NOTÍCIA
Atendimento psicológico serve de apoio para acompanhar o desempenho acadêmico, orientação de problemas e até reverter uma possível evasão
Atendimento psicológico serve de apoio para acompanhar o desempenho acadêmico dos alunos, orientar a solução de problemas e até reverter uma possível evasão
por Maria Celeste Oliveira
A passagem da adolescência para a vida adulta, marcada pelo ingresso na vida universitária, desperta nos jovens, com mais ou menos intensidade, questões psicológicas de natureza individual, que podem prejudicar o desempenho acadêmico dos estudantes ou até mesmo levá-los ao abandono da faculdade. Para ajudá-los a enfrentar o rol de responsabilidades que começam a surgir nesse período, com as novas exigências da vida acadêmica, a escolha da profissão, mudanças de hábitos, o distanciamento da família e a adaptação ao novo ambiente social, dispor de um serviço de apoio psicológico pode fazer a diferença para o desempenho dos estudantes, e, inclusive, a sua permanência na instituição.
Uma série de expectativas geradas com a chegada à universidade acaba muitas vezes frustrada quando os jovens encontram situações como uma rotina pesada de estudos, problemas de relacionamento com professores e colegas, ou dificuldades de articular teoria e prática profissional. Desse modo, é comum que os estudantes sofram de tristeza, desmotivação, ansiedade, baixa autoestima, depressão, dentre outros problemas que afetam sua saúde mental, gerando impacto sobre seu desempenho acadêmico.
“Pesquisas mostram que a universidade pode ser insalubre aos estudantes, pois a personalidade do aluno dá a esse ambiente uma interpretação particular, com maior ou menor sofrimento”, analisa a coordenadora do programa Retaguarda Emocional para o Aluno de Medicina (Repam) da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo, Patricia Bellodi. Ao mesmo tempo, o ambiente universitário pode reforçar certos traços de personalidade e inibir outros, como por exemplo maximizar a competitividade e o perfeccionismo, em detrimento da colaboração e da qualidade de vida, enfatiza a coordenadora.
É para aliviar tais tensões que entra em cena o serviço de apoio à saúde mental. O atendimento psicológico ganha espaço dentro das instituições de ensino como no Serviço de Assistência Psicológica e Psiquiátrica ao Estudante (Sappe) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
Fundado em 1987, o Sappe tem uma demanda crescente. Somente entre 2007 e 2011, o número de atendimentos psiquiátricos quase dobrou, passando de 1,2 mil para 2,3 mil. Os atendimentos de psicoterapia breve (quatro sessões com foco em uma problemática específica) passaram de seis mil para 8,7 mil.
Dentre todas as áreas do conhecimento, a maior parcela dos alunos que procuram o Sappe é da área de exatas e tecnologia (46%), conforme conclui levantamento realizado pelo professor Claudio Banzato, que foi coordenador do serviço de 2003 a 2005. Os alunos de humanas respondem por 29,5%, os de biológicas, 13% e os demais da área de artes.
Respaldo emocional
Alguns casos clínicos relatados pelo Sappe ilustram as dificuldades dos alunos e evidenciam os benefícios do apoio psicológico. A coordenadora do Sappe, Tânia de Melo, relembra o caso de um estudante que recorreu ao serviço por acreditar que tinha transtorno de déficit de atenção. No entanto, no decorrer do tratamento se percebeu que as dificuldades eram oriundas de uma grande ansiedade provocada pela cobrança em relação a desempenho acadêmico. “Havia uma ideia de que o aluno não poderia falhar, tirar notas baixas e que tinha de render o máximo sempre”, relata Tânia.
Em outro caso, a queixa declarada pela aluna era de desmotivação, tristeza e dúvidas em relação à escolha do curso. Após expor ao departamento suas frustrações, ficou constatado que esses sentimentos estavam relacionados com a adaptação à vida universitária e à falta de acolhimento na nova cidade. “Há casos ainda de queixas de desmotivação relacionadas com a escolha do curso. Aí o papel do serviço de atendimento psicológico é auxiliar o aluno a ter mais clareza sobre suas opções e, às vezes, sustentar uma eventual mudança”, indica.
Papel ampliado
Apesar de os problemas e dificuldade de natureza psicológica enfrentados pelos jovens estarem relacionados a questões individuais, a instituição de ensino tem um papel importante no sentido de favorecer o bem-estar e o sucesso do aluno. É o que destaca o diretor do serviço de atendimento psicológico da Universidade de Swarthmore, na Pensilvânia (EUA), David Ramirez.
“A universidade pode desenvolver um trabalho preventivo para a saúde mental dos alunos, promovendo uma conexão entre as disciplinas, além de enfocar atividades significativas para a vida do estudante”, propõe Ramirez. “Os estudantes buscam significado, sentido e não apenas conhecimento”, conclui. Na prática isso se traduz, por exemplo, numa organização curricular na qual exista um diálogo entre disciplinas distintas, ou na qual haja mais equilíbrio entre teoria e prática.
O bom ou mau professor é outra dimensão que influencia a qualidade de vida do aluno, analisa Patricia Bellodi. “Ainda existem situações de abuso, humilhação e opressão engendradas pelas próprias práticas pedagógicas”, relata. Para a coordenadora do Repam, o professor precisa ter em mente que ele não é apenas um transmissor de conteúdos. Nesse sentido, é necessário promover mudanças nas estruturas e práticas pedagógicas tradicionais que, muitas vezes, falham na construção de sentido para os alunos.
Causa e origem descoladas |
Um levantamento do Serviço de Assistência Psicológica e Psiquiátrica ao Estudante (Sappe), na Unicamp, aponta que entre as reclamações mais recorrentes dos alunos que procuram o serviço estão os relacionamentos interpessoais (31,4%). Na sequência entram os problemas familiares (23,8%), preocupação com o futuro (21%) e baixo desempenho acadêmico (18%). No entanto, queixas como essas podem levar ao desenvolvimento de questões mais complexas. “As queixas iniciais mais comuns são de dificuldades nas relações interpessoais, seja com colegas, professores e até familiares. Problemas relacionados à ansiedade, desmotivação ou tristeza também são comuns”, conta a coordenadora do Sappe, Tânia de Melo. |