Indisciplina, raiva manifesta em agressividade, desatenção. O emaranhado de comportamentos advindos da subjetividade dos alunos tem efeito bumerangue: provocam outras emoções no professor e podem desencadear frustração, perda de ânimo, impotência. Como um dos lugares privilegiados para as interações presenciais na contemporaneidade, a escola é o ambiente perfeito para o engatilhamento de processos emocionais. O que não se sabia, até agora, é o quanto essas emoções influenciam no aprendizado, seja de forma negativa, ou positiva.
A neurociência tem trazido informações importantes para entendermos a relação entre comportamento e função cerebral. Sabe-se hoje que perturbações que envolvem a sensorialidade, a percepção, o aprendizado, e a capacidade de lidar com problemas estão muitas vezes associadas às deficiências do relacionamento interpessoal, insegurança e baixa autoestima.
O roteiro abaixo mostra como identificar, compreender e lidar com sentimentos despertados na criança, como raiva, carência, desinteresse, ansiedade e tristeza. Aqui colocamos algumas emoções e/ou sentimentos de forma separada. Mas é importante ter em mente que todas se relacionam de forma dinâmica. “Essa é uma pequena mostra de como é possível compreender e manejar a delicada linguagem dos sentimentos e emoções nas relações que se estabelecem na escola”, aponta a neuropsicóloga Adriana Fóz, que ofereceu as informações para este roteiro.
Os desenhos publicados fazem parte do trabalho que a professora Tatiana Luiza da Silva Lima desenvolveu com seus alunos de segundo ano do ensino fundamental na Escola Villare (SP), em 2014, quando ela pediu que as crianças criassem suas definições para alguns sentimentos.
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Sentimento/emoção: RAIVA | |
Como identificar: Sugestão de manejo: |
Sentimento/emoção: CARÊNCIA AFETIVA | |
Como identificar: Sugestão de manejo: |
Sentimento/emoção: DESINTERESSE | |
Como identificar:
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Sentimento/emoção: ANSIEDADE EXCESSIVA | |
Como identificar: Sugestão de manejo: |
Sentimento/emoção: TRISTEZA | |
Como identificar: Sugestão de manejo: |
Veja projetos criados por professores para lidar com as emoções de seus alunos em sala de aula:
Conhecendo as emoções de um jeito |
Tatiana Luiza da Silva Lima, atualmente professora do primeiro ano na Escola Villare, em São Caetano do Sul, dava aula para o segundo ano em 2014 quando decidiu tornar mais visível a relação de seus pequenos alunos com suas próprias emoções. A educadora começou a reparar nas assembleias (rodas de conversa onde todos podem se expressar e que conta com a mediação do professor) que muitas vezes as crianças sentiam dificuldades para nomear o que sentiam. “Com esta questão em mente, me lembrei do projeto ‘A casa das estrelas – o universo contado pelas crianças’ em que o professor colombiano Javier Naranjo apresenta as definições que seus alunos do curso primário (entre 3 e 10 anos) davam para palavras, objetos, pessoas e, principalmente sentimentos, em suas aulas de espanhol – e que ele reuniu ao longo de dez anos”, conta. A partir desta inspiração, Tatiana pediu para que as crianças criassem suas definições para sentimentos e emoções como raiva, ciúmes e frustração, de uma forma bastante livre. “O resultado é altamente revelador de como estão sendo construídas as percepções destas crianças sobre quem elas são e qual o papel das emoções em suas vidas. Esta conscientização é muito importante e, eu acredito, pode até prevenir dificuldades escolares futuras”, aponta Tatiana. Dentre as definições criadas pelos pequenos estão: “Ciúmes: é como ter duas melhores amigas e as duas ficam (juntas) sem você” ou “frustração para mim é ficar bravo e irritado quando alguma coisa não dá certo”. “Com o tempo, identificar as emoções e sentimentos pode tornar-se uma prática cada vez mais comum para essas crianças, promovendo maior autonomia e a possibilidade para que ela encontre, junto com o seu grupo, as melhores estratégias para favorecer as relações saudáveis e um estado emocional que não dificulte a aprendizagem”, finaliza Tatiana. |
Acolhimento, escuta e conhecimento |
Mônica Santos de Oliveira Moreira, professora do segundo e do terceiro ano na Escola Municipal Paulo Autran, em Guarulhos (SP), acredita que o primeiro passo para manejar as emoções em sala de aula é a escuta. “É imprescindível que estejamos atentos para perceber e também para acolher as demandas emocionais que possam surgir por parte dos alunos”, aponta a educadora. Um exemplo dado pela professora traz uma pequena aluna que começou a todos os dias, no início das aulas, contar para a professora sobre o processo de um tio que estava preso. “Eu sentia que para ela era importante eu falar, então eu escutava com toda a atenção. Com o tempo eu pude perceber que a maior preocupação desta aluna era com a mãe, que estava sofrendo com a situação. “Eu sei que não vou tratar esta criança – mesmo eu tendo formação e experiência como psicóloga. Mas esta escuta e acolhimento muitas vezes são suficientes para que o aluno se tranquilize e consiga estar presente para as atividades em sala de aula”, completa Mônica. A professora aponta a formação oferecida pelo Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa como um divisor de águas em sua própria capacitação para lidar com as emoções dos alunos. “Eu abri minha cabeça e passei a aceitar, por exemplo, que quando você abre rodas de conversas ou cria situações para os alunos se expressarem, essas situações podem ser mesmo barulhentas e até caóticas. É normal que seja assim, desde que seja também produtivo”, aponta a educadora. Mônica aponta a frustração como o sentimento negativo mais presente em seu trabalho. “Acho que nós também precisamos amadurecer emocionalmente para aceitar que, muitas vezes, mesmo que estejamos dando o nosso melhor, ele não será suficiente”, enfatiza. “Também é muito frustrante você encaminhar um aluno que necessita de ajuda externa à escola e perceber que, por uma questão de dificuldade de acesso ou de descaso da família, a criança não recebe o tratamento que seria adequado”, conta. “A paciência é um dos atributos mais importantes a serem desenvolvidos, eu acho. Em alguns processos, eu sei que estou plantando uma semente que irá se desenvolver apenas nos anos seguintes. Mas sinto que plantar essa semente é minha responsabilidade, de qualquer forma”, finaliza Mônica. |