É do povo Maxacali, filósofa, educadora, aprendiz de parteira. Lecionou por 12 anos em uma escola indígena de São Paulo. É representante do Núcleo de Educação Indígena e fundadora do Instituto Maracá. Coordena o projeto Escolas Vivas.
Publicado em 10/04/2025
“De que vale aprender a gramática das línguas se não se conhecem os mistérios da natureza” (Romildo Potiguara)
Tempo, tempo, tempo…
O tempo é um grande professor, mestre dos dias e dos saberes ancestrais. A vida é repleta de códigos e informações que nos orientam e guiam nossa caminhada. Dentro dos processos de resistência vamos observando um pulsar de sonhos e memórias sendo despertados através de uma parceria e rede de afetos e cuidados que vêm sendo tecidos com ‘fios’ coloridos e muito fortes.
Por mais que o adoecimento e a contradição humana insistam em descompassar o nosso caminhar, sentimos que estamos preparados para seguir poetizando os conhecimentos a cada novo amanhecer. A partir da semeadura das Escolas Vivas, estamos nos fortalecendo e nos encorajando a seguir soprando resistência em forma de amor. E, por meio de outros processos educativos, vamos encontrando um suspiro para a alma e uma pausa para a dureza de situações cotidianas que muitas vezes machucam a gente.
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A educação escolar se faz presente em todos os cantos do mundo e, com isso, culturas milenares vão sendo atravessadas e moldadas com a imposição de uma monocultura mental que não respeita o tempo das coisas. A padronização de um currículo que prioriza teorias desconectadas da vida, da floresta e dos espíritos é demasiada violência para povos de culturas muito antigas que sempre tiveram seus modos próprios de transmitir saberes e fazeres. Muitos dos conhecimentos fundamentais para a vida vêm deixando de ser praticados e suas memórias vêm sendo adormecidas por essa imposição de séculos. Desde a catequização, depois escolas militares e hoje um incentivo a uma educação mecanicista e tecnologizada.
O fato de as crianças do mundo inteiro deixarem de brincar, interagir com a terra, subir em árvores e sentir os códigos que o tempo ensina, as torna frágeis e despreparadas para lidar com as situações da vida. Nenhum povo sobrevive de letras e números. Precisamos conhecer as plantas e escutar suas mensagens, precisamos escutar as árvores, as ondas do mar, o curso dos rios, as montanhas, os trovões e o vento.
Cristine Takuá: sonho com mais e mais escolas vivas desabrochando nos territórios (Foto: Vhera Poty)
Por isso, sonho com mais e mais escolas vivas desabrochando nos territórios, para que as crianças possam ter liberdade de viver em paz, sem serem pressionadas a dizer o que vão querer ser quando crescerem no momento em que ainda estão aprendendo a decifrar os códigos que a natureza tem. Imaginem se todos sonhassem ser anciãos e anciãs, e, assim, respeitarem todas as formas de vida, caminhando serenamente no compasso do Bem Viver — para além de doutor ou algo que carregue o peso de um título.
Na floresta habitam seres muito criativos e os espíritos-guardiões de tudo que nela habita que estão a nos observar. Só que eles estão bravos com nossa desajustada maneira de caminhar. Precisamos reaprender a caminhar suavemente sobre a Terra, senão todos nós sofreremos as consequências de nossas próprias contradições.
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