Primeira sul-americana finalista do Global Teacher Prize, prêmio que a colocou entre os 10 melhores professores do mundo
Publicado em 02/06/2025
Por que ensinar sobre emoções pode ser tão transformador quanto ensinar a ler?
Em um mundo em constante transformação, cujas demandas cognitivas se somam às exigências sociais, emocionais e éticas, torna-se cada vez mais evidente que a escola se revela como espaço vital não apenas para ensinar conteúdos, mas para acolher, escutar e preparar os estudantes para os desafios do mundo real, que vão desde a pressão com o desempenho escolar até questões familiares, sociais e digitais. É aqui que entra a alfabetização emocional, a qual emerge como um pilar essencial para o desenvolvimento integral das crianças e adolescentes, sendo a escola um dos espaços mais estratégicos para sua promoção.
Mas, o que é, afinal, alfabetizar emocionalmente? Trata-se de ensinar os estudantes a reconhecer, nomear, compreender e gerenciar emoções. Envolve também desenvolver empatia, construir relacionamentos saudáveis, tomar decisões responsáveis e cultivar atitudes éticas. Esses aprendizados não nascem prontos, são construídos.
Um relatório da OCDE de 2021 apontou que habilidades socioemocionais como empatia, autogestão e cooperação são tão decisivas para o sucesso quanto matemática ou linguagem. Mais do que isso: estudantes emocionalmente equilibrados apresentam melhor desempenho, maior engajamento e maior satisfação com o seu processo de aprendizado.
Mais do que uma metodologia ou um modismo pedagógico, a alfabetização emocional representa uma mudança de paradigma (Foto: Shutterstock)
A convivência diária, com suas diferenças, conflitos e desafios, oferece terreno fértil para a construção dessas habilidades. A unidade escolar é o lugar em que os estudantes não apenas aprendem sobre o mundo, mas também sobre si mesmos e sobre o outro. E é nesse cenário que a alfabetização emocional pode — e deve — acontecer.
Como espaço coletivo e formativo, a escola oferece contextos reais de convivência, resolução de conflitos e práticas cooperativas. Esses momentos são oportunidades valiosas para o desenvolvimento de habilidades emocionais, que não se constroem por meio de conteúdos teóricos apenas, mas principalmente pela vivência cotidiana. Dados da CASEL (Collaborative for Academic, Social, and Emotional Learning) mostram que programas estruturados de educação socioemocional aumentam em até 11% o rendimento cognitivo, reduzem problemas de comportamento e fortalecem o clima escolar.
Apesar da crescente valorização do tema, inserir a alfabetização emocional no cotidiano escolar esbarra em vários desafios. Entre eles, destacam-se:
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Emoções e autoconhecimento dentro do currículo
Atividades extracurriculares podem ajudar no desenvolvimento de competências socioemocionais
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As produções audiovisuais também têm revelado, com sensibilidade e intensidade, os dilemas emocionais vividos por adolescentes. Séries como Adolescência, Tudo, aqui e agora, Sex education e Atypical, disponíveis na Netflix, escancaram as inseguranças, os conflitos de identidade, os relacionamentos conturbados e a busca por pertencimento que marcam essa fase da vida. Esses conteúdos, ao dialogarem com o público jovem, evidenciam o quanto é urgente que a escola ofereça espaços seguros e intencionais para que estudantes possam compreender e expressar suas emoções, promovendo não apenas conhecimento, mas também acolhimento e orientação.
Além disso, muitos educadores também enfrentam suas próprias dificuldades emocionais, reflexo de um cenário de estresse, esgotamento e cobranças constantes, o que reforça a urgência de cuidados institucionais com o bem-estar de toda a comunidade escolar. Por outro lado, gestores escolares são agentes estratégicos na criação de políticas e práticas institucionais que promovam o bem-estar coletivo. Implementar ações de formação continuada para docentes, estabelecer espaços de escuta e cuidado com a saúde mental da equipe, incluir a educação emocional nos projetos pedagógicos — tudo isso contribui para a consolidação de uma cultura escolar que valoriza o desenvolvimento humano em sua totalidade.
A saúde mental dos estudantes está em alerta. A Fundação Lemann, em parceria com o Instituto Península, apontou em 2022 que 74% dos professores perceberam aumento nos casos de ansiedade e angústia entre os alunos no pós-pandemia. Ignorar esse dado é comprometer o futuro de uma geração. Alfabetizar emocionalmente é, portanto, uma resposta necessária a uma demanda real, que afeta o rendimento, a convivência e a qualidade da aprendizagem. É uma maneira de tornar o processo educativo mais humano, mais empático e mais eficaz.
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Redes sociais e infância, debate urgente no espaço escolar
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Mesmo diante de limitações, há estratégias acessíveis que podem fazer a diferença:
A alfabetização emocional não é um luxo pedagógico, mas uma necessidade urgente frente aos desafios contemporâneos. Formar indivíduos capazes de lidar com suas emoções, de respeitar as diferenças e de construir relações saudáveis é, sem dúvida, uma das missões mais nobres da escola. Afinal, aprender a sentir, compreender e cuidar também é aprender a viver em sociedade.
Mais do que uma metodologia ou um modismo pedagógico, a alfabetização emocional representa uma mudança de paradigma. Ela convida a escola a olhar para o ser humano de forma integral. A aprendizagem plena só acontece quando há espaço para sentir, expressar, compreender e se relacionar. E talvez seja esse o caminho mais promissor para uma educação mais justa, sensível, humanizadora e transformadora.
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