da educação brasileira, o que se costura é mais do que o cotidiano escolar: é o projeto de sociedade que estamos dispostos a construir. E, como bem nos ensina o tear, nenhuma peça se tece sozinha.

¹O projeto foi uma parceria entre a EMEFM Vereador Antonio Sampaio, o Museu Afro Brasil-Emanoel Araújo, a Suitland High School e o Prince George’s African American Museum and Culture Center patrocinado pela American Alliance of Museums

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