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Edição 249

Dura lex, sed lex?

Tinha razão Darcy Ribeiro, quando disse que a crise da educação não é uma crise, mas um projeto. Leia mais na coluna de José Pacheco

Publicado em 24/05/2018

por Redacao

"Dura lex, sed lex" é uma expressão em latim que significa "A lei é dura, mas é a lei" (Crédito: Shutterstock)

“Dura lex, sed lex” é uma expressão em latim que significa “A lei é dura, mas é a lei” (Crédito: Shutterstock)

Professor Zé, pode ser maior que o compromisso ético de um educador a negligência criminosa de um gestor? Negligência criminosa é a manutenção e financiamento de práticas inaceitáveis, que ferem o âmago da escola e a deslegitimam e desmoralizam frente aos seus educandos e à toda comunidade. Como podem os educadores realmente comprometidos com a justiça social permanecerem e, mais ainda, avançarem com seus projetos em uma instituição gerida por alguém que não apoia e até inviabiliza o processo de transformação, ignora os chamamentos éticos e legais dos educadores e financia a manutenção do caos institucional?
Ao ler a carta-denúncia, sobreveio na memória o que aconteceu a uma família, há uns dez anos. Porque não matriculou os seus fi lhos, acusaram-na de abandono intelectual e foi punida com multa. Seguindo o mesmo raciocínio e aplicando a mesma lei, se um ministério mantém e financia práticas inaceitáveis, condenando à ignorância milhões de jovens matriculados, se o poder público comete esse crime de abandono intelectual, por que não é punido?
Escuto a recorrente pergunta: Se a sua escola não tem aula, nem turma, a sua escola está fora da lei? Pacientemente, respondo que está dentro da lei, porque cumpre a Constituição e a Lei de Bases, garantindo a todos o direito à educação. Por vezes, insistem: Então, há escolas que estão fora da lei? Por pudor, não respondo. Mas, desta feita, ouso afirmar que há escolas fora da lei. Nos seus projetos podemos ler palavras como “competência”, ou “autonomia”, mas as práticas são o oposto do que está escrito nos projetos. Os seus professores sabem que o modelo de ensino fundado no paradigma da instrução nega o direito à educação a muitos alunos, mas insistem em atitudes antiéticas. Essa atitude não configura crime de falsidade ideológica?
A carta termina assim: As sabotagens se fazem presentes, dia após dia. Enquanto cidadã, ser humano e educadora, preocupam-me investidas perniciosas do Sistema, como a de ontem e tantas outras, que advêm da vaidade de estruturas de poder e mais ainda da negligência daqueles que se acostumaram a fazer a manutenção do status quo. Faço um pedido de intervenção, porque as minhas colegas do Projeto estão sofrendo boicotes frequentes. Sofrem com o desgaste emocional e retaliação.
O abuso de poder, a chantagem emocional, o assédio moral perpetrado por agentes do poder público não serão atos criminosos? Nunca será demais lembrar que muitos projetos inovadores vêm sendo destruídos, por ignorância ou incúria de políticos e burocratas. Enquistados nos órgãos de gestão e administração, impõem às escolas o cumprimento de normativos geradores de um autêntico genocídio educacional. Por que continuam impunes?
Nos últimos quarenta anos, recebi centenas de cartas idênticas àquela de onde extraí os dois excertos. Tinha razão o saudoso Darcy, quando disse que a crise da educação não é uma crise, mas um projeto. um projeto hediondo, porque destruir futuros se assemelha a crime contra a humanidade.
Já em 2010, uma pesquisa alertava para o elevado grau de corrupção endêmica e sindrômica no sistema educativo, que não se restringia à ação de máfias da merenda, ou do transporte. Mas, haja esperança! Vejamos o que um professor português, que é superintendente de ensino de Nova York, nos diz: Quando eu cheguei, despedi três quartos dos diretores de escolas (…) há alturas em que temos de tomar posições, não é altura para se evitar confrontos por medo de ser inconveniente.

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