ARTIGO
Uma pequena biblioteca itinerante com livros infantis que trazem em suas histórias personagens negras em destaque, esse é o projeto SacoLê, criado pelo grupo de leitura Nós no Mundo em parceria com a pesquisadora da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) Ayodele Floriano Silva. A […]
Publicado em 23/12/2022
Uma pequena biblioteca itinerante com livros infantis que trazem em suas histórias personagens negras em destaque, esse é o projeto SacoLê, criado pelo grupo de leitura Nós no Mundo em parceria com a pesquisadora da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) Ayodele Floriano Silva. A iniciativa empresta kits com 10 livros para professores, crianças e seus familiares.
“A circulação dos SacoLês tem sido muito satisfatória para a leitura deste tipo de conteúdo ser cada vez mais presente na vida das crianças, sobretudo em ambientes escolar e familiar. É muito importante que as crianças de todos os pertencimentos étnico-raciais vejam personagens negras representadas de modo positivo, assim como é essencial que a cultura africana e afro-brasileira seja apresentada de maneira culturalmente rica, sem os estereótipos e preconceitos comuns da nossa sociedade”, pontua Ayodele Floriano.
———
Leia: Que a escola dos sonhos se torne realidade com corpos negros presentes nos currículos
———
O acervo conta com 80 títulos e foi selecionado a partir das indicações e reflexões presentes na pesquisa de mestrado Personagens negras infantis: retalhos de histórias, desenvolvida por Ayodele no programa de pós-graduação em educação da UFSCar. No estudo, ela identificou nos livros padrões de enfrentamento ao racismo por meio da valorização estética e da cultura afro.
A pesquisadora considerou o espaço no qual as personagens estavam, as interações com familiares, com outras personagens infantis, seres da natureza, seres míticos e imaginários.
“Pudemos ver situações e experiências comuns a qualquer criança, como medo do escuro, por exemplo, que é algo que pode ser vivenciado por personagens infantis de diferentes pertencimentos étnico-raciais. Mas vimos também experiências relacionadas ao pertencimento racial das personagens. Este segundo padrão se relaciona com as experiências ligadas ao racismo, que atinge diretamente as personagens infantis negras, e à negritude, como enfrentamento a essa forma de violência com a valorização da estética e da cultura negra”, menciona.
———
Leia: Como implantar uma educação antirracista desde a educação infantil
———
A literatura, como reflexo da sociedade, excluiu ou tratou a população negra de forma diferenciada ao longo de muitos anos na história do Brasil. Até 1920, personagens negras praticamente não apareciam nas páginas dos livros publicados. Com o passar dos anos, essa presença foi se tornando mais comum, porém sempre associada à condição de escravidão, pobreza, violência e subalternidade, ou ainda trazendo a cor negra relacionada à maldade ou à falta de beleza.
Tais fatos levaram gerações de crianças negras a crescerem sem representatividade positiva, enquanto isso, crianças não negras recebiam uma interpretação negativa ou equivocada da população negra. A partir da década de 80, a invisibilização começou a diminuir e personagens negras passaram a ter mais destaque nas publicações, ainda de forma sub-representada.
Com o incentivo às políticas de valorização da população negra, promovidas nas últimas décadas, alguns avanços na representatividade negra em livros infantis foram registrados. Hoje, a indústria editorial tem dedicado mais atenção a esse público, com a valorização dessa cultura.
Yodele defende que a literatura ajuda crianças e adultos de todos os pertencimentos étnico-raciais a refletirem sobre as contribuições da população negra para a sociedade brasileira.
“Desmistificar uma suposta superioridade do branco sobre o negro é importante para que todos e todas as crianças cresçam na direção da superação do racismo na sociedade brasileira”, completa a pesquisadora.
Mais informações sobre o projeto SacoLê podem ser obtidas pelo Instagram @grupo.nosnomundo.