NOTÍCIA
Em 2020 entra em vigor a Lei que exige um tratamento transparente de todos as coletas, armazenamentos e compartilhamentos de informações
Em 1949 foi publicado o emblemático 1984, de George Orwell, que critica uma sociedade vigiada a todo instante. Hoje, em um momento cujos dados pessoais aumentam cada vez mais, se preocupar com a proteção dessas informações geradas é fundamental.
A atenção global ao tema começou a se consolidar pós-segunda Guerra Mundial e no Brasil, discussão sobre normas para proteção de dados vem ganhando força há apenas cerca de dez anos, tanto é que em agosto de 2018 foi sancionada a Lei Nº 13.709, que inspirada no Regulamento Geral de Proteção de Dados da União Europeia, se preocupa com o ciclo dos dados pessoais. Em outras palavras, o foco é por onde eles vão caminhar e quem terá ou poderá ter acesso a eles e ainda, que o dono ou responsável pelos dados tenha consentimento do que será feito.
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A partir de agosto de 2020 — seria no início do ano que vem, mas uma Medida Provisória alterou para o segundo semestre — todas as organizações sociais, incluindo as escolas, devem implantar as diretrizes do documento, chamado de nova Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD). A área mais atingida é a de gestão de dados, ou seja, que se refere à coleta, armazenamento e compartilhamento de informações pessoais dos alunos, família e funcionários.
A LGPD entende que dado pessoal é toda informação relacionada à pessoa natural, identificada ou identificável, por exemplo, nome, RG, endereço e telefone. Em seu artigo 1º, o documento afirma: “esta Lei dispõe sobre o tratamento de dados pessoais, inclusive nos meios digitais, por pessoa natural ou por pessoa jurídica de direito público ou privado, com o objetivo de proteger os direitos fundamentais de liberdade e de privacidade e o livre desenvolvimento da personalidade da pessoa natural”.
O advogado e pesquisador do Grupo de Ensino e Pesquisa em Inovação (GEPI) da FGV Direito de São Paulo, Victor Nóbrega Luccas, explica que ainda não é possível afirmar se as escolas que não cumprirem os regulamentos serão penalizadas. “Mas em termos de princípio da legislação, a escola tem que mostrar que está fazendo um programa de adequação e todos os esforços dela serão interpretados”, explica.
A Lei é tida como complexa e o que Luccas esclarece é que o mais importante não é necessariamente resolver tudo no prazo, mas criar um programa de proteção de dados que a escola se habitue, por exemplo, a instituição tem que deixar claro o motivo de estar coletando dados e informar o que fará com eles, uma vez que a Lei entende que o titular dos dados não tem como saber para onde pode ir suas informações.
Contudo, nestes primeiros passos, o especialista aconselha as instituições de ensino a revisarem todos os seus documentos, como o contrato de matrícula, histórico de transferência, contrato de trabalho e outros. Além disso, é importante que a gestão conscientize os professores e funcionários sobre a Lei e o ideal, se necessário, ter alguém ou grupo encarregado para essa área de tratamento de dados, por exemplo, um profissional de Tecnologia da Informação e de assuntos jurídicos.
Localizado na Zona Oeste da capital paulista, o Colégio Waldorf Micael de São Paulo está notando que em breve terá que se movimentar. “Vamos fazer uma reunião com o colegiado dos professores, mantenedora e jurídico para poder traçar as novas medidas. Uma delas é a mudança no contrato de matrícula, porque aqui na escola é costume os pais compartilharem e-mails, telefones e terem grupo de WhatsApp, por exemplo. Teremos que ter alguma medida de autorização dos pais para essa finalidade”, revela Zita Cecchini, diretora do Micael.
O motivo da soliticação da documentação para a matrícula ocorre a pedido do sistema educacional e Zita conta que isso agora terá que ser esclarecido às famílias. Outro exemplo são as informações necessárias para o cadastro no sistema de passe escolar da SPTrans em que os pais entregam os dados sem questionar a circunstância.
Em relação à proteção dos dados, a diretora explica que todas as informações são arquivadas. “Basta ter o nome de alguém que não mandamos para a reciclagem, enfileiramos. Tem documento de registro histórico que guardamos para a vida toda”, conta.
Aliás, voltando à ideia de vigilância de 1984, Luccas alerta: “não existe nenhum meio técnico suficiente para nos proteger. E tem gente que fala que vivemos em um sistema líquido e fluido de vigia, pior que o do George Orwell”, diz o advogado.
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