NOTÍCIA

Edição 237

Professores da rede estadual paulista opinam sobre a reforma do ensino médio

Edmílson Saturnino, professor de história, e Andressa Silva, professora de sociologia, mostram dúvidas e ceticismo com relação aos rumos para a etapa

Publicado em 15/03/2017

por Redacao

andressa silva Andressa, professora de sociologia: “os alunos já chegam ao ensino médio com grande defasagem acumulada” | Foto: © Gustavo Morita

Em meio aos debates sobre o ensino médio, cuja proposta do governo federal, apresentada como Medida Provisória em 2016, virou lei publicada no Diário Oficial da União em 17 de fevereiro deste ano, Educação traz a opinião de dois professores que atuam nesta etapa educacional em escolas estaduais na cidade de São Paulo.
Da conversa com os dois, ainda que possam não representar o olhar de todo o professorado paulista (menos ainda do brasileiro) sobre o atual quadro educacional do ensino médio, restam algumas certezas: será preciso explicar exaustivamente os diversos aspectos da reforma e as responsabilidades nela implicadas; será necessário, também, esforço para reverter a descrença na capacidade de investimento dos estados brasileiros, de modo a oferecer o que a lei propõe; falta, sem dúvida, senão o diálogo ao menos uma escuta mais aberta sobre como professores e alunos veem a escola e, sobretudo, sobre o que gostariam de ver no seu dia a dia.

Andressa, professora de sociologia: “os alunos já chegam ao ensino médio com grande defasagem acumulada” | Foto: © Gustavo Morita

Foto: © Gustavo Morita

Aos 34 anos, Andressa Silva está entrando no seu 11º ano como docente. Em 2017, dará aulas de sociologia em duas escolas esta­duais na capital paulista: a EE Prof. Alberto Conte, em Santo Amaro, muito concorrida pelos professores, e na EE Dep. Hugo Lacorte Vitale, no Campo Limpo, já na divisa com Taboão da Serra, região de maior vulnerabilidade para a qual a secretaria estadual oferece um adicional a quem lá leciona.
Ex-aluna da rede municipal no ensino fundamental, cursou o médio numa escola técnica particular, ingressando depois em ciências sociais na Unesp de Araraquara, onde fez bacharelado e licenciatura plena entre 2003 e 2006. Atualmente, está para terminar o bacharelado em geografia na Universidade de São Paulo, já tendo se licenciado para dar aulas da disciplina.
Até o ano passado, ganhava cerca de R$ 2.750 por um total de 40 horas semanais, mais 5 horas de ATPCs (Aula de Trabalho Pedagógico Coletivo). Neste ano, dará 30 horas/aula no Alberto Conte e outras 14 no Hugo Lacorte, para onde foi para melhorar os rendimentos.
Informada sobre questões relativas à carreira e sobre os destinos do ensino médio para o qual leciona, Andressa identifica alguns problemas para o insucesso da etapa: má formação dos alunos no ensino fundamental, infraestrutura deficiente, má formação dos professores e pouca liberdade de cátedra. Leia, a seguir, a entrevista concedida à revista Educação.
Como você vê o ensino médio hoje?
Tenho a impressão de que é uma etapa com muitos problemas, de ordem variada. Primeiro, tem um problema de finalidade. Para que serve o ensino médio? Se é para o ingresso na universidade, isso não é uma realidade, até porque nem todos os alunos almejam ir para a universidade, seja pública ou particular. Quanto à aprendizagem, tanto do ponto de vista da construção da cidadania como dos conteúdos, temos um enfrentamento muito grande em relação à defasagem dos alunos. Muitos problemas que estouram no ensino médio deveriam ter sido resolvidos no fundamental.
Você pode exemplificar?
Em leitura, na escrita, nas operações matemáticas, no pensamento lógico, na construção de raciocínio, na análise de gráficos e tabelas, na análise e comparação de dados. Na sociologia e na geografia, disciplina que também lecionei, a gente precisa fazer análise de dados do IBGE, por exemplo, e os alunos do médio não conseguem analisar uma tabela, pois não têm o conhecimento matemático para isso. Esse é um dos gargalos do médio, visto nos próprios indicadores do governo. Fala-se que as metas não são atingidas, mas eles já chegam com grande defasagem acumulada nos ciclos anteriores.
E o que funciona bem?
O trabalho com projetos. Na EE Alberto Conte, onde estou desde o ano passado, e em outras escolas onde já lecionei que permitem trabalhar de uma forma mais interdisciplinar, transversal, isso permite integrar os conhecimentos e funciona melhor. É possível fazer um projeto em que o aluno aplique na prática as teorias que vê em sala de aula. Isso não só na sociologia, ou nas ciências humanas, mas também em disciplinas de biológicas, por exemplo. Como minha segunda formação é geografia, também trabalho com biologia e outras áreas. Os alunos gostam, e você sai do “cabeça atrás de cabeça” da sala de aula.
E isso ajuda a recuperar os conteúdos nos quais eles estão defasados?
Nas ciências humanas, conseguimos recuperar esses conteúdos o tempo todo, pois sempre que vamos analisar um fato social relembramos o que foi visto antes. Mas não sei se isso é possível nas ciências exatas. Se o aluno tem dificuldade com as operações, não sei se é possível recuperar isso numa equação mais complexa. Nas humanas, é possível.
A forma de atribuição de aulas atrapalha o trabalho com projetos?
Na rede estadual, não. O que não colabora é a estrutura da escola. O horário de trabalho, os tempos do professor não colaboram com o trabalho por projetos, pois temos uma grade que tem de ser cumprida, fechada. Para trabalhar o interdisciplinar, preciso casar o meu horário com o horário do professor de biologia, por exemplo, se temos as mesmas turmas.
O que achou da reforma do médio aprovada pelo governo federal?
Não podemos tapar o sol com a peneira; a forma como o ensino médio é constituído hoje não pode continuar. Há muitos adolescentes fora da escola, a evasão é muito grande. Mas acho que esses dois problemas melhorariam se os problemas do ensino fundamental 1 e 2 fossem resolvidos. Não consigo enxergar na reforma preocupação com a qualidade da aprendizagem. E não estou falando do ponto de vista do currículo, pois acho que esse é o menor problema. Minha preocupação é com as questões estruturais. A proposta fala da questão da liberdade do aluno para escolher sua trajetória. Mas, pela MP, não é o aluno que vai escolher, é o sistema de ensino. E se fica a critério do sistema de ensino, minha preocupação é de que não seja a demanda que determine a oferta, e sim a oferta que determine a demanda.
E o que mais?
Falta ouvir quem está no chão da escola. Professores e alunos não foram ouvidos, embora digam que sim, mas isso não é verdade. Também haverá dificuldade para os alunos que trabalham cumprirem esse currículo com maior número de horas. Além disso, se a formação vai ser diferenciada, será que ela não vai aprofundar uma segregação? Essa segregação já existe, mas será que isso não vai ser acirrado do ponto de vista de seu espraiamento pela cidade? Não sei se essa isonomia será garantida. Sem falar dos recursos, pois há um prazo para os investimentos e não sei até que ponto há garantia por parte do Estado para montar essa estrutura. Não vai ser possível ficar com os alunos o dia inteiro na escola, com mais trabalho pedagógico, com a estrutura oferecida hoje. Se dizem que não há dinheiro, como essa infraestrutura irá melhorar?
E o que você destaca de positivo?
Se houvesse realmente a liberdade de o estudante escolher, seria um ponto positivo. Li um documento do Banco Mundial que fala sobre a necessidade de aumentar a produtividade dos trabalhadores. Fiquei preocupada: será que essa reforma é só para atender a esse documento, não está só reduzida à questão trabalhista? Nem estou falando da Base Nacional Curricular, pois ela ainda não existe. Seria melhor se primeiro a Base tivesse sido aprovada, para depois discutir a parte diversificada, e não o inverso. Não podemos ser corporativistas quando se fala em educação pública. A minha disciplina é uma das que vão deixar de ser obrigatórias. Fico pensando é na qualidade do ensino.
Por que você acha que piorará?
Nesses itinerários formativos, vamos imaginar que a rede garantirá a oferta, que vão ser oferecidos todos os itinerários para os alunos. Mas e os professores? Qual ensino vai ser oferecido por esses professores? Não somos formados por áreas do conhecimento, somos formados pelo conhecimento disciplinar. O Estado vai garantir a formação desses professores que já estão na rede? Em que horário? Li, tentei encontrar algo de positivo, mas ainda não consegui. Talvez seja muito recente, e eu tenha de estudar mais a proposta do governo.
Como avalia os professores mais jovens do que você que estão chegando agora à docência?
Há um problema sério de formação de professores no país. Na escola em que trabalho, em Santo Amaro, onde, pela centralidade, todo mundo quer dar aulas, pois atrai um perfil diferente de aluno, meus colegas são muito bem formados. Sou uma das únicas que não têm mestrado e doutorado. Todos vêm de universidades públicas. Já na escola da perifeira, eu sou uma exceção, pelo fato de ser formada em universidade pública. Então, não vejo essa divisão entre professores mais novos e mais antigos na rede. Até porque há poucos professores jovens, sou uma das mais novas. Ninguém quer o magistério. A política salarial adotada em qualquer lugar do país não atrai gente nova para o magistério, ninguém quer dar aula. E há um problema sério de formação de quem ingressa novo na rede, porque muitos fazem as complementações pedagógicas a distância, o que está regulamentado nessa nova reforma, e viram professores. Tenho 12 anos dentro de universidades estaduais como estudante de ciências sociais e geografia. Aí o cara vai lá, faz um curso de um ano e meio e tem um diploma igual ao meu.
Que tipo de mudança você acredita que daria bom resultado pelo que conhece do ensino médio?
Acho que o primeiro passo seria ter uma estrutura adequada. Estrutura física e aporte pedagógico de verdade.
Como o quê?
Primeiro, o ensino não pode ser massificado, não podemos ter 44 alunos dentro de uma sala de aula. Precisa ter menos alunos para observarmos melhor as dificuldades de cada um. Segundo, é preciso ir além de giz e lousa, que é o que a gente tem. Precisamos de datashow, de televisões, de retroprojetor, de copiadoras, de materiais feitos de acordo com a necessidade dos alunos, e não materiais massificados, pois temos de garantir a diversidade. É difícil falar de conteúdo diversificado sem a Base Curricular. Esse, aliás, é ponto positivo da reforma, dar espaço para valorizar as diversidades regionais. Mas, quando temos currículos prontos e fechados, não damos conta das particularidades. Essa liberdade da produção de materiais que deveria ser dada ao professor, e não a um grupo fechado que monta isso, seria um grande passo para a melhoria da aprendizagem nessa etapa do ensino.
Mas você acha o currículo limitador?
Não, acho que o currículo é uma necessidade, mas não o material didático. Tem diversas formas de tratar dessas questões. É diferente falar de diversidade regional para um aluno do Alberto Conte, que é de uma região central, e para o aluno lá da periferia do Hugo Lacorte. A abordagem tem de ser diferente. Se eu conseguisse produzir, dentro do currículo, o meu material, eu o faria de jeitos diferentes para esses dois alunos.
 
Edmílson Saturnino, docente de história: o professor precisa ter a liberdade de decidir o que funciona ou não com sua turma de alunos | Foto: © Gustavo Morita

Foto: © Gustavo Morita

Aos 56 anos, casado e com uma filha de 18 anos, Edmílson Saturnino é professor de história da rede municipal há 30 anos e da rede estadual há 26. Começou a lecionar após fazer licenciatura em estudos sociais, com habilitação em história na extinta Faculdade Teresa Martin, na Freguesia do Ó, em São Paulo, bairro que ficou famoso por causa do Punk da Periferia, de Gilberto Gil.
Hoje, continua na mesma região: dá aula em duas escolas de Pirituba, distantes 500 metros uma da outra, a Emef General Liberato Bittencourt, municipal, onde leciona para todos os anos do Fundamental 2, e a EE Dr. Joaquim Silvado, em que tem classes no ensino médio.
No início da carreira, chegou a dar quase 70 aulas por semana, dividindo-se entre quatro escolas. Agora, apoia-se na convicção de que é preciso fazer algo diferente para atrair a atenção dos alunos. Quanto à proposta do novo ensino médio, lista muitas dúvidas sobre sua viabilidade.
Como você vê o ensino médio hoje?
Está num processo que está levando o sistema à falência. Os professores não se sentem motivados pela valorização que o Estado de São Paulo dá. Tenho muitos colegas que estão em três escolas – particular, municipal e estadual – e trabalham na correria entre uma e outra. Sempre que têm algum contratempo, como ter de levar um familiar ao médico ou o carro à oficina, preferem sacrificar a rede que menos os valoriza. Se a particular ou a prefeitura pagam salários mais razoáveis, acabam indo no horário da escola estadual. Os alunos não se sentem atraídos pelas aulas, muitos não levam a escola a sério, as faltas dos professores prejudicam muito o desenvolvimento do trabalho em aula. Ou seja, os dois lados têm culpa. Não conseguimos mais administrar a questão dos celulares em sala de aula, há alunos agressivos demais, com problemas com drogas. Que tem de haver mudança, como está acontecendo agora, é claro. As provas externas, tipo Saresp, para medir a qualidade de ensino, já caíram em descrédito entre professores e alunos. Podem fazer em três horas e fazem em menos de uma hora e meia. Os resultados são desastrosos.
Quais as razões para esse quadro?
Até 2016, por exemplo, tínhamos média de 30 a 35 alunos por sala de aula. Em 2017, esse número está entre 40 e 45 alunos, o que prejudica o trabalho do professor e o próprio aprendizado dos alunos. Esse aumento de alunos é resultado da diminuição do número de turmas. Na minha escola eram 15, caíram para 11.
E o que mais?
Investimento é fundamental. O projeto de escola de período integral, que, pelo que li, abrange em torno de 6% das escolas do estado, dá instrumentos suficientes para que os alunos tenham mais vontade de trabalhar. Há uma escola aqui na região de Pirituba, a única com período integral, com vários recursos para atrair o aluno para as aulas.
Quais, por exemplo?
Equipamento de esporte adequado, quadra poliesportiva para vôlei, futebol de salão; um laboratório que funciona; sala de leitura organizada, para incentivar o aluno. Mas os coordenadores lá não creem que isso será expandido, pois não estão recebendo a verba que recebiam no começo. E, pelo que eles estão recebendo, acham impossível que novas escolas surjam se não houver uma injeção de muito dinheiro para equipá-las. E os professores dessas unidades ganham 75% a mais do que quem trabalha na escola regular normal. E são incentivados a estar ali durante o dia todo, sem ter de trocar um trabalho que paga mais por um que paga menos. Isso é muito positivo. Já na minha escola, a sala de informática, por exemplo, era mais bem aproveitada, pois havia um aluno monitor, com bolsa, que auxiliava os outros. Agora, poucos professores usam, estamos até sem impressora.
E o que poderia motivar os alunos?
Diversificar as aulas, ter liberdade de trabalhar de uma maneira que você descubra o que pode dar resultado naquela sala e possa botar isso em prática. O ensino médio do estado é engessado pelas apostilas. Na minha escola, eu tinha liberdade para fazer teatro, para fazer pesquisa de campo, coisa que hoje não tenho, pois devo seguir uma apostila o tempo todo e prestar contas para a equipe gestora do que consegui ou não trabalhar. Se você atrasa um pouco aquilo, pode ser que no Saresp não haja o resultado que eles esperam. Muitas coisas você não pode colocar em prática. Nos últimos dois anos, minha escola tem se libertado um pouco das apostilas. Trabalho com elas, mas também tenho liberdade de trabalhar com teatro, fazer gincanas, coisas que atraiam os alunos.
O que achou da reforma do ensino médio aprovada pelo governo?
A gente só sabe pela mídia, não houve nenhum boletim informativo. Sabemos sobre os novos itinerários formativos, que são cinco áreas, que serão obrigatórios língua portuguesa, matemática e inglês e haverá 40% do currículo para essas cinco áreas [linguagens, matemática, ciências da natureza, ciências humanas e sociais aplicadas, formação técnica e profissional]. Não sabemos como isso será feito. Na minha escola, a sala de vídeo não funciona, a sala de leitura virou um depósito de livros e a sala de informática não faz jus ao que foi. Quanto dinheiro, o governo vai ter de colocar nas escolas para que isso dê certo? No momento, a preocupação maior de alguns professores é se vão continuar no sistema ou se serão excluídos, principalmente os professores da área de humanas. Querem colocar isso em prática em 2019 ou 2020. O que realmente vai acontecer com os professores? Vai haver profissionais para essas novas áreas? Como será essa questão do notório saber? A escola terá estrutura para as cinco áreas? O aluno poderá escolher a área e ele vai poder ficar naquela escola? São dúvidas com relação a essas cinco áreas: como serão divididas, como será o aumento de 800 horas para mil horas. Há muitas dúvidas.


A seguir, confira mais três perguntas respondidas pelo professor Edmílson Saturnino, conteúdo exclusivo do site da Educação.
Ou seja, o problema é não haver recursos. Você não considera a proposta ruim, é isso?
Acho até que é uma proposta melhor. Veja, dou aula de história, duas aulas por semana, uma hora e meia, e só volto na semana seguinte. O professor de geografia só dá uma aula por semana, de 45 minutos. Quando há feriado ou reuniões… Já passei mais de um mês sem entrar numa sala. Isso tem de mudar, é preciso maior atenção para a área de humanas, para a área de exatas. Português e matemática são fundamentais para o Enem, isso todo mundo entende. Agora, nas outras disciplinas, o ensino médio não está levando a lugar nenhum. Quando converso com os alunos sobre vestibular, falo para eles não desanimarem, para não terem pressa, se possível fazer um cursinho depois. Isso porque há um desânimo muito grande quando se fala em vestibular, principalmente quanto aos possíveis resultados em universidades públicas. Alguns conseguem, em pedagogia, história, mas outros querem engenharia, direito.
Os alunos dão importância à disciplina de história hoje?
Nas minhas aulas, faço um círculo de alunos, pego um tema como democracia na Grécia, por exemplo, e falo para eles como funcionava. Aí, eles fazem um quadrado, que pega toda a sala e eu pergunto: o Brasil, hoje, é um país democrático? A classe pega fogo, mesmo que eles tenham furos [formativos] vindos do fundamental 2, eles falam muito. Peço, então, que façam um relatório de tudo que falaram, que depois vira um relatório geral. No final, há uma riqueza de depoimentos que me deixa muito eufórico com o retorno que eles me dão. Só que, nos três últimos anos, eu parei, pois houve muita pressão de fora, e isso leva tempo. Tenho de dar no mínimo duas horas para os debates, porque eles falam muito, e temos de registrar tudo. Como a escola força a gente a cumprir um planejamento, deixei de fazer. Mas este ano comecei de novo. Vou desafiar. Já falei com alguns colegas, e eles falaram que tenho de desafiar mesmo, eles lembram desse trabalho e dizem que os alunos comentam no Facebook que guardaram isso na lembrança. Vou quebrar o planejamento, pois é o que dá resultado. Numa aula expositiva de história, como a que dei na última quinta-feira, em que expliquei expansão marítima, o ânimo é quase nenhum. Ficam mexendo no celular, desatentos. Chega uma hora em que você pergunta: para quê? O que eles estão absorvendo? Será que lendo um livro em casa não aprenderiam mais do que numa aula minha, pelo nível de atenção que estão tendo? Vou voltar a fazer o que já fazia. E sei que vai dar certo. Eu pego, por exemplo, a questão da escravidão no Brasil e pergunto se hoje há situações que podem ser comparadas às do período colonial. Eles falam do trabalho dos bolivianos, das crianças do Centro-Oeste, das grandes fazendas. Um aluno foi visitar a avó na Bahia e observou a escravidão sexual de crianças obrigadas a se prostituir. Mas com duas aulas por semana no ensino médio, tenho de fazer milagres. Procuro usar estratégias diferenciadas para ter um retorno melhor.
Como você vê os jovens professores?
Tenho de fazer um paralelo entre a prefeitura e o estado: na prefeitura, o pessoal que está começando geralmente é bem formado, bem esclarecido. Tenho dois amigos na prefeitura formados pela USP, um já fez mestrado, livros, eles têm um ânimo muito grande, desenvolvem trabalhos legais em vídeo, temos um ótimo entendimento. Não há atrito quanto à questão da formação, de idade, fazemos juntos a maior parte dos trabalhos. Já no estado, uma colega que dá aula na prefeitura prestou concurso público e entrou com outros cinco. Depois de um ano, os seis pediram exoneração. O que acontece? Pela valorização do estado em relação ao professor, os mais competentes, com mais bagagem, não se sentem atraídos devido às condições de trabalho e a “N” movimentos que já existiram do sindicato de professores para os quais não houve resposta. O último governo que, segundo muitos professores, a gente se sentia um pouco mais satisfeito em relação à nossa valorização foi o governo [Franco] Montoro [PMDB, 1982-1986]. Faz muito tempo que o estado está sendo sucateado, e que os professores não estão colocando o “ser professor” como o mais importante, e sim o salário que recebem. E há a falta de estrutura das escolas. Quem está ingressando agora tem cada vez menos estímulo para continuar no estado devido às condições de infraestrutura e de valorização profissional.

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