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Responsável por revolucionar o processo de alfabetização, Emilia Ferreiro faleceu em 26 de agosto deste ano, aos 86 anos
Publicado em 28/08/2023
Escritora, psicóloga e psicolinguista argentina, Emilia Beatriz Maria Ferreiro Schavi (1937-2023) foi uma grande pedagoga, pesquisadora e crítica da alfabetização tradicional. Referência na educação brasileira, Emilia faleceu aos 86 anos, em 26 de agosto, no México, onde morava.
“Emilia Ferreiro teve uma produção intelectual, acadêmica e científica enorme, com pesquisas importantíssimas na área da alfabetização e ensinamentos capazes de terem feito uma revolução em como se compreendia e se compreende a aprendizagem da leitura e da escrita. Quando perguntada, ela respondia que pensava que sua maior contribuição [para a educação e para o processo de aprendizagem] foi colocar a criança no centro do processo da alfabetização”, ressalta Regina Scarpa, diretora pedagógica da Escola Vera Cruz.
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Regina, que também é membra do conselho editorial da revista Educação, completa que teve o privilégio de compartilhar da amizade, do conhecimento e da sabedoria de Emilia. “É impressionante ver com que rigor ela sempre orientou as pesquisas e diversos orientandos em diversas partes do mundo. E acho que o título que ela recebeu como uma das maiores pesquisadoras do século 20 é muito definidor do que era a Emilia Ferreiro.”
Emilia Ferreiro nasceu em Buenos Aires, na Argentina, em 5 de maio de 1937. Se formou em psicologia pela Universidade de Buenos Aires e fez doutorado na Suíça sob orientação de Jean Piaget (1896-1980), um dos grandes pensadores do século 20, sendo sua única orientanda latino-americana.
Após o Golpe de Estado em 1977 na Argentina, Emilia se exilou na Suíça e passou a lecionar na Universidade de Genebra, onde iniciou uma pesquisa sobre as dificuldades e aprendizagem das crianças de Monterrey, no México, país para o qual se mudou em 1979.
Autora de obras como Com todas as letras, Reflexões sobre Alfabetização e O ingresso na escrita e nas culturas do escrito, publicadas pela editora Cortez, Emilia chegou a conceder uma entrevista à revista Educação em 2013 sobre as tecnologias digitais e o processo de alfabetização.
“Um dos temas que têm sido muito discutidos entre os professores agora é como trabalhar em pequenos grupos em sala de aula e como formar esses pequenos grupos. Devemos formá-los com crianças que estão todas no mesmo nível de desenvolvimento? Procuramos as maiores diferenças possíveis? Ou procuramos diferenças que não sejam tão grandes, mas que permitam que as crianças se compreendam entre si, que a objeção de um seja entendida pelo outro? Esse é um tema de reflexão muito interessante e importante”, apontou Emilia na entrevista. (Clique aqui para ler).
Um de seus principais projetos foi a criação da Rede Latino-Americana de Alfabetização (Redalf), na década de 90. A Rede foi retomada em maio deste ano, três meses antes do falecimento da educadora, com o propósito de reunir pesquisadores e professores que acreditam no processo de alfabetização. “Nossa responsabilidade já era grande, com a partida de Emilia se tornou imensa: honrar o pensamento e os princípios da pessoa que mudou a nossa forma de olhar as crianças e de ver o mundo”, ressalta Giovana Zen, presidente da Redalf.
Segundo Giovana, a Rede conta com um conselho consultivo formado por 14 educadoras de sete países da América Latina, sendo que já estão se formando núcleos nacionais no Brasil, na Argentina, no México e no Uruguai.
“A Emilia Ferreiro que conheci era uma investigadora extremamente implicada com a qualidade do seu trabalho e que dedicou toda a sua vida a compreender o que pensam as crianças quando estão diante do desafio de aprender a ler e a escrever. Ela era reconhecida pelo rigor em suas pesquisas, pela ampla e vasta produção no campo da psicolinguística, pelo profundo respeito às infâncias e suas culturas e, sobretudo, pelo seu compromisso político com a América Latina”, afirma a presidente da Redalf.
Giovana Zen é professora da Universidade Federal da Bahia (UFBA), com pós-doutorado em alfabetização, orientado por Emilia Ferreiro. “Na condição de orientanda, tive o privilégio de compartilhar com Emilia momentos de muita alegria. A pesquisa que realizei sob a sua orientação consistia em analisar duas produções escritas de 111 crianças do município de São Francisco do Conde, da região metropolitana de Salvador. Emilia e eu analisamos cada uma das 222 produções escritas e era impressionante o respeito e a dedicação que ela tinha ao analisar cada uma das escritas. Quando ela estava diante das escritas infantis, o mundo ao seu redor deixava de existir”, compartilha Giovana.
“Todas as pessoas que se dedicaram a estudar o que a Emilia Ferreiro conseguiu produzir como pesquisadora tiveram o privilégio de aprender a respeitar as crianças e seus saberes. Isto significa compreender que a criança não é alguém que não sabe nada, ao contrário, a criança é um sujeito intelectualmente ativo que pensa sobre o mundo e isso inclui a escrita. Por isso, reiteramos insistentemente que é preciso respeitar o que sabem as crianças para que possam aprender cada vez mais e melhor”, conclui Giovana.