NOTÍCIA

Edição 222

Autor

Redacao

Publicado em 05/10/2015

Quem tem medo da autonomia da escola?

As escolas brasileiras não cumprem os seus PPP, porque não são autônomas

A citação é longa, mas devo dá-la a conhecer, para que se perceba de que modo a perda de autonomia precipitou o sucateamento da escola pública, provocou sua desintegração: Essa desintegração se completa com a supressão da autonomia quanto ao ensino, sua seriação, métodos e exames. Levada a ordenação externa da escola até esse ponto, é evidente que nada restará senão o automatismo de diretores e mestres, a executar o que não planejaram, nem pensaram, nem estudaram, como se estivessem no mais mecânico dos serviços. Ora, mais não será preciso dizer para explicar a pobreza, a estagnação, a total ausência de pedagogia, que vai pelas nossas escolas. De todas as instituições, nenhuma precisa de maior autonomia e liberdade de ação do que a escola. Cumpre dar a cada estabelecimento o máximo de autonomia possível e essa regra é a grande regra de ouro da educação. As escolas só voltarão a ser vivas, progressivas, conscientes e humanas, quando se libertarem (…) assumindo todas as responsabilidades.
Eis o que Anísio pensava da administração e gestão das escolas. Sábias e atuais considerações, escritas há 60 anos, quando se prenunciava o futuro desaparecimento dos ginásios vocacionais, último assomo de projeto autônomo, que o mesmo será dizer: legal e cientificamente fundamentado. De então para cá, o discurso sobre autonomia apenas logrou enfeitar normativos. Abunda no texto dos projetos político-pedagógicos, mas está ausente das práticas efetivas das escolas brasileiras. Isso mesmo: as escolas brasileiras não cumprem os seus PPP, porque não são autônomas.
A ínclita geração do Florestan e do Darcy legou-nos uma LDB que, não sendo perfeita, abre possibilidades de acesso das escolas ao exercício de autonomia. Vinte anos decorridos sobre a publicação da lei, o seu artigo 15º ainda é letra morta, porque o sistema educativo brasileiro mantém-se cativo de legalistas que, à tralha normativa herdada da ditadura, foram acrescentando despachos, resoluções e outros documentos caraterísticos de uma gestão burocratizada. Se muitas dessas normas forem analisadas à luz da pedagogia, concluir-se-á que são… ilegais.
Fenômenos como a corrupção e a impunidade, comuns no contexto da crise moral que nos afeta, radicam, em parte, na prática de um modelo escolar reprodutor, controlado por uma gestão hierarquizada e autoritária. O Darcy disso tinha consciência e foi exilado. O Anísio também o sabia e foi assassinado. Interesses ocultos mantêm as escolas numa crônica dependência, pelo que urge assegurar o exercício de uma gestão administrativa e financeira baseada na pedagogia.
A autonomia pedagógica da escola será o primeiro passo para o cumprimento efetivo dos desideratos da LDBEN. A meta 19 do Plano Nacional de Educação requer que, até ao final de 2016, estados e municípios criem instrumentos de concretização de uma efetiva gestão democrática. O instrumento que a concretiza dá pelo nome de “termo de autonomia”. Quero acreditar que os educadores brasileiros irão reivindicar a dignidade do exercício da profissão, celebrando termos de autonomia. Se assim for, talvez os critérios de natureza pedagógica passem a prevalecer nas decisões de política educativa. Pois que assim seja!


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